Duas jovens foram presas arbitrariamente, por ordem do pastor Marco Feliciano, depois de se darem um beijo durante o evento evangélico Glorifica Litoral, na cidade de São Sebastião, norte do estado de São Paulo, no último domingo, 15 de setembro.
Feliciano, que também é deputado federal e presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, parou com o show que fazia no evento para pedir que a Guarda Municipal e os policiais militares presentes, prendessem as duas garotas. “Aquelas duas meninas têm que sair daqui algemadas. Não adianta fugir, a guarda civil está indo até aí. Isso aqui não é a casa da mãe Joana, é a casa de Deus”, disse ao microfone.
Segundo relatos de pessoas presentes no evento, enquanto as meninas eram levadas, o pastor seguiu incitando o público de 70 mil pessoas contra elas.
As duas jovens, Yunka Mihura, de 20 anos, e Joana Palhares, de 18, foram encaminhadas por agentes da Guarda Civil Municipal à delegacia do 1º Distrito Policial de São Sebastião, onde o delegado presente registrou a ocorrência para averiguação. As namoradas alegaram que outros casais heterossexuais também estavam trocando beijos durante o evento, e que foram agredidas fisicamente pelos policiais.
Ao blog iGay, elas declararam que já havia se beijado outras vezes durante o evento, e que ninguém pareceu se importar. Yunka relatou:
O evento era público, pago com o nossos impostos. Aquele palco, aquele microfone, tudo tinha dinheiro público. Também era um espaço aberto, na Rua da praia. Estar ali era direito nosso.
Para o advogado das jovens, Daniel Galani, houve um conflito de liberdades durante o episódio:
A gente vê que foi uma situação que fugiu completamente ao controle. A gente sabe que existiam dois direitos em conflito: um é a liberdade de expressão e o outro a liberdade do ato religioso. Os dois direitos são constitucionais e estão previstos para que as pessoas possam fazê-los.
Em declarações à Revista Fórum, o diretor da Comissão de Direitos Humanos da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo, Martim de Almeida Sampaio, considerou a prisão “ilegal” e acrescentou que as jovens “poderiam ter dado voz de prisão ao pastor por abuso de autoridade”, caso tivessem conhecimento sobre o Código Penal.
Sem dar entrevistas à imprensa, Feliciano utilizou sua conta no Twitter para falar sobre o episódio, citando o Código Penal Brasileiro como justificativa de sua ação:
1) o código penal brasileiro no seu artigo 208 diz: Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa;
— Marco Feliciano (@marcofeliciano) September 16, 2013
2) impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:
— Marco Feliciano (@marcofeliciano) September 16, 2013
3) Pena detenção, 1mês a 1ano ou multa. P.U. [Parágrafo Único] Se há emprego de violência, a pena aumenta de 1/3, sem prejuízo da correspondente à violência — Marco Feliciano (@marcofeliciano) September 16, 2013
A rede social foi utilizada também para manifestação de usuários contra a atitude do pastor. Marcelo Gerald, ativista dos direitos LGBT, associou o ocorrido com o fanatismo religioso:
O direito dos fanáticos religiosos está ultrapassando qualquer limite aceitável
— Marcelo Gerald (@mkGerald) September 17, 2013
e pontuou
Sobre Feliciano só direi que ele precisa ser punido, NADA justifica a violência empregada contra lésbicas em espaço PÚBLICO, — Marcelo Gerald (@mkGerald) September 17, 2013
O deputado federal Jean Wyllys, advogado dos direitos LGBTs e um dos maiores opositores de Feliciano na Câmara e na Comissão de Direitos Humanos, foi agredido em sua conta por diversos usuários. Ele considerou a prisão das jovens um ato arbitrário e indagou:
Investigar a exploração comercial da fé e o charlatanismo essa polícia não faz! RT “@camilo_aggio: Viu isso, Jean? http://t.co/4z1iZoO0Kl”
— Jean Wyllys (@jeanwyllys_real) September 17, 2013
Durante a semana, a produtora WAPTV Comunicação, contratada pela organização do Glorifica Litoral, que tem entre seus clientes os pastores Marco Feliciano e Silas Malafaia – apontado pela revista Forbes como um dos pastores mais ricos do Brasil – divulgou um vídeo em defesa do pastor:
Depois de ficar conhecido graças a declarações polêmicas e racistas, Feliciano é contestado por boa parte da classe política brasileira desde o início de seu mandato na presidência da Comissão de Direitos Humanos. No início do mês, a OAB já havia anunciado que vai pedir, juntamente com mais de 20 entidades ligadas aos direitos humanos, a cassação de Feliciano e do também deputado Jair Bolsonaro, por incitarem crimes de ódio.
Segundo a prefeitura de São Sebastião, o caso vai ser apurado pela corregedoria da Guarda Civil Municipal.
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