Internet angolana critica hino milionário de comemoração da independência

Imagem de promoção da música – 45 anos de independência de Angola – Agosto 2020, YouTube

As redes sociais de Angola reagiram com indignação diante da notícia de que o Ministério da Cultura contratou uma produtora pelo valor de 148 milhões de kwanzas (cerca de 250 mil dólares americanos) para gravar um hino comemorativo dos 45 de anos da independência do país.

As informações sobre o contrato foram tornadas públicas no dia 14 de Agosto pelo Novo Jornal.

De acordo com a publicação, a empresa contratada, de propriedade do cantor Big Nelo, foi fundada apenas três meses antes da criação da Comissão da Organização das festividades dos 45 anos da independência, comemorada no dia 11 de Novembro.

Big Nelo é um dos músicos mais famosos de Angola, tendo feito parte do grupo de rap SSP que fez sucesso nos anos 90.

A canção, que conta com a participação de diversos artistas angolanos, foi lançada em Junho:

Muitos sectores da sociedade reagiram à revelação do valor do contrato, incluindo produtores culturais, jornalistas, e políticos da oposição

Miguel Neto, radialista da Rádio Luanda Antena Comercial (LAC), recorreu à sua página no Facebook para criticar o valor do contrato:

Alerta – PGR – Um inquérito !

HINO DOS 45 ANOS DE INDEPENDÊNCIA.

BIG NELO escreve 14,3 milhões e pronuncia 148,3 milhões de kwanzas. Com esse orçamento o EXECUTIVO poderia ajudar mais de 17 milhões famílias a 8500 kz cada.

Por seu turno, o rapper Pick Ngudiakage, mais conhecido por Gangsta Pick, por meio de um texto logo escrito no seu Facebook, apontou erros de escrita e composição na letra da música em causa:

Estive a ouvir atentamente o tal hino dos 45 anos da Independência. Aquele hino que custou nos cofres do dinheiro do povo 148.000.000 de Kwanzas e pude concluir que a letra daquela música apresenta sérios defeitos de escrita e composição. (Apesar de ter em si alguns poucos trechos mais ou menos bem construídos).

Um dos maiores defeitos de composição daquela letra se prende com os discursos. Boa parte dos discursos da mesma letra musical são discursos cheios de nada, são discursos trabalhados na mais pura hipocrisia.

Nota-se claramente que os compositores desconhecem a semântica das palavras que usaram. Nota-se claramente que os compositores desta música não dominam sintaxe. Então, além de problemas semânticos, a composição da letra tem problemas sintácticos.

Além destes dois problemas mencionados, a composição apresenta ainda defeitos de interpretação e de harmonização entre o discurso e as ações práticas dos interpretes, na maior parte dos casos.

Em forma de vídeo, o actor Taliban criticou o estado da cultura angolana, ponderando que o dinheiro poderia ter sido melhor distribuído entre outras artes. O actor também alega que o Ministério da Cultura está a segregar fazedores de cultura, escolhendo filhos e enteados para projectos com financiamento público.

O rapper Flagelo Urbano se utilizou do sarcasmo para comentar sobre a canção:

O som de Akz 148.000.000,00 (Cento e Quarenta e Oito milhões de Kwanzas).
– Gravaram no Habbey Road studio, na Inglaterra
– Foi executado pela orquestra filarmónica de Berlim
– Foi misturado pelo Chris Lord-Alge
– O Vídeo Clip foi feito pela Universal Picture e dirigido pelo Quincy Jones.
É obra!

Passados alguns dias após a polémica, o Ministério da Cultura veio à público prestar esclarecimentos:

Os processos de contratação pública são constituídos por diversas peças, ou seja, vários documentos que suportam todos os actos que se praticam até à escolha do vencedor. É natural que possam haver, nalguns casos, erros, contradições, imprecisões ou lapsos que devem e serão corrigidos.

É perfeitamente natural que, na execução do contrato, se possam corrigir eventuais imprecisões da fase de contratação.

Quando chegámos a este Ministério o contrato já tinha sido celebrado. Importa ainda assim referir que — e dada a dimensão simbólica da data em si — houve uma alteração na agenda programática das comemorações dos 45 anos da independência do país, que obrigou a redefinição de muito do que esteve inicialmente elaborado, discutido e decidido com incidência também neste contrato em especial.

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