Um estranho impasse diplomático que se intensificou com ameaças de sanções, além de outras represálias, quebrou a relação da Turquia com a Holanda, aliada da OTAN, sustentando a retórica nacionalista nos dois países.
No incidente, o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Turquia, Mevlüt Çavuşoğlu, foi impedido de aterrar na Holanda no dia 11 de março e o Ministro da Família e da Política Social, Fatma Betül Sayan Kaya, foi escoltado no dia seguinte pelas autoridades holandesas até a fronteira com a Alemanha, quando tentavam assistir a uma manifestação fora do consulado da Turquia na cidade holandesa de Roterdão.
Çavuşoğlu e Kaya tencionavam abordar cidadãos turcos fora do consulado sobre o tema do próximo referendo na Turquia, na cidade holandesa de mais de meio milhão de habitantes. Roterdão, conhecida como uma cidade de imigrantes, tem um Presidente da Câmara muçulmano, e aproximadamente 8% da população é de origem turca.
De forma dramática, as autoridades holandesas impediram os dois ministros de fazerem suas visitas não programadas e em seguida dispersaram a multidão, cada vez mais agitada, com canhões de água e cães-polícia. De acordo com testemunhas, a multidão atirou vidros e pedras à polícia.
As virtudes e os defeitos da conduta do governo turco em apoiar um protesto ligado à sua política interna num país estrangeiro, e a resposta com mão pesada do governo holandês à situação dominaram as conversas no Twitter. De forma idêntica e sem surpresa, o controverso presidente Recep Tayiip Erdoğan acusou o governo holandês de ser um “remanescente dos nazis” e ameaçou com sanções.
O analista turco Aaron Stein compilou uma útil cronologia em inglês de uma farsa que correu mal, onde utiliza “govt X” para se referir à Holanda e “govt Y” para se referir à Turquia.
As ações têm consequências
Erdoğan, possivelmente o político mais poderoso da Turquia desde o seu moderno fundador Kemal Attatürk, que morreu durante o cargo em 1938, é dado como o principal beneficiário da alteração constitucional que será submetida a referendo do próximo mês.
Embora seja provável que as alterações que atribuirão mais poderes ao seu cargo sejam aprovadas, todos os votos contam, incluindo os dos turcos que vivem e trabalham na Europa. Fica assim explicada a tentativa, em grande medida fracassada, dos membros do seu governo de visitarem cidades europeias com grandes populações de turcos a fim de obterem o seu apoio. A Áustria e a Suíça juntaram-se à Holanda e também cancelaram manifestações a favor do Sim, expressando a vontade de não permitirem que os seus países tornem-se um palco de campanhas políticas de governos estrangeiros.
Porém, a resposta dos holandeses à última tentativa de manifestação jogou a favor do cada vez mais nacionalista Erdoğan, segundo demonstram os tweets dos seus apoiantes e as primeiras páginas dos jornais a favor do regime.
These are cowards, fascist, and nazi remnants. #WeallERDOGANagainstNAZIS pic.twitter.com/qLfnAohWrS
— E (@emirbereket) 12 de março de 2017
São cobardes, fascistas e remanescentes dos nazis.
This is what's called “ramming home the message”. #Turkish press following editorial orders as crisis with #Netherlands and others deepens pic.twitter.com/vNlxXx0yp8
— Mark Lowen (@marklowen) 12 de março de 2017
Isto é o que se chama “uma mensagem bem clara”. Imprensa turca a seguir ordens enquanto a crise com a Holanda e com outros países se aprofunda.
I would like to offer the Dutch government my heartfelt thanks for doing so much for the “Yes” referendum campaign. #TulipCrisis
— Has Avrat (@hasavrat) 11 de março de 2017
Gostaria de expressar o meu profundo agradecimento ao governo holandês por ter feito tanto pelo “Sim” na campanha do referendo.
Também parece ser o presente perfeito para o político holandês da oposição de direita, Geert Wilders, antes das eleições gerais, cujos resultados foram conhecidos no dia 16 de março. Há quem especule que o governo reagiu desta forma à manifestação para satisfazer o sentimento nacionalista que posicionou Wilders à beira de uma surpreendente vitória.
Go away and never come back @drbetulsayan and take all your Turkish fans from The Netherlands with you please. #byebye https://t.co/FLKFNX2XGm
— Geert Wilders (@geertwilderspvv) 11 de março de 2017
Vai-te embora e nunca mais voltes @drbetulsayan e por favor leva da Holanda todos os teus fãs turcos.
Acima de tudo, no entanto, esta é uma época assustadora para pertencer a uma minoria muçulmana na Europa, enquanto as populações de migrantes se convertem num objeto de luta nas tensões entre Ancara e o Ocidente.
#tulipcrisis is a never ending series of ?'s but with real human consequences in a fragile time for minorities in EU…
— saghira (@taalluq) 11 de março de 2017
A crise das túlipas é uma série interminável de ? mas com consequências humanas reais numa época frágil para as minorias na UE…