Nepal entra no cenário literário internacional: Entrevista com o tradutor Jayant Sharma

 

Image via Jayant Sharma. Used with permission.

Imagem cedida por Jayant Sharma. Usada sob permissão.

Jayant Sharma é escritor, editor e tradutor literário e trabalha essencialmente com o par de línguas inglês-nepalês. Fiel defensor do reconhecimento internacional da literatura nepalesa, Sharma traduziu dezenas de obras literárias. É também fundador do translateNEPAL, uma iniciativa que promove a presença da literatura nepalesa pelo mundo.

Colaborador assíduo de publicações para periódicos sul-asiáticos, Sharma escreve sobre temas como arte, cultura e literatura nepalesa. Além disso, é autor de To Whom it May Concern (A Quem Possa Interessar), uma coletânea de poesia publicada na Austrália. A Global Voices conversou com Jayant por e-mail sobre o seu trabalho como tradutor e suas influências literárias:

Global Voices (GV): Sua contribuição periódica é fundamental para o campo da tradução literária nepalesa. Você poderia nos contar sobre alguns de seus projetos recentes de tradução e os motivos que o levaram a escolhê-los? 

Jayant Sharma (JS): Recently, I translated Pradeep Gyawali’s poetry collection, ‘Bina Salikka Nayakharu,’ into English as ‘Unsung Heroes,’ slated for publication next year. Gyawali’s works, especially his poems, left a profound impact on me, showcasing his poetic brilliance and addressing pressing issues in Nepali society. I also finished translating Dr. Sangita Swechcha’s short story collection, ‘Gulaf Sangako Prem,’ titled ‘Rose’s Odyssey: A tale of love and loss,’ set to be published soon. Living abroad, I resonated deeply with Swechcha's stories, reflecting the struggles of the Nepali community across different geographies. I’m also working on translating Guru Prasad Mainali’s ‘Naso’ and Ramesh Bikal’s ‘Naya Sadak ko Geet,’ aiming to introduce these acclaimed works to a global audience. On a personal front, I’m working on a project ‘Whispers in the Mountain,’ a collection of short stories from Nepal featuring important works of 30 noted writers.

Jayant Sharma (JS): Recentemente, traduzi a coletânea de poesias Bina Salikka Nayakharu, de Pradeep Gyawali, que será publicada no ano que vem com o título ‘Unsung Heroes’ (Heróis Anônimos). As obras de Gyawali, sobretudo seus poemas, me comoveram profundamente. Os poemas mesclam sua genialidade poética com denúncia dos problemas enfrentados pela sociedade nepalesa. Terminei também a tradução da coletânea de contos Gulaf Sangako Prem, da escritora Sangita Swechcha. A coletânea será publicada em breve com o título ‘Rose‘s Odyssey: A tale of love and loss’ (A Odisseia de Rose: Um conto de amor e perda). Como moro no exterior me identifico muito com as histórias de Swechcha, que abordam as dificuldades da comunidade nepalesa vivendo em outros países. Além disso, estou trabalhando na tradução de Naso, de Guru Prasad Mainali e Naya Sadak ko Geet, de Ramesh Bikal. Minha intenção é apresentar essas obras aclamadas ao resto do mundo. No âmbito profissional, estou trabalhando em uma coletânea de contos escritos por 30 célebres escritores nepaleses, o projeto se chamará ‘Whispers in the Mountain’ (Sussurros na Montanha).

GV: Como tradutor que teve que se aprofundar em obras de diversos autores nepaleses, quais são os desafios específicos e as alegrias que encontra ao traduzir diferentes vozes literárias?

JS: Each writer brings a unique voice, reflecting the rich tapestry of Nepali culture and experiences. The challenge lies in capturing the nuances of these voices, ensuring that the essence and cultural subtleties are preserved in translation. One must also dance with the rhythm of each writer’s prose or poetry, understanding the cadence and emotions embedded in the language. It’s like translating not just words but emotions, ensuring that the readers in a different cultural context can feel the heartbeat of Nepali literature. The joys, however, are boundless. Every writer adds a layer to the narrative, introducing me to new facets of Nepali life, traditions, and the human experience. The challenge, then, becomes a thrilling puzzle, solving which brings a deep sense of accomplishment.

JS: Cada escritor produz uma voz única que reflete a rica tapeçaria tecida pela cultura e pelas experiências nepalesas. O desafio reside em capturar as nuances dessas vozes, garantindo que a essência e as sutilezas culturais sejam preservadas na tradução. É necessário seguir o ritmo da prosa ou poesia de cada escritor, entendendo a cadência e as emoções entremeadas na linguagem. Trata-se de traduzir não só as palavras, mas também as emoções, garantindo que os leitores em diferentes contextos culturais possam sentir o coração da literatura nepalesa. As alegrias, ainda assim, são infinitas. Cada autor adiciona uma camada à narrativa, apresentando novas facetas da vida nepalesa, tradições e experiências humanas. O desafio, então, torna-se um enigma fascinante e solucioná-lo traz um profundo sentimento de missão cumprida.

Book Covers. Image via Jayant Sharma. Used with permission.

Capas de livros traduzidos para o inglês por Jayant Sharma. Imagem cedida pelo tradutor. Usada sob permissão.

GV: Como vê o impacto da tradução ao eliminar distâncias culturais e promover uma melhor compreensão da herança literária nepalesa em todo o mundo?

JS: Translation is a powerful tool for sharing the history and culture of one society with another. It's how we’ve come to appreciate the greatness of French, Russian, Spanish, Indian, or Chinese literature. This bridge between cultures is equally transformative in the context of Nepali literary heritage. Nepal, with its rich history dating back thousands of years, holds untold stories recorded in its literature. However, much of this past remains unknown to the world due to a lack of translation. Translation steps in as a linguistic conduit, breaking cultural boundaries and making Nepali narratives accessible globally. It provides a platform for Nepali authors on the international stage, amplifying their voices and contributing to the global literary conversation.

JS: A tradução é uma ferramenta poderosa para a difusão de história e cultura entre sociedades. É como aprendemos a apreciar a grandiosidade de obras literárias francesas, russas, espanholas, indianas e chinesas. Essa ponte entre culturas tem o mesmo poder transformador em relação à herança literária nepalesa. O Nepal, com sua rica história, que remonta a milhares de anos, tem histórias inéditas em sua literatura. No entanto, muito desse passado permanece desconhecido para o mundo devido à falta de tradução. A tradução funciona como um canal linguístico, quebrando barreiras culturais e tornando as narrativas nepalesas acessíveis no mundo todo. Ela oferece uma plataforma para que autores nepaleses no cenário internacional possam participar e ser ouvidos, contribuindo para a conversa literária mundial.

GV: Você poderia comentar quais são os desafios que os tradutores nepaleses enfrentam ao traduzir literatura estrangeira, em especial ao trabalhar com textos que não estão disponíveis em inglês?

JS: Honestly, I haven’t translated much international literature into Nepali myself, but I do understand the multitude of challenges involved. One significant obstacle arises from the limited availability of the source text in Nepali, making it difficult for translators to capture the subtleties of the original language and style. Cultural contextualisation poses another hurdle, requiring translators to adeptly adapt references, idioms, and cultural nuances to resonate with Nepali readers. The challenge escalates when dealing with idiomatic expressions and wordplay. These linguistic devices may not have direct counterparts in Nepali, necessitating creative alternatives or risking a loss of intended meaning. Despite these challenges, translating international literature into Nepali presents a valuable opportunity for cultural exchange and enrichment.

JS: Sinceramente, não traduzi muita literatura estrangeira para o nepalês, mas entendo a complexidade e os desafios envolvidos. Um obstáculo significativo surge da disponibilidade limitada de material em nepalês, tornando difícil a tarefa de capturar as sutilezas do idioma e estilo originais. A contextualização cultural representa outro empecilho, exigindo que os tradutores tenham que adaptar referências, modismos linguísticos e nuances culturais com destreza para que causem o mesmo efeito nos leitores nepaleses. O desafio aumenta ao lidar com expressões idiomáticas e trocadilhos. Essas estratégias linguísticas podem não ter um equivalente em nepalês, exigindo a criação de alternativas criativas ou arriscando a perda do significado pretendido. Apesar desses desafios, traduzir literatura estrangeira para o nepalês apresenta uma oportunidade valiosa para intercâmbio e enriquecimento cultural.

GV: Compartilhe algumas ideias sobre tradução literal e tradução de sentido (paráfrase). Sua abordagem evoluiu ao longo do tempo? Como você encontra o equilíbrio entre fidelidade ao original e a necessidade de adaptação para que o texto chegue a mais pessoas?

JS: Personally, I strongly advocate for the power of thematic rendering in bridging the intricate nuances of one culture and language to another. In literature, a literal interpretation is like a dissonant note in a musical ensemble—out of tune and often disrupting the harmony. Looking back at my journey, my inclination towards a thematic approach has been unwavering. Despite occasional forays into literal translations during my early days, practical constraints led me astray. Over time, however, I’ve naturally gravitated towards a more nuanced and thematic orientation.

When I embark on a translation project, I undertake a thorough process. Multiple readings of the source material immerse me in its context, forming a mental roadmap for the translation journey and preparing the necessary resources. This approach requires translators to step into the author’s shoes, ensuring that the thematic rendition remains not just a translation but a faithful vessel for the genuine authenticity of the original work.

JS: Sou um grande defensor do poder que a reprodução de sentido tem ao mesclar e conectar as nuances intrínsecas de uma língua e cultura para outra. Na literatura, uma interpretação literal é como uma nota dissonante em um concerto, fora do tom, e que muitas vezes atrapalha a harmonia musical. Ao olhar para minha jornada, percebi minha tendência em optar pela abordagem de tradução de sentido. Embora a ocasional incursão por traduções literais no começo da minha carreira, as limitações práticas me levaram ao erro. Com o tempo, gravitei naturalmente em direção à tradução do sentido e com mais sutilezas.

Quando embarco em um projeto de tradução, sigo um processo meticuloso. Faço diversas leituras do material fonte para ficar imerso no contexto, formo um mapa mental de como será o processo tradutório e preparo todos os recursos que considero necessários para a execução do trabalho. Essa abordagem requer que os tradutores se coloquem no lugar do autor, garantindo que a reprodução do sentido não seja apenas uma tradução, mas que resulte em um veículo que transmita de maneira fiel à autenticidade da obra original.

GV: Como alguém extremamente envolvido no cenário literário, tanto como tradutor quanto editor, como você vê o crescimento do contexto literário do Nepal no que se refere ao reconhecimento e participação internacionais?

JS: I'm not completely disheartened, considering that Nepali literature is gradually gaining recognition on the global stage. Though still in its early stages, there’s a pressing need for a significant push to firmly establish Nepal on the world map of literature. The lack of skilled translators, editors, and financial challenges pose obstacles. Publishers are reluctant to publish translated works, and the readership is not as encouraging.

Despite these challenges, some Nepali writers like Ramesh Bikal, Indra Bahadur Rai, Parijat, Buddhi Sagar, Krishna Dharabasi, Chuden Kabimo, Chandra Gurung, and Bhisma Upreti have managed to carve a niche in global literature. However, a significant portion of Nepali literature reaching the global stage is from writers who pen their works in English rather than the original Nepali, missing the crucial voices that demand global attention. As a translator and editor, I’m excited about the potential for more global interest in our Nepali literary works. As much of Nepal remains undiscovered in world literature, everything we bring forth offers a new realisation and perspective for global audiences. This depth has the potential to attract readers worldwide and create a literary buzz that travels far.

Another reason to celebrate is the growing influence of Nepali voices from around the world. The diaspora’s impact infuses Nepali literature with a dynamic vibe that resonates globally. Thanks to the internet, our literature serves as a virtual bridge connecting with readers everywhere, with social media serving as a vibrant marketplace for literary conversations.

JS: Não estou inteiramente desapontado, considerando que a literatura nepalesa tem aos poucos ganhado reconhecimento no cenário internacional. Apesar de estar apenas nos estágios iniciais, há necessidade de um esforço significativo para que o Nepal se estabeleça de vez no mapa mundial da literatura. A falta de tradutores e editores qualificados, assim como a falta de financiamento, impõem alguns desafios. As editoras relutam em publicar obras traduzidas e a falta de interesse dos leitores não tem sido motivo para encorajamento.

Apesar dos desafios, alguns autores nepaleses como Ramesh Bikal, Indra Bahadur Rai, Parijat, Buddhi Sagar, Krishna Dharabasi, Chiden Kabimo, Chandra Gurung e Bhisma Upreti conseguiram fixar um nicho na literatura global. Entretanto, uma porção significativa de literatura nepalesa, que alcançou o cenário mundial, vem de escritores que escrevem seus trabalhos em inglês e não em seu idioma de origem, silenciando as vozes de escritores que necessitam da atenção do mundo. Como tradutor e editor, estou esperançoso com a possibilidade de mais interesse internacional em nossas obras de literatura nepalesa. Ainda que o Nepal permaneça inexplorado no mundo literário, tudo que trazemos à luz oferece maior compreensão e novas perspectivas para o público geral. Essa percepção tem o potencial de atrair leitores internacionais e de chamar a atenção do meio literário.

Outro motivo para comemoração é o crescimento da influência de vozes nepalesas em outros países. O impacto da imigração introduz a literatura nepalesa com muito entusiasmo, e essa dinâmica reverbera ao redor do mundo. Graças à internet, nossa literatura oferece uma ponte virtual que conecta leitores em todos os lugares, com as redes sociais servindo como um espaço vívido para debates literários.

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