No Gabão, os militares tomam o poder após anularem as eleições

Os militares anunciam a tomada do poder. Imagem do canal do YouTube Gabão24

No Gabão, os militares tomam o poder depois de rejeitarem os resultados das eleições gerais (presidenciais, legislativas e locais) realizadas em 26 de agosto de 2023 e, assim, põem fim aos 55 anos de poder da família Bongo. Bongo “pai” foi presidente de 1967 à 2009, e seu filho, de 2009 à 2023.

Para saber mais sobre as eleições, leia: No Gabão, uma tripla eleição histórica com altos riscos

As eleições são organizadas desde o início num contexto de Denúncia de novas leis do Código Eleitoral e medidas adotadas para promover a fraude e a reeleição de Ali Bongo, candidato a um terceiro mandato.

Os resultados da eleição foram anunciados muito cedo, na manhã de 30 de agosto de 2023. Assim, de acordo com o centro Eleitoral do Gabão (CGE), o atual presidente, Ali Bongo, é proclamado vencedor com 64,27% dos votos expressos, enquanto Albert Ondo Ossa, candidato do partido Alternance 2023, ficou em segundo com 30,77%.

No ar, no canal público Gabon 1ère, retransmitido pelo canal France 24, Michel Stéphane Bonda, presidente do CGE, afirma:

Ali Bongo a battu, dans un scrutin à un seul tour, son principal rival Albert Ondo Ossa, qui n'a recueilli que 30,77 % des voix, ainsi que 12 autres candidats qui n'ont récolté que des miettes. Au terme de la centralisation des résultats (…) est élu Bongo Ondimba Ali avec 293 919 voix soit 64,27 %”. Le taux de participation a été de 56,65 %.

Ali Bongo derrotou no primeiro turno seu principal rival, Albert Ondo Ossa, que recebeu apenas 30,77% dos votos, bem como outros 12 candidatos que receberam migalhas. Ao fim dos resultados, (…) Bongo Ondimba Ali é eleito com 293.919 votos, ou 64,27%. A participação popular foi de 56,65%.

Cancelamento das eleições e dissolução das instituições

Antes que a maioria do povo gabonês tomasse conhecimento desses resultados que oficializariam a reeleição de Bongo, os militares reunidos no Comitê de transição e restauração das instituições (CTRI) invadiram as instalações do CGE, forçando Bonda a adiar o anúncio da vitória de Bongo. No canal Gabão 24, eles anunciaram o cancelamento das eleições, a dissolução das instituições estatais, e também o fechamento das fronteiras:

Os militares anunciaram que iriam assumir as suas responsabilidades em relação ao povo, a fim de evitar que o país experimente uma crise como a de 2016 após a reeleição de Ali Bongo para o seu segundo mandato. Na época, Ali Bongo estava enfrentando o adversário John Ping e a violência pós-eleitoral havia gerado  3 mortos e 105 feridos, de acordo com dados do governo.

O general Brice Clothaire Oligui Nguema, que dirige o CTRI, é de fato o novo líder do país, conforme anunciado pelo canal LSI África:

🚨🇬🇦O general Brice Clothaire Oligui Nguema, formado na Academia Militar Real de Meknes, em Marrocos, é o novo líder do Gabão.

O golpe de estado parece contar com o apoio de uma parte da população. Alguns usuários do Twitter notam cenas de contentamento popular e demonstrações de alegria:

Os gaboneses estão felizes🇬🇦

Um jornalista gabonês que conversou pelo WhatsApp com a Global Voices, mas que prefere permanecer anônimo, explica:

Je pense que le coup d’État a été soigneusement et minutieusement préparé. Nous avons constaté qu'il n'y a pas eu de contestations dans les rangs des corps habillés, ce qui veut dire qu'ils se sont mis d'accord avant d'agir. Ils dénoncent des fraudes et des résultats non conformes au désir de la population. Les militaires sensibilisent les populations à garder le calme. Quant aux opposants, ils sont gardés en sécurité.

Penso que o golpe foi cuidadosamente preparado. Nós constatamos que não houve disputas entre os militares, o que significa que já estavam de acordo antes mesmo de agir. Eles denunciavam fraudes e resultados que não estavam de acordo com o desejo da população. Os militares disseram a população para manter a calma. Quanto aos adversários, eles são mantidos em cativeiro.

Enquanto o CTRI anuncia a dissolução das instituições republicanas, outro comunicado de imprensa anuncia sobre a prisão de certos homens que fazem parte do círculo fechado do presidente.

Onda de prisões

Em sua conta no YouTube, o jornal Agence France-Presse publica um vídeo que mostra Ali Bongo preso e colocado em prisão domiciliar pelos militares. Em outro tuíte do jornalista Jean-Pierre Ekanga, podemos ver Ali Bongo fazendo um pedido de socorro.

GABÃO: O PRESIDENTE ELEITO SE PRONUNCIA:
Eu sou Ali Bongo Odimba, presidente do Gabão. Gostaria de enviar uma mensagem a todos os nossos amigos ao redor do mundo. Peço-lhes que façam barulho, façam barulho. Porque essas pessoas me prenderam.

Parentes do presidente deposto também foram presos, de acordo com esse tuíte de Gilles, cidadão maliano residente em Paris.

🇬🇦Ali Bongo, a sua família e os seus médicos estão em prisão domiciliar.

Foram presos:
Noureddine Bongo Valentin
Yann Ghislain Ngoulou
Mohammed Ali Saliou
Abdul Osseyni
Jessy Ela Ekoga
Steve Nzeko Djeko
Siriak Vurandjami

Um editor-chefe de um jornal gabonês contatado por Bénin Intelligent confirma:

Ceux-ci ont été arrêtés pour haute trahison, détournement des deniers publics, faux et usage de faux, falsification de la signature du président de la République, trafic de drogue. Ils sont tous proches du président, travaillant à la présidence de la République.

Eles foram presos por alta traição, desvio de fundos públicos, falsidade ideológica, falsificação da assinatura do Presidente da República, tráfico de drogas. Todos são próximos ao presidente, trabalhando na Presidência da República.

Entre os familiares de Bongo detidos está Noureddin Valentin Bongo, filho de Ali Bongo, que tem dupla cidadania gabonesa e francesa, como indicado por BrazzaNews em sua conta no Twitter:

# Gabão Prisão do Filho de Ali Bongo. Os militares prenderam Noureddin Valentin Bongo, por ‘alta traição’. É um dos filhos do presidente deposto.

Sem condenação

Se os recentes golpes de Estado nos países africanos de língua francesa da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), como Burkina Faso, Mali, Guiné e, ultimamente, o Níger, provocaram fortes reações e condenações de ambas as partes na comunidade internacional, este é o primeiro em um país de língua francesa da África Central que ainda não foi condenado.

Para saber mais sobre o último golpe na CEDEAO, leia: No Níger, militares derrubam o presidente Mohamed Bazoum

No entanto, o jornal França 24 reúne reações internacionais. Apenas a Comissão da União Europeia e da China reagiram. Já a França diz que acompanha de perto a situação:

Os pan-africanistas e defensores da soberania da África, como Kemi Seba, presidente da ONG Urgences Panafricanistes, veem neste golpe uma nova vitória para os defensores de uma África livre. Kemi Seba convida o novo líder a seguir o exemplo dos militares em Mali e em Burkina Faso.

GOLPE DE ESTADO NO GABÃO 🇬🇦

O general e irmão Brice Oligui Nguema, chefe da Guarda Republicana, é o líder do golpe. Será, sem dúvida, quem liderará a transição, que provavelmente durará entre 2 e 3 anos, segundo as nossas fontes.
Nós o encorajamos…

Uma nova página na vida política do Gabão acaba de ser virada com esta retirada forçada do ex-presidente do Gabão e o fim da dinastia política da família Bongo. A questão agora é saber se, nas próximas semanas, a CTRI se mostrará capaz de governar, de manter uma relativa paz social, e de definir um modelo de transição na pendência de novas eleições.

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