Os regimes autoritários têm há muito tempo uma relação complicada com os meios e as tecnologias de comunicação. O Unfreedom Monitor é uma iniciativa de investigação da Global Voices Advox que examina o fenômeno crescente do autoritarismo em rede ou digital. Este trecho do relatório sobre o Egito faz parte da série de relatórios que resultam da investigação do Unfreedom Monitor. Leia o relatório completo aqui.
Em 2021, a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) classificou o Egito como um dos maiores carcereiros de jornalistas do mundo. Dos 180 países em 2021, o Egito ocupou o 166º lugar, depois da Líbia e da Guiné Equatorial. De acordo com a RSF, metade dos meios de comunicação no país pertencem ao governo ou está afiliada aos serviços de inteligência. O restante pertence a empresários pró-governo. Os poucos sites de imprensa independentes que ainda estão abertos foram bloqueados. Seus proprietários e editores foram presos e libertados pouco depois, como aconteceu com Mada Masr e Al-Manassa. Mais de 500 sites foram bloqueados no Egito e mais de 100 jornalistas foram presos desde 2014. A adoção de novos regulamentos, como a lei antiterrorismo, a lei do cibercrime, e a criação do Conselho Supremo de Regulação da Mídia suprimiram a liberdade de expressão e fecharam o caminho para uma imprensa livre. Essas novas leis e regulamentos afetaram o trabalho de jornalistas que correm o risco de serem acusados de pertencer a um grupo terrorista ou de espalhar notícias falsas. Para a comunidade internacional, o Egito nega a detenção de jornalistas pelo seu trabalho, o que é verdade até certo ponto porque a segurança egípcia tenta prender jornalistas sob acusações como a de pertencerem a grupos terroristas, mas sem vinculação direta ao seu trabalho jornalístico.
A análise da Airtable realizada neste projeto tenta refletir a situação em torno da tecnologia de monitoramento através de conteúdo on-line nos últimos anos. Podemos ver um objetivo repetido de restringir a liberdade dos espaços on-line e proibir qualquer narrativa paralela à oficial. Isso pode ser visto nas ordens do Procurador-Geral para estabelecer uma unidade para monitorar plataformas e atividades de rede social, contrariando artigos constitucionais que protegem a privacidade das pessoas e seu direito à liberdade de expressão.
Ao monitorar as redes sociais, as autoridades visam ativistas ou oponentes e quaisquer atividades que possam atrair a atenção do público ou ser consideradas fora da estrutura tradicional do Egito, como o que aconteceu com os influenciadores do TikTok. Quase tudo poderia se encaixar em “segurança nacional” e “valores familiares”, desde processar uma vítima de violência sexual que usou as redes sociais como uma maneira de contar sua história em vez de protegê-la, até bloquear sites xiitas e denunciar YouTubers que falam sobre Bitcoin em seus canais.
É difícil estimar as despesas do governo egípcio com importação e implementação de tecnologia de vigilância. Mesmo quando o governo anunciou a instalação de câmeras de CFTV e tecnologia de reconhecimento facial, essa declaração e notícia vieram sem explicação de qualquer medida de privacidade ou regulamentação para o seu uso. Um dos relatos na análise afirmou que, depois que uma fonte oficial anunciou o uso de câmeras de reconhecimento facial em ruas e estações de metrô, eles recuaram e se recusaram a comentar. Esta medida pode ser explicada à luz da preocupação de que esta declaração possa alarmar a comunidade global de direitos humanos sobre o uso egípcio desta tecnologia.
Não faz sentido a comunidade internacional criticar a administração egípcia por violar os direitos das pessoas sem tomar medidas severas para acabar com tais práticas. Países como a Alemanha e os Estados Unidos denunciaram várias vezes o histórico do Egito em matéria de direitos humanos. No entanto, por outro lado, eles continuaram a fornecer o mesmo sistema com tecnologia de vigilância avançada sob a disposição de “proteção de fronteira”. A França tem fortes laços com os serviços de segurança e fornece a eles tecnologia inteligente usada para rastrear dissidência, espionar e prender pessoas LGBTQ+. Embora as forças de segurança tenham matado um dos seus cidadãos no Egito, a Itália só retirou o seu contrato de armas com o Egito após pressão da comunidade nacional e internacional. Não há culpa em países como a China, Rússia ou Israel por exportar essa tecnologia para o Egito. A verdadeira culpa deve recair sobre os Estados que se promovem enquanto pioneiros da liberdade e defensores dos direitos humanos. Ao mesmo tempo, não conseguem deixar de exportar a utilização bifacetada da tecnologia de vigilância para países autoritários para seu benefício econômico.
Leia o relatório completo aqui.