Investigadora cumpre pena de prisão efetiva após lhe terem cancelado a bolsa

Autorretrato de Maria de Lurdes. Foto: Facebook

Autorretrato de Maria de Lurdes. Foto: Facebook, publicada com permissão.

Maria de Lurdes Lopes Rodrigues é uma investigadora portuguesa que foi presa na semana passada por ter “injuriado” um grupo de magistrados num processo judicial antigo que a estudante travou contra o Ministério da Cultura por lhe ter “retirado” a hipótese de obter uma bolsa para estudar na Holanda nos anos 90.

O ocorrido está a levantar uma onda de indignação nas redes sociais, entre amigos e desconhecidos, são muitos os que consideram a prisão de Maria de Lurdes de injusta:

È pena que a lei não seja aplicada para todas as pessoas da mesma maneira, por isso nos sentimos todos revoltados com situações destas e outras, as leis aplicadas são vergonhosas.

A investigadora foi capturada na quinta-feira (29.09) – quatro anos depois de emitido o mandado de detenção (2012) – e levada para o estabelecimento prisional de Tires onde vai cumprir uma pena de prisão efetiva de três anos por “crimes menores como injúria e difamação”, dizia um artigo publicado, em 2013, no jornal “Diário de Notícias”(DN):

Maria de Lurdes, a mulher de 47 anos que foi condenada a cumprir três anos de prisão efetiva por crimes menores como injúria e difamação (…) está para ser detida desde 20 de dezembro de 2012. Foi esta a data de emissão do mandado de detenção pela juíza da 4.a Vara Criminal de Lisboa. A mulher que ofendeu as mais altas magistraturas da nação, incluindo o ex-procurador-geral da República Pinto Monteiro, ainda não foi detida porque o seu paradeiro está por confirmar.

Segundo o DN, o bastonário da ordem dos advogados em 2013, Marinho Pinto, considerava a condenação de “absolutamente insólita e rara”, comparando este caso com outros mais mediáticos que acabaram por ser arquivados:

É raríssimo alguém ir preso neste país por crimes como difamação ou injúria. Se essa senhora tivesse dinheiro para pagar uma boa defesa não seria presa”, considerou. Por ofensas do género, à honra e ao bom nome, personalidades como Miguel Sousa Tavares ou José Manuel Coelho foram absolvidos em processos mediáticos.

Miguel Sousa Tavares é um conhecido jornalista e escritor Português que, em 2014, chamou ao Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, de “palhaço”. O escritor foi processado pelo Ministério Público, mas o caso acabou por ser arquivado. O seu advogado, Francisco Teixeira da Mota, comparou o sucedido ao caso da investigadora:

Francisco Teixeira da Mota, que foi advogado de Miguel Sousa Tavares no caso em que o escritor foi processado pelo Ministério Público por chamar “palhaço” ao Presidente da República (processo que foi arquivado), considera “um escândalo esta condenação”. “Condenar a prisão efetiva a utilização de expressões, ainda que ofensivas da honra e da consideração seja de quem for, é um absurdo”. Teixeira da Mota, um especialista em matéria de liberdade de expressão, sublinha que esta mulher “já nem tem a opção de tentar uma queixa no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, uma vez que o acórdão que a condenou transitou em julgado há mais de seis meses”, isto é, a l8 de abril de 2012.

Maria de Lurdes tem vivido uma verdadeira “cruzada contra o poder judicial”

Em 1996, a estudante viu o Ministério da Cultura, chefiado por Manuel Maria Carrilho, retirar-lhe uma bolsa de estudo de longa duração para estudar cinema na Holanda, descreve o amigo, Mário Gomes, num apelo, para “libertar a Maria de Lurdes”, publicado na sua página do Facebook:

A Lurdes está presa desde ontem porque ousou questionar o poder discricionário de Manuel Maria Carrilho (MMC) enquanto Ministro da Cultura. MMC retirou-lhe uma bolsa – que ela tinha ganho por mérito em segundo lugar e porque o primeiro da lista desistiu (…)

Depois de saber que a bolsa não lhe foi atribuída por suspeita de falseamento do júri de atribuição das bolsas por duas funcionárias do Ministério da Cultura, Maria de Lurdes decidiu levar o caso a tribunal. Segundo o jornal semanário “O Independente” – entretanto extinto, a candidata a bolseira desencadeou múltiplos recursos hierárquicos, judiciais e queixas-crime por lhe ter sido recusada a bolsa”, considerando uma “flagrante injustiça que decorre do espírito de impunidade que reina na administração pública”.

No Facebook, Mário Gomes declara que:

A Lurdes denunciou, no ano lectivo de 96/97, as ilegalidades cometidas na atribuição de uma bolsa no estrangeiro (de longa duração) para estudar cinema. E conseguiu encostar o Ministério da Cultura de Manuel Maria Carrilho às cordas. (…)

Inconformada, Maria de Lurdes apresentou vários pedidos de reconsideração da decisão de Manuel Maria Carrilho incluindo exposições por escrito ao primeiro-ministro António Guterres, ao provedor de Justiça, Menéres Pimentel, e ao próprio ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho. O processo chegou ao Supremo Tribunal de Administração (STA) que não deu “provimento às suas pretensões”. Foi então que a investigadora “apresentou queixa-crime contra os juízes que subscreveram o acórdão do STA”.

Mário Gomes recorda que:

Ela ganhou o processo ao Carrilho mas perdeu os seguintes com um Juiz a quem acusou de corrupção, porque no seu entender se punha sempre do lado do ministro.

De acordo com “O Independente”, Maria de Lurdes acusou os juízes de terem sido “coniventes com o roubo de atas do júri, por parte do GRI” – Gabinete de Relações Internacionais do Ministério da Cultura. Documentos que, segundo a acusação, eram “essenciais para a avaliação da veracidade da fundamentação invocada pelo GRI e que serviu de base ao despacho do ministro da Cultura”.

O Juíz pediu por três vezes os Pareceres ao Júri que consubstanciava a atribuição da bolsa – esses Pareceres nunca apareceram pela simples razão que nunca existiram conforme um dos membros admitiu à Lurdes. O Juiz perante a evidência desta ilegalidade… arquivou o Processo!?…

O advogado da estudante, Fernando Seabra, declarava ao “Independente” que o modo de seriação dos candidatos careciam de “parecer sobre o interesse e/ou prioridade” na formação ou especialização” dos candidatos à bolsa. Entretanto, uma fonte do gabinete de Menéres Pimentel reconheceu ao mesmo semanário que:

Apesar de terem sido detetadas irregularidades ao nível de fundamentação, o provedor não podia recomendar à Administração que reclassificasse a candidata a bolseira porque as bolsas já estavam vencidas, o que implicava que qualquer recomendação não teria utilidade, pois o prazo para a revogação do ato já tinha caducado.

O pesadelo que a investigadora, candidata a bolseira, estava a viver com a justiça portuguesa parecia não ter fim. Mário Gomes salienta que:

Lembramos que o Ministro Carrilho e os tribunais tinham-lhe dado cabo da vida. Mas completamente, tirando-lhe a bolsa, impedindo-a de continuar a estudar cinema na Holanda e nem lhe certificando o Curso em Belas Artes por não reconhecerem as disciplinas na área do Cinema que fez na Checoslováquia.

Em 2000, o tribunal acabaria por condenar a investigadora a uma pena de três anos de prisão efetiva. A alternativa à prisão seria o internamento:

A alternativa era um tratamento psiquiátrico que ela recusou com uma declaração da sua médica de família a afirmar que ela não prefigurava qualquer caso clínico.

Comprovada a sua robustez física e psíquica, Maria de Lurdes recusou o internamento. Manteve-se contumaz até à sua captura, em setembro último. A investigadora está presa, no Estabelecimento Prisional de Tires.

11 comentários

  • Joao Semfim

    A isto se chama justiça? Prender uma estudante por 3 anos, porque foi-lhe retirada a bolsa? Não acredito que isto ocorra nem na Venezuela ou Coreia do Norte. Pelo que é dito, ele devia ter fugido para um país que não tenha tratado de extradição com Portugal! Como estamos vulneráveis!

  • gviegas

    Quem rouba e destrói a vida humana não vai para a prisão. Mas quem se mete com o paranóico carrilho, que só soube gastar dinheiro em casas de banho luxuosas, quando foi ministro, ou um órgão que se considerara imune e superior, está tramado!

  • carlos

    justiça de merda feita por escroques que se julgam superiores a tudo e todos…

  • Margarida Carvalho

    meu Deus, Senhor só tu contra esta corja… Não há por aí homens e mulheres sem medo contra a corrupção?

  • Mariazinha

    Está presa por insinuar que há juízes corruptos? Bem, se dúvidas restassem, esta sentença deixa-nos esclarecidos… Não tenho palavras suficientemente vis para qualificar o palhaço que proferiu esta sentença. É o corporativismo a funcionar em pleno. Camelos.

  • Engº Costa e Sousa,João

    A quem serve a prisão desta senhora de nome Maria de Lurdes Lopes Rodrigues que apenas
    pretendia que lhe fosse concedida uma bolsa para estudos, na área do Cinema, na Holanda ??
    Sugiro e Apelo por isso a Manifestação Nacional para a sua imediata Libertação ! !
    Parece ser um caso semelhante a um outro que conheço de um Técnico Superior deste País
    que está sem desempenhar funções públicas há mais de 25 (!) anos por aquele encerramento
    de serviço que terá sido extinto,não as tendo voltado a exercer ! Porquê ? A quem serviu ?

  • Engº Costa e Sousa,João

    Este caso de Maria de Lurdes Lopes Rodrigues é,como todos aqui já perceberam, muito antigo !
    É necessário um Advogado capaz de requerer a imediata Libertação da referida Senhora !
    Gostaria que as pessoas que aqui se apresentam pudessem pensar em alguém que assumisse
    essa responsabilidade que não deve ser difícil para alguém detentor dessa habilitação e que não
    goste de” brincadeiras”! Quem poderá ser esse Advogado(a) ?
    Renovo,portanto,o Apelo que aqui fiz mesmo há pouco tempo ! Neste momento não posso, no
    entanto, assegurar uma eventual despesa pelos honorários desse Advogado(a) ! Mas,se formos
    muitos,essa despesa será menor ! Pensem,por favor ! Estou ao dispor para fazer contactos !

    • Miguel Teixeira

      Um crowdfunding para esta causa nobre seria perfeitamente justificado.

      • Engº Costa e Sousa,João

        Meu Amigo,obrigado por ter acreditado no meu comentário,apenas interessado em resolver um assunto que” não cabe na cabeça de ninguém”!
        Já há muito que não vejo comentários e hoje fiquei surpreendido por ter
        visto o seu ! Veja se pode encontrar Adv(a) para este efeito ! Vamos pagar
        por todos para libertar essa Senhora que mais não fez que pedir uma bolsa!
        Eu irei desde já fazer isso, mas era preciso juntar um número suficiente de
        aderentes a esta causa ! Fica desde já combinado que logo que quem tiver
        esse conseguido Adv(a) que “não goste de brincadeira”,deve comunicá-lo
        aqui para que todos os interessados em aderir,saibam !
        Um abraço,
        Engº Costa e Sousa,João

  • ANTÓNIO MANUEL MARTINS MIGUEL

    Onde andam os Varas, os Oliveiras, os Ricardos Espírito Santo, os Duartes e os Limas, os Valentins e os Loureiros, os Cavacos e os Silvas, os Ferreiras e os Amarais, Os Pedro, os Passos e os Lopes, os Coelhos e os Manueis, toda uma corja que se aproveitou dos tachos e da sua liberdade irresponsável? BASTA !!!! OH MÍDIA O QUE ANDAS A FAZER? OH POVO POR QUE TANTO DORMES!!!??

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