Este artigo tem a co-autoria de Maira Sutton (@mairasutton) e Katitza Rodriguez (@txitua) da EFF
Ontem (19 de janeiro) foi um dia decisivo para a comunidade global da internet. Os efeitos do massivo “apagão” on-line em protesto contra as leis estadunidenses SOPA e PIPA (H.R. 3261 e S. 968) , que criariam listas negras na internet, repercutiram em todo o mundo. Inúmeros sites, incluindo Google, Wikipedia, Mozilla, Reddit, BoingBoing, Flickr, Wired , e muitos outros, estiverem juntos em uma ação global contra os por demais generalizados e mal elaborados projetos de leis sobre direitos autorais que desrespeitam princípios fundamentais da arquitetura da internet. Citando [pdf] o Relatório do ano passado sobre Liberdade de Expressão e Opinião do Relator Especial da ONU, o qual é um marco na história: “…Medidas de censura nunca deveriam ser deliberadas por uma entidade privada, e [..] ninguém deveria assumir a responsabilidade por um conteúdo na internet do qual não seja autor…” A oposição em massa feita em todo o mundo, tanto por empresas como indivíduos, demonstra o quanto estas [SOPA e PIPA] e outras leis prejudicariam tanto negócios como a capacidade inovadora da sociedade, e ainda mais importante, restringiriam a liberdade de expressão on-line.
Mas SOPA e PIPA são apenas a ponta de um iceberg. Os mesmos interesses por detrás dessas leis domésticas nos Estados Unidos continuam a pressionar outros Estados a aprovarem leis nacionais semelhantes, como também para negociarem, em segredo, acordos comerciais internacionais que obrigariam países signatários a obedecerem à estas normas legais. O Acordo Comercial Anticontrafação (ACTA) (por sua sigla em inglês), o Acordo Comercial Trans-Pacífico TPP(por sua sigla em inglês), a Lei Doring (México), a Lei Sinde (Espanha), e a Lei Hadopi (França) são apenas alguns exemplos. Os grupos lobbistas da indústria dos direitos autorais, como a “Motion Picture Association of America” (MPAA) e a Federação Internacional da Indústria Fonográfica (IFPI, por sua sigla em inglês), estão canalizando todos recursos possíveis para persuadirem Estados a aprovarem leis de direitos autorais que são inerentemente problemáticas. Quais resultados, leis que desrespeitam a soberania nacional, ultrapassam os princípios tradicionais da jurisprudência, prejudicam a criatividade e, finalmente, violam os direitos dos usuários, podem ter ?
Internacionalmente, ativistas e organizações em pró da liberdade civil digital encontraram no dia da ação on-line uma oportunidade única para explicarem aos próprios compatriotas, quais efeitos tais leis podem ter em sites dos países deles e no futuro da internet livre e aberta. Ao reconhecer que essas leis possuem pontos em comum; como critérios generalizados para serem executadas, além de defeitos técnicos; tais organizações assumiram uma postura contra os esforços movidos pelos interesses em censurar cidadãos e em eliminar a criatividade em nome da preservação do [atual] modelo de negócios da indústria do entretenimento.
EUA disseminam medidas genéricas para o cumprimento da lei do IP atavés de acordos internacionais secretos, ameaçando utilizarem sanções comerciais
Nos últimos anos, os principais lobistas da indústria dos direitos autorais têm procurado maiores poderes para reinforçar tais direitos, preservando modelos de negócios que os beneficiam em todo mundo. Esse movimento tem estado em processo em vários fóruns internacionais, os quais incluem a cúpula do G8, acordos comerciais transnacionais como o ACTA e o TPP, e o Relatório Especial Anual 301–um relatório com um ranking de países “em observação” no que se refere a supostas deficiências em leis de propriedade intelectual e políticas para o cumprimento destas. Como o U.SSG.Public InterestGroups (Grupos em pró do interesse público dos EUA) e estudiosos europeus perceberam, o SOPA inclui dispositivos que visam consolidar ainda mais a influência dos detentores dos direitos de IP nos Estados Unidos sobre leis e políticas públicas de outros países. Enquanto a aprovação do SOPA e do PIPA podem certamente ter consequências prolongadas para sociedades e economias do mundo inteiro, esperemos que a enorme atenção dada à estes dois projetos de lei que visam a criação de listas negras para a internet, aumentem a consciência internacional sobre o impacto que tais propostas de leis dos direitos autorais sustentadas por titulares de direitos de IP dos EUA podem ter em todo o mundo.
La Quadrature DuNet, uma organização de advocacia, com sede na França, declarou:
This site has gone dark today in protest of the Stop Online Piracy Act (SOPA) and PROTECT-IP Act (PIPA) discussed in the US Congress, as well as the Anti-Counterfeiting Trade Agreement (ACTA), currently debated in the European Parliament. These initiatives amount to a global attempt to censor the Internet in the name of copyright.
Internet Policy and Public Interest Clinic (CIPPIC), um grupo de advocacia sediado no Canadá, declarou:
[SOPA and PIPA] is yet one more example of the harms that can result for an overly aggressive, no holds barred, U.S.-driven IP agenda. It imposes more restrictive standards on foreign intermediaries than the U.S. requires of its own Internet companies through its DMCA notice-takedown regime.
O grupo chileno em defesa dos direitos digitais, Derechos Digitales, também se opões ao projeto, baseando-se no argumento que o SOPA impõe um sistema de execução de leis em favor dos direitos autorais que extrapolam limites :
So while many of us speak out against the U.S. bill, the governments of Chile, Peru, New Zealand, Australia, Brunei, Singapore, Malaysia and the United States are moving quickly on a new international agreement that reproduces one of the greatest threats of SOPA: censorship of Internet sites for possible infringements of copyright, giving police powers to Internet service providers. (Read here and here in Spanish)
Markus Beckedahl, presidente da Digitale Gesellschaft, um grupo alemão em pró dos direitos dos usuários, explicou para o público alemão:
If only half of the proposed legislation comes into force, this is going to have a huge negative impact on the internet. ACTA, PIPA and SOPA are of similar kind: Music and film industries try to destroy the net slice for slice – the so called salami tactics.
Read more here, here, here, and here (in German)
Se apenas metade da legislação proposta entrar em vigor, isso vai ter um enorme impacto negativo na internet. ACTA, PIPA e SOPA são semelhantes: as indústrias da música e do cinema tentam destruir a rede de fatia em fatia – a então chamada “tática do salame”.
SOPA e PIPA afetariam soberanias nacionais e prejudicariam economias locais
Em países onde políticos estão atualmente debatendo propostas para o bloqueio de sites, a adoção do SOPA ou do PIPA criaria pressões para a adoção de leis espelhadas nas dos EUA, independente de qualquer evidência empírica de que tenham eficácia ou sejam apropriadas. O que é mais embaraçoso para indivíduos e empresas que estão fora dos EUA é a maneira como SOPA e PIPA podem efetivamente passar por cima das leis nacionais dos países e impor normas que são mais restritivas para intermediários da internet fora dos EUA do que àquelas impostas para empresas de internet dos EUA.
50 organizações de direitos humanos de todo o mundo assinaram uma carta em oposição ao PIPA para o Senador dos EUA, Harry Reid, líder da maioria no Senado, destacando os graves problemas jurisdicionais e de liberdade de expressão:
…Creating a mechanism that requires a representative of a website to make a court appearance in the U.S. in order to defend themselves against an allegation of infringement would disproportionately impact smaller online communities and start-ups based abroad that do not have the capacity to address concerns in the United States.
Open Rights Group , um grupo com sede no Reino Unido, também enfatizou as implicações que essas leis super generalizadas dos Estados Unidos sobre “listas negras” na internet podem ter:
There are two reasons that Open Rights Group are supporting a protest aimed at US laws. First, the overly broad definitions and wording of the bills put any websites at risk of action from US authorities. Second, we face many of the issues with these copyright-related bills here in the UK: inappropriate enforcement measures, in particular website blocking; overly-broad or vague definitions and wording; and weaknesses in due process and redress.
Michael Geist, um conceituado estudioso canadense sobre direito, liberdades civis e direitos autorais digitais, chama atenção para o impacto que SOPA e projetos de lei paralelos, como o ACTA e o TPP, podem ter no Canadá :
While SOPA is proposed U.S. legislation, it has implications for all Canadians, including provisions that treat all Canadian IP addresses as if they were subject to U.S. jurisdiction. Moreover, Canada faces the same relentless copyright lobbying campaign. From the much-criticized digital lock rules found in Bill C-11 to the Anti-Counterfeiting Trade Agreement to the proposal to extend the term of copyright protection in the Trans Pacific Partnership, Canadian copyright policy is increasingly shaped by the same groups promoting SOPA.
Global Voices Online informou aos leitores:
[PIPA/SOPA] would raise the cost of participation on [social media and other user generated sites] for all users worldwide, and could force many social media projects to shut down, especially smaller websites and businesses.
OpenMedia.ca, um grupo de advocacia sediado no Canadá, alertou:
As Canadian Internet users and online innovators, we have a lot to lose if SOPA is passed. SOPA could fundamentally reshape the Internet in the U.S., Canada, and the rest of the world. … Tell Prime Minister Stephen Harper and Gary Doer (Canada’s Ambassador to the U.S.) that Canadians are against SOPA.
Ameaça aos direitos humanos e ao acesso à informação em todo o mundo
A maioria das críticas feitas contra o SOPA e o PIPA tem incidido sobre a forma como os projetos de lei instituiriam uma censura massiva on-line e quebrariam os princípios da internet em nome do reinforçamento de leis de propriedade intelectual. Esses projetos abrangeriam qualquer site estrangeiro acessível nos EUA e dariam às corporações e às outras empresas privadas, novos poderes para censurarem sites em todo o mundo, através de sentenças judiciais que desativariam domínios de nomes, processamento de pagamentos e anúncios.
Internet Governance Caucus, grupo composto por organizações da sociedade civil e por indivíduos de todo o mundo, ao participarem do Fórum das Nações Unidas para Governança na Internet, reafirmaram o que leis que criam ‘listas negras’ na internet implicam:
We have made a decision to join the black out in protest of the arbitrary censorship of the Internet which violates people’s rights to responsibly use the Internet. We note with increasing concern the the various censorship mechanisms around the world including but not limited to India’s Intermediary Guideline Rules (IGR) nor the United States of America’s Stop Online Piracy Act (SOPA)and Protect IP Act (PIPA). Any country’s censorship mechanisms affect ordinary Internet users all over the world.
Amnesty International, uma organização mundialmente reconhecida que luta contra injustiças e pela promoção dos direitos humanos, observou que “[PIPA and SOPA] would create a powerful and unprecedented market incentive to censor user generated content. And their passage would signal very clearly to countries around the world that it is OK to sacrifice some rights in the name of some other good.”
Greenpeace, uma organização global em defesa do meio-ambiente, denuncia tais leis de forma incisiva:
If SOPA/PIPA become law, sites like Greenpeace.org could go dark simply because one of our corporate targets files a claim that its intellectual property rights have been violated. No proof required, no court hearing.
Article 19, uma organização internacional em favor da liberdade de expressão afirmou:
[PIPA/SOPA] will stifle free speech, innovation and undermine Internet security, all for the sake of Hollywood studios.
O ‘apagão’ da quarta-feira (18 de janeiro) significa uma nova era para o movimento global dos direitos digitais civis. Através de blogs, tweets e posts, milhares de organizações, ativistas e indivíduos realmente fizeram o sucesso que o dia foi. Acima, está apenas uma amostra do grande trabalho em defesa [da internet] que aconteceu ontem. Abaixo estão os nomes de outras organizações, grupos ativistas e até partidos políticos que participaram deste dia muito importante para o futuro da internet: