Rússia envia dirigente envolvido em escândalo de assédio sexual para a Comissão sobre a Situação das Mulheres, organizada pela ONU em 2019

Leonid Slutsky representando a Rússia na reunião de inverno da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa) em 2017 // OSCE PA Flickr sob CC2.0

A Rússia enviará uma delegação para a Comissão das Nações Unidas sobre a Situação das Mulheres de 2019, que será realizada na sede da ONU em Nova Iorque entre os dias 11 e 22 de março, mas a escolha do líder da delegação surpreendeu algumas pessoas.

Leonid Slutsky, membro do partido populista de extrema direita PLDR (Partido Liberal Democrático da Rússia) da Duma Federal, esteve no centro de um escândalo que começou em março de 2018, quando várias repórteres que trabalhavam no parlamento o acusaram de assédio sexual. 

Leonid Slutsky, parlamentar propenso a agarrar repórteres pela virilha, será relator da situação das mulheres na Rússia durante viagem paga pelos contribuintes para Nova Iorque.

— Рогозин-на-орбите (@LyapunovS) 8 de março de 2019.

A delegação russa inclui quatro mulheres que representam os principais partidos da Duma, a baixa-câmara do Legislativo russo. Leonid Slutsky (pronuncia-se SLU-tski, e não deve ser confundido com o treinador de futebol americano de mesmo nome) é legislador desde 2000 e agora preside o comitê de relações internacionais da Duma. Neste cargo, foi enviado para representar a Rússia em várias assembleias parlamentares internacionais, entre outros eventos e fóruns.

Apesar de apenas três mulheres terem saído a público com acusações contra Slutski, suspeita-se de que haja mais vítimas, que não quiseram se pronunciar por medo de passarem por um novo trauma ou pelo desejo genérico de esquecer o incidente e ficar de fora da história. 

Uma das vítimas, Farida Rustamova, da BBC russa, tinha uma gravação do seu encontro com Slutsky. Durante uma entrevista realizada em seu escritório na Duma, Slutsky fez vários comentários obscenos para Rustamova e depois tentou agarrá-la pela virilha apesar de seus claros protestos. Ela apresentou uma transcrição da gravação ao comitê da Duma, que se recusou a considerar a evidência contra Slutsky e o liberou de qualquer infração.

Quando ficou claro que Slutsky não seria responsabilizado pelas suas ações, uma porção de veículos de informação independentes da Rússia declarou um boicote à Duma, divulgando reportagens e comprometendo-se a não esconder a relação do parlamento com o escândalo de assédio. No entanto, o protesto não foi para frente, a maioria das empresas retomou seu trabalho normal e algumas das jornalistas vítimas de assédio foram redesignadas, pois não se sentiam seguras nos corredores do Parlamento.

O Sindicato dos Jornalistas Independentes e Profissionais de Mídia encaminhou uma petição com mais de 700 assinaturas à Assembleia Parlamentar da OSCE, exigindo que as credenciais de Slutsky fossem revogadas, para deixar claro que não cabe à Assembleia decidir quem deve representar ou não o país. E como não existe nenhuma lei na Rússia sob a qual Slutsky poderia ser incriminado por assédio sexual no local de trabalho, é improvável que qualquer outra organização internacional faça a reavaliação da sua cadeira na Comissão. Também é improvável que uma lei sobre assédio seja aprovada a médio prazo: a única mulher no legislativo da Duma evocou a possibilidade de ressuscitar uma lei feita há 15 anos para criminalizar assédio sexual no trabalho, mas não houve nenhum progresso até o momento.

É interessante que Oksana Pushkina, única mulher membro do parlamento a apoiar aquelas que acusaram seu colega de assédio, não tenha sido incluída na deleção para a Comissão sobre a Situação da Mulher. Ao invés disso, irá Tamara Pletnyova, do Partido Comunista, que apoiou Slutsky durante o escândalo. Pletnyova é conhecida por sua visão conservadora e fez várias declarações polêmicas recentemente: aconselhou que mulheres russas não tivessem relações sexuais inter-raciais durante a Copa do Mundo de 2018 e disse que homossexuais eram “doentes” e precisavam ser “curados” durante uma entrevista em rede nacional.

A Rússia fez 73.1 pontos em 100 no índice de desigualdade de gênero. Ocupa o penúltimo lugar entre todos os países da antiga União Soviética, acima apenas do Uzbequistão.

— Настоящее Время (@CurrentTimeTv) 8 de março de 2019.

Considerando que a pontuação russa está bem distante do recorde em proteger os direitos das mulheres e assegurar igualdade de gênero, a nomeação de Slutsky à frente da delegação nacional enviada para um fórum internacional sobre a situação das mulheres só pode ser considerada uma piada de mau gosto.

 

_______________

Revisado por Nina Jacomini

Inicie uma conversa

Colaboradores, favor realizar Entrar »

Por uma boa conversa...

  • Por favor, trate as outras pessoas com respeito. Trate como deseja ser tratado. Comentários que contenham mensagens de ódio, linguagem inadequada ou ataques pessoais não serão aprovados. Seja razoável.