Como “Pequenas” Nações Africanas Atraem a Atenção Mundial?

GV Citizen Media Summit #gv2012

Como moderadoras deste painel estavam Janet Gunter, que contribui para o Global Voices em Português, e Julie Owono, do Camarões.

Janet falou sobre um painel que partilhara recentemente com Julie sobre tecnologia e TIC. Tais painéis frequentemente têm uma baixa representação de anglófonos do Quênia, da Nigéria ou da África do Sul. Janet e Julie, então, organizaram um painel para dar oportunidade aos países com uma “voz ainda menor”. Por que há países que conseguem dizer menos? São, por vezes, separados por diferentes idiomas. Por vezes, agências de notícia não têm interesse em cobrir esses países. Noutros casos, relações coloniais históricas produzem “pontos cegos” para a mídia internacional.

Adérito Caldeira, do jornal @verdade, de Moçambique, conta-nos sobre os protestos do pão em 2010 [Confira artigo da BBC, em inglês e no Global Voices, em português], na capital, Maputo. O governo no país costumava subsidiar os preços do pão e de combustível. Em agosto de 2010, decidiram por aumentar os preços. Em seguida, um SMS viral se espalhou, a encorajar as pessoas à ação no dia 1º de setembro, quando estava marcado o aumento de preços. Nessa noite, o chefe de polícia entrou online para desestimular que as pessoas se manifestassem.

Certas ferramentas de mídia cidadã já estavam presentes, inclusive uma instalação do Ushahidi feita para as eleições anteriores. Mas mídia cidadã também acontece offline – @Verdade publica um jornal que se tornou um dos maiores do país. Naquela manhã, logo cedo, Adérito recebeu um SMS para informar que havia pneus sendo queimados em Maputo. Em pouco tempo, ninguém conseguia entrar ou sair da cidade. Os residentes de outras apressaram-se para sair, mas ficaram congestionados. Nesse ambiente de crescente desinformação, o @Verdade passou a divulgar as notícias mais atualizadas. Quando a Internet deles caiu, a publicação recorreu ao Facebook e recuperou sua estrutura do Ushahidi. A história foi compartilhada no Global Voices. Quando a polícia começou a atirar contra as pessoas, o @Verdade continuou a usar o Facebook e o Ushahidi para indicar as áreas seguras para as pessoas e orientá-las para mantimentos e recursos.

Janet perguntou se a mídia ocidental o contactou apenas depois que pessoas haviam sido mortas– a mídia ocidental dá atenção somente à contagem de corpos? Adérito responde que só entraram em contato depois que um garoto havia sido morto. Um dos repórteres do @Verdade estava na greve e notou que a polícia estava a usar as armas AK-47s. Ele viu um garoto morrer diante de seus olhos.

Repórteres internacionais estavam no local nesse momento? Provavelmente não. A BBC tinha um correspondente lá, mas ele mantinha-se próximo da mídia corporativa, que não estava a reportar a história.


Sara Moreira contou a história do golpe de estado na Guiné-Bissau em abril deste ano. Esse país da África ocidental é a casa de mais de 1.6 milhão de pessoas e foi colônia portuguesa por muitos anos, até conquistar independência em 1974. Português é a língua oficial, mas apenas 14% da população fala português. A política no país tem se constituído de uma sucessão de golpes, especialmente nos últimos 15 anos. Nenhum presidente eleito terminou o seu mandato.

A tensão esteve alta em Guiné-Bissau no começo deste ano, após a morte do então-presidente em Janeiro. Em sequência às eleições de Março, o Global Voices reportou sobre alegações de eleições injustas. Tensão cresceu também com a pressão de militares guineenses para que o exército angolano lhes entregasse armamento.

Nos dias anteriores ao golpe, Sara esteve em contato com jornalistas portugueses sobre a tensão crescente. Mas a pessoa que fez o furo de notícias foi o blogueiro local Aly Silva (que escreve no blog Ditadura do Consenso). Durante o furo de notícias do golpe, Aly manteve seus leitores atualizados sobre a movimentação dos militares, a cada tomada de quartel. No dia seguinte, ele foi preso pelo exército. Funcionários do Hospital Nacional usaram o Facebook para pedir material hospital, enquanto também noticiava as últimas no terreno. Dois dias depois, numa manifestação pacífica em que manifestantes foram atacados, o hospital publicou imagem no Facebook.

Janet perguntou sobre a atitude da mídia portuguesa, que tomou uma posição bastante esnobe para com a mídia cidadã. Um dia após o golpe, Sara percebera no Twitter que jornalistas portugueses faziam piadas de que jornalistas cidadãos não eram confiáveis. Somente quando Sara ressaltou que a Al-Jazeera estava a retuitar os posts de blogueiros, que a mídia portuguesa passou a dar atenção.


Em seguida, Archippe Yepmou, do Internet Sans Frontières, pergunta sobre a última vez que escutamos sobre o Chade. Talvez tenha sido em 2008, quando se passou uma tentativa de golpe contra o presidente do país. Isso foi há quatro anos. Ele discute dois exemplos de coberturas limitadas sobre o Chade. Duas semanas antes da Cúpula do Global Voices, 7 oficiais de alto escalão, incluindo 2 generais, foram detidos ao mesmo tempo em que 2 corpos foram encontrados próximo à casa de governo. Dois dias antes, um general fora detido e outro general baseado na fronteira com o Sudão fora detido também. Simultaneamente, blogueiros noticiavam essas questões, e a BBC publicava um artigo que se chamava “Chade: Vitrine de Compras da África” [en].

Grande parte das notícias sobre o Chade partem da agência de notícias AFP, cujos jornalistas no Chade são por vezes vinculados ao governo, tal como o ministro de Comunicação. A Internet Sans Frontières está em busca de maneiras de empoderar blogueiros cidadãos de verdade.

Julie pergunta por que a blogosfera chadiana é tão pequena. A resposta é porque as únicas pessoas que podem blogar são rebeldes. Um amigo dele que é blogueiro e que mora em Paris, disse-lhe que a única forma de blogar é cruzar a fronteira para usar um cybercafé nos Camarões. O Chade é um país pequeno, mas detém um sistema completo de tecnologias de repressão na Internet: filtros aprofundados e derrubadas contínuas de criadores de página na Internet. Com 30,000 usuários do Facebook no país, o governo pode pagar pessoas que monitoram o que é dito. Um jovem foi preso por conta de sua página no Facebook e pode estar morto agora.

Julie pergunta como a mídia cidadã pode ser encorajada no Chade. Internet Sans Frontières procura proporcionar ferramentas melhores e suporte para os blogueiros.

Perguntas

Dan, do Al-Jazeera Stream, comenta que é às vezes difícil para que jornalistas interajam com blogueiros quando estes têm medo de como a sua fala sobre Internet para a imprensa vai repercutir. Global Voices tem tentado dar cobrir a Guiné Equatorial com blogueiros que moram na Espanha e em Portugal que fazem parte de associações de direitos humanos. É difícil encontrar blogueiros em campo que estejam dispostos a falar. Moçambique tem três ou quatro blogueiros regulares. As pessoas comentam sobre violência, futebol ou crime, mas as pessoas não comentam sobre política.

Uma blogueira de Nairóbi pergunta sobre a posição das mulheres na blogosfera chadiana, mas não há muitas mulheres blogueiras no Chade. Archippe Yepmou tem encorajado organizações da sociedade civil a incluírem mais mulheres. Janet ressalta que nenhuma das fontes em campo mencionadas no painel era mulher.

Outro participante perguntou sobre histórias de sucesso que tenham alcançado audiências internacionais. O Gabão tem um milhão de habitantes, com uma taxa de 9% de penetração de Internet e 150 blogueiros. Julie conta a história dos protestos no Gabão, que foram simultâneos à Copa Africana de Nações. Como as agências de notícias estão a escrever sobre futebol, as pessoas não ficaram sabendo dos protestos. Depois que o Global Voices deu início a uma página de cobertura especial sobre as tensões no Gabão [en], a situação recebeu cobertura internacional.

Adérito conta diversos casos de Moçambique. Nas eleições de 2009, @Verdade partilhou dados sobre votação e os postos policiais. As pessoas costumam enviar SMS e tweets para @Verdade. Num momento recente, a publicação foi capaz de fazer um furo de notícia sobre um tiroteio.

João Miguel, que escreve para o Global Voices em Português, fala sobre como alguns blogueiros egípcios mencionados em posts foram mortos ou detidos no ano passado. Como que os autores devem fazer para mencionar pessoas em seus posts nesses momentos? Seria preciso contactá-los? E como fazer isso se o governo os monitora? Julie conta um conta da Costa do Marfim. Durante a crise de 2011 [en], sempre entravam em contato e perguntavam para as pessoas antes de citá-las num post. they would always ask people before proceeding to quote people in a post. Eventualmente, um deles teve de partir para Nairóbi. Isso pode levar dias, mas é incrivelmente importante. Quando é sobre Guiné-Bissau, Sara sempre confirma com as pessoas envolvidas antes de citá-las.

Victor, do Malawi, sugere que busquemos aproximação com jornalistas internacionais e celebridades da diáspora para jogar luz a questões similares nesses países. Por fim, Julie relembra que estava marcada para o dia seguinte uma sessão dedicada à construção de uma rede de blogueiros africanos.

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