Das sombras à luz: Porque o acesso à informação importa na Jamaica

Imagem de destaque via Canva Pro.

Esse post, escrito por Emma Lewis, colaboradora da Global Voices, foi originalmente publicado no The Breadfruit Collective como parte de uma campanha caribenha para explicar o Acordo de Escazú e sua importância para os defensores do meio ambiente. Uma versão editada segue abaixo, com permissão.

“Desculpe, seu pedido foi negado.”

“Este é um acordo comercial, portanto, é confidencial.”

“Teremos que analisar o seu pedido e retornaremos a você, mas…”

Paradoxalmente, nessa famigerada “era da informação”, fatos, dados e até mesmo uma linha do tempo de eventos não são tão fáceis de encontrar como se imagina. Documentos que deveriam estar disponíveis para o público e on-line são frequentemente envoltos em mistério. Organizações, instituições e indivíduos podem sentir a necessidade de guardar informações para si mesmos, às vezes sem qualquer justificativa plausível para isso. Há a percepção de uma falta de interesse, tanto no setor público quanto no privado, em tornar a informação prontamente disponível. “Por que você precisa saber?” Podem perguntar. “O que isso tem a ver com você?” E a burocracia entra no caminho.

Pode-se ir tão longe ao ponto de dizer que uma cultura de sigilo persiste entre os países pós-coloniais da região caribenha. O Official Secrets Act continua em vigor em vários países caribenhos, incluindo as Bahamas, Barbados, Jamaica e outros. Isso apesar dos apelos de organizações da sociedade civil e de comentários de líderes políticos ao longo dos anos de que essa lei ultrapassada deveria ser revogada.

Enquanto defensores do meio ambiente na região enfrentam uma série de desafios, há uma necessidade urgente de destacar esse dilema relacionado à informação. É nesse contexto que o Acordo de Escazú — o primeiro tratado ambiental regional na América Latina e no Caribe — entra em cena.

O acordo (oficialmente chamado de Acordo Regional sobre o Acesso à Informação, Participação Pública e Justiça em Questões Ambientais na América Latina e no Caribe) foi adotado em Escazú, na Costa Rica, em 4 de março de 2018. Representa um marco significativo na garantia dos direitos ambientais e na proteção dos defensores do meio ambiente. Além disso, é o único acordo vinculante derivado da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), o primeiro acordo ambiental regional da América Latina e do Caribe, e o primeiro no mundo a conter disposições específicas sobre os direitos humanos de defensores ambientais.

Em conversa com a Dra. Theresa Rodriguez-Moodie, diretora executiva da Jamaica Environment Trust (JET), ela observou: “O acesso à informação é essencial para os defensores do meio ambiente, permitindo que nos manifestemos e participemos de decisões ambientais que afetam nossas vidas e meios de subsistência”. Como um dos pilares fundamentais do Acordo de Escazú, o acesso à informação está intimamente ligado aos seus outros objetivos principais: participação pública e justiça. Sendo um princípio fundamental do Acordo, é que ele capacita o público a ser informado sobre questões importantes que afetam suas vidas e garante justiça ambiental. Sem as informações relevantes, esses dois pilares desmoronariam.

O público precisa saber mais sobre o Acordo de Escazú pelo simples fato de que não é apenas mais um contrato de proteção ambiental. Ele trata de pessoas — os protetores do meio ambiente — e aborda, entre outras coisas, como recebem e compartilham informações sobre questões ambientais e a necessidade de proteger esses protetores, algo que é crucial, especialmente na América Latina, onde vidas estão frequentemente em risco.

Uma recusa persistente em fornecer informações, ou até mesmo formas sutis e complexas pelas quais seu acesso pode ser dificultado, pode impedir os defensores do meio ambiente de avançar. Como eles podem seguir em frente sem ter uma visão completa? A falta de transparência não apenas dificulta o trabalho deles; também impede qualquer tipo de discurso significativo com partes interessadas, instituições e indivíduos com os quais os defensores ambientais possam desejar dialogar.

Como resultado, surgem mal-entendidos. A comunicação falha. Rumores se espalham. E então, entram em cena os gêmeos malignos: desinformação (informação falsa disseminada intencionalmente) e má informação (informação errada compartilhada de forma não intencional). Tenho certeza de que estamos familiarizados com esses dois, especialmente nas redes sociais. Já sabemos que a distorção de fatos e informações pode causar danos tremendos à sociedade; certamente, pode impactar os defensores ambientais de várias maneiras, aumentando os preconceitos e a má representação do trabalho importante que realizam.

Então, qual é a resposta? Uma legislação bem estruturada é sempre um bom primeiro passo. Nem todos os países da região possuem isso, mas alguns estão atualmente trabalhando nessa questão, o que mostra que o Caribe está fazendo algum progresso nesse sentido. No caso da Jamaica, no entanto, a Dra. Rodriguez-Moodie acredita ser necessário analisar mais de perto a atual Access to Information Act, que, segundo ela, “precisa de revisão,” tornando “mais importante do que nunca garantir que esse direito sustente a transparência e uma defesa eficaz”.

Em uma outra entrevista, a defensora dos direitos humanos Susan Goffe destacou: “O princípio fundamental de todo o sistema de Acesso à Informação (ATI) é que as informações mantidas pelo governo pertencem ao povo. Há tantas informações que deveriam ser publicadas, divulgadas e liberadas de forma rotineira e proativa, eliminando a necessidade de fazer solicitações sob a ATI para esse tipo de informação, como, por exemplo, no setor de saúde pública. “Nesse sentido, Goffe considera a Lei de ATI de 2002 “uma das legislações mais importantes aprovadas na Jamaica nos últimos 25 anos com todas as suas falhas e problemas na implementação.”

A legislação jamaicana está atualmente em revisão após um relatório de 2011 de um comitê parlamentar, mas o processo está demorando muito, e Goffe expressa preocupações de que ela não deve ser enfraquecida de forma alguma. “Um dos problemas de longa data”, ela explica, “tem sido o tempo que muitas vezes leva para obter respostas e informações reais. Algumas agências e ministérios têm um bom histórico, enquanto outros são notoriamente ruins em suas respostas. A resposta precisa ser uniformemente boa em todo o governo”.

À medida que os desenvolvimentos infraestruturais, especialmente nas fragilizadas linhas costeiras das nossas ilhas caribenhas, continuam em ritmo acelerado, o acesso à informação se torna um grande desafio quando envolve desenvolvedores do setor privado. Durante a campanha “Save Goat Islands” na Jamaica, liderada pela JET e apoiada por várias organizações ambientais locais e internacionais, houve uma escassez de informações tanto por parte do governo quanto dos desenvolvedores propostos, a China Harbour Engineering Corporation, pois, os documentos relacionados eram um “acordo comercial” privado.

Em Granada, defensores ambientais enfrentaram grandes desafios; em outubro, o grupo Coral Cove ganhou um caso na justiça, contestando a decisão da Autoridade de Planejamento e Desenvolvimento de negar o acesso público às informações sobre os pedidos de planejamento, incluindo os planos de aplicação e os relatórios de Avaliação de Impacto Ambiental (AIA). No caso do desenvolvimento de alto padrão Pinnacle em Montego Bay, situado à beira de uma área de zonas úmidas protegidas, nenhuma AIA foi realizada, e o projeto está seguindo em frente, independentemente disso.

Portanto, há problemas com a legislação vigente. Com frequência, os defensores do meio ambiente são forçados a adotar ações legais, que são custosas e demoradas, como último recurso. Existe a burocracia sufocante que impede a busca dos defensores ambientais por informações. No entanto, há também uma necessidade ampla e urgente: nesta era da informação, o Caribe precisa passar de uma cultura de sigilo para uma de transparência e abertura.

Em outras palavras, precisamos sair das sombras em direção à luz. O Acordo de Escazú, que entrou em vigor em 22 de abril de 2021, deve ser uma ferramenta importante para tornar esse processo, por mais lento que seja, uma realidade. Dos 24 países da região que assinaram, apenas três países caribenhos ainda não o ratificaram: a República Dominicana, o Haiti e a Jamaica. Esses países precisam reconhecer que é do interesse deles, e de suas populações, fazê-lo. Como diz a ativista indiana Aruna Roy: “O direito de saber é o direito de viver”.

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