Em meio a crise econômica e protestos, nigerianos celebram 64 anos de independência com insatisfação

Alguns manifestantes nos protestos #EndSars. Imagem por Asokeretope da  Wikimedia Commons (CC BY 4.0 DEED).

A Nigéria celebrou o seu 64º aniversário de independência na terça-feira, 1º de outubro. Milhares de cidadãos protestaram na capital do país, Abuja, assim como em outras grandes cidades, como Lagos e Port Harcourt. O protesto, nomeado “FearlessInOctober” [Sem medo em outubro] e organizado nas redes sociais, acabou sendo dispersado pela polícia, que disparou gás lacrimogêneo nos manifestantes.

Protesto em 1º de outubro. Nigerianos protestam contra o governo ruim no Dia da Independência em Ikeja Underbridge.

Como de costume, 1º de outubro foi celebrado como um feriado, como parte da comemoração anual da independência nigeriana do domínio britânico, em 1º de outubro de 1960. Anteriormente celebrada na Eagle Square, na capital, Abuja, a cerimônia tradicional de Dia da Independência foi transferida para a Aso Villa, a residência oficial do governo, em outubro de 2023. O Secretário de Governo da Federação, George Akume, anunciou que o aniversário seria celebrado de forma discreta devido à tumultuada situação econômica.

Vários nigerianos manifestaram suas frustrações no X (antigo Twitter):

O candidato presidencial do Partido Trabalhista nas eleições gerais de 2023, Peter Obi, encorajou os líderes e os cidadãos a refletir profundamente acerca do atual estado da nação.

Numa declaração feita em sua conta do X, ele afirmou: “Para mim, hoje deveria ser também um dia de sóbria reflexão para todos os nigerianos, especialmente para nós, os líderes, cujas ações e inações têm contribuído à estagnação e aos gritantes fracassos que estamos testemunhando”. Ele ainda enfatizou a necessidade de uma “Nigéria Nova e Produtiva” a qual priorize o bem-estar de seus cidadãos.

Crise econômica e desafios

A Nigéria, o país mais populoso da África, está enfrentando sua pior crise econômica em décadas, a qual gerou um aumento significante nos preços de alimentos básicos em todo o país.

O presidente Bola Ahmed Tinubu vem recebendo críticas por suas políticas associadas a remoção de subsídios à gasolina e unificação das taxas de câmbio, o que muitos nigerianos acreditam ter alimentado a inflação sem precedentes e a elevação dos custos de subsistência e de energia. Os custos de energia mais que triplicaram desde que o presidente Tinubu assumiu o cargo, em 29 de maio de 2023. O preço do litro da gasolina disparou de cerca de 200 NGN (US$ 0,12) para mais de 1.000 NGN (US$ 0,60), enquanto as tarifas de energia elétrica quadruplicaram, o que gerou um impacto enorme no setor de manufatura e nas finanças das famílias nigerianas.

Segundo pesquisa realizada pelo Banco Central da Nigéria (CBN) entre 22 e 26 de julho de 2024, a inflação promete forçar as famílias nigerianas a gastar uma fração maior da sua renda em alimentos. A Household Expectation Survey [Pesquisa de Expectativa Doméstica], elaborada a partir de uma amostra de 1.665 domicílios nos 36 estados e no Território da Capital Federal, da lista mestra de amostras do National Bureau of Statistics (NBS), teve um índice de resposta de 99,7%. De acordo com o NBS, a taxa de inflação atualmente está em 32,15%, e a inflação dos alimentos está subindo para 39,5%.

Numa transmissão televisionada de Dia da Independência, o presidente Tinubu afirmou que a Nigéria deve escolher: ou a reforma em prol do progresso e da prosperidade, ou continuar com a atitude de sempre e arriscar o colapso. Ele enfatizou que seu governo, iniciado há 16 meses, tem o compromisso de reformar a economia política e a arquitetura defensiva do país.

“Assim como celebramos o progresso que fizemos como povo ao longo desses 64 anos, também devemos reconhecer algumas das oportunidades que perdemos, e os erros do passado. Se queremos nos tornar uma das maiores nações da Terra, tal como Deus nos predestinou a ser, não devemos permitir que nossos erros nos acompanhem ao futuro”, disse.

Ele lamentou a situação precária da Nigéria devido a erros cometidos no passado, e incentivou os cidadãos a não permitir que esses erros moldem o futuro. O presidente acrescentou que seu governo eliminou mais de 300 integrantes do Boko Haram e “chefes de quadrilha” no nordeste e noroeste, entre outras regiões.

Observou ainda que as reformas econômicas em curso atraíram mais de US$ 30 bilhões em investimento direto estrangeiro no último ano.

Esperança no futuro

Em sua transmissão de Dia da Independência, o presidente Tinubu anunciou a convocação de uma “Conferência Nacional da Juventude”. Segundo ele, a conferência convergiria ao longo de 30 dias como uma plataforma para o enfrentamento dos diversos desafios encarados pelos jovens nigerianos, que compõem mais de 60% da população da Nigéria.

Essa decisão pode ter sido influenciada pela crescente inquietação dos jovens pelo país, o que resultou em protestos públicos constantes desde o protesto #EndSARS em 2020, e no protesto #EndBadGovernance em agosto de 2024.

Em comemoração ao 64º Dia da Independência da Nigéria em 1º de outubro, o Apple Music revelou as dez canções e álbuns de artistas nigerianos mais tocadas de todos os tempos. Essa iniciativa celebra o sucesso de artistas nigerianos na plataforma de streaming digital, expondo em destaque os artistas e álbuns nigerianos mais tocados. Made in Lagos“, de Wizkid, ocupa o topo da lista, com Burna Boy logo abaixo, com quatro álbuns na lista.

Na última década, a indústria musical da Nigéria cresceu a ponto de se tornar um dos setores mais vibrantes do país, contribuindo com mais de US$ 2 bilhões anuais em receita à economia nacional. Em suas projeções, espera-se que a indústria musical atinja um valor significativo de US$ 12,9 bilhões até 2027, de acordo com um relatório da PriceWaterhouseCoopers.

Da mesma forma, Nollywood, a segunda maior indústria cinematográfica do mundo, gera mais de US$ 660 milhões por ano e cria milhões de empregos, particularmente para nigerianos mais jovens.

Apesar das circunstâncias econômicas desafiadoras do país, as indústrias criativas da Nigéria se mantêm como um farol de esperança para a nação mais populosa da África.

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