Samuel Ubong “Aritokonson” Okon é um professor e artista autodidata nigeriano cujas pinturas surrealistas incluem representações de órgãos humanos, esqueletos, sangue, plantas, animais e processos vitais.
Seu trabalho e ilustrações também podem ser vistos em livros infantis e suas pinturas foram recentemente expostas em uma mostra individual intitulada “Metanoia“, que ocorreu entre 30 de agosto de 2024 e 2 de setembro de 2024 na Galeria Photocarrefour em Abuja, capital nigeriana.
Ubong, de 32 anos, formado em Ciências Biológicas, reconhece a influência da área em sua arte, “Minha arte captura o paradoxo da curta duração da vida e os ritmos infinitos da natureza”. É uma história que ele conta desde a primeira até a última pintura da série Metanoia sobre “o vasto contínuo e o ciclo da vida”.
Em uma entrevista por telefone com a Global Voices, Ubong compartilhou sua abordagem à arte.
Pamela Ephraim (PE): Conte-nos sobre sua exposição recente, “Metanoia”, e sua inspiração por trás dela.
Samuel Ubong (SU): Metanoia é uma representação dos processos da vida, uma jornada pela infância até a idade adulta começando pela concepção; o conceito do nascimento, da fusão/colaboração entre um pai e uma mãe, como eles devem se unir para dar a luz à uma criança. O que eles contribuem forma a ideia e percepção de mundo da criança. Metanoia é uma palavra grega que significa mudanças, e as obras exploram a metamorfose da vida desde a concepção até a morte.
Uma de minhas obras, intitulada “A essência da união”, tece intrinsicamente os conceitos de biologia, amor, criação e a profunda influência que os pais têm ao moldar a percepção que uma criança tem sobre o mundo. Este trabalho é centrado no coração humano, meticulosamente detalhado para mostrar os ventrículos e aurículos, dentro dos quais duas faces, uma masculina e uma feminina, estão entrelaçadas. Seus cérebros se sobrepõem, simbolizando uma conexão intelectual e emocional profunda que define sua parceria. O olho representa o poder compartilhado do conhecimento que casais compartilham sobre seu mundo, sobre si mesmos e o processo de saber o que será de sua criança desde a concepção até os anos formativos, o desenvolvimento de seu temperamento.
Fluindo de suas formas entrelaçadas, suas medulas espinhais, representadas como filamentos de DNA convergem na cabeça e no cordão umbilical do feto em desenvolvimento, aconchegado dentro de seu próprio mundo dentro do coração.
Essa conexão representa visualmente o papel crucial dos pais na formação da realidade de suas crianças desde o começo da vida. O feto, rodeado pelo calor e a proteção do coração, simboliza um mundo sendo construído pelos pensamentos, emoções e experiências dos pais. Isso refuta a teoria de que a criança nasce com uma “tabula rasa” sendo que os pais já passaram informações intuitivas, as quais são inatas e únicas pela fusão de seus códigos genéticos.
PE: Poderia nos contar mais sobre sua formação educacional em biologia e como começou a uni-la com a arte?
SU: Eu sempre tive uma paixão pelas artes. Eu me lembro de rabiscar bastante quando criança, mas minha mãe não gostava daquilo. Ela queria que eu fosse médico; eu não a culpo porque era a opção percebida como a mais economicamente inteligente. Ela não conhecia o valor da arte, então ela desaprovou minha vontade de fazer arte. Eu acabei tirando me formando em Biologia pela Universidade Ahmadu Bello e fiz pós-graduação em educação.
Trabalhei como professor por anos, e atualmente estou associado ao Teach for Nigeria, onde ensino alunos do Primary 3 (equivalente à 3ª série do ensino fundamental). Sou autor de dois livros infantis. O primeiro é um livro ilustrado intitulado Hayatou and the Honey Bees; o segundo é Nipsey the Ginger Cat.
PE: Qual é a sua abordagem ao incorporar biologia em sua arte? Qual a mensagem que você procura compartilhar com essa combinação?
SU: Meu trabalho procura mostrar a relação entre biologia e arte e como ela nos afeta. Arte é vida, e biologia é o estudo da vida. A vida em si é uma função da biologia. A arte nos diz que não podemos viver sem a biologia e a biologia nos diz para apreciar a arte. Meu trabalho explora a integração da biologia em expressões artísticas. Embora a maioria das pessoas as categorizem em duas disciplinas muito distintas, sua combinação pode criar novas oportunidades para melhorar sua disseminação.
PE: Qual foi o impacto ou a recepção de sua arte?
SU: A recepção da minha arte tem sido em geral positiva porque ela vem de uma ponto de vista original onde a maioria das ideias está relacionada à eventos, ideias e estados emocionais. Na exposição, a conectividade da história com a biologia, emoções e psicologia inspira uma forma de introspecção, um pensamento mais profundo e reflexão. Em situações cotidianas, minha arte já inspirou risos, nostalgia e pequenas controvérsias entre meus pares e estranhos que cruzam com meu trabalho. Eles me fazem perguntas como, “como é que você pensou nisso?”
PE: Como você alcança essa obras singulares? Nos leve pelo seu processo criativo.
SU: Meu processo criativo acontece ao acaso. É acidental. Eu busco inspiração em conversas e pensamentos aleatórios, e então tento realizar certos tipos de rituais: quando eu volto do trabalho tomo banho, acendo meu incenso, coloco uma musica calma e pego meus pincéis para pintar. Tento trabalhar silenciosamente.
PE: Tem alguma obra em particular da serie Metanoia que você tenha um carinho em particular?
SU: Tenho carinho por todas as minhas obras, mas a que mais ressoa comigo é na verdade “Felicidade apesar” e “A essência da união” porque na história de Metanoia, elas representam o começo e o fim, o que é uma ironia, “Felicidade apesar” é uma promessa de um início, enquanto “A essência da união” é o início de uma união.