Elon Musk, o super-herói da direita latinoamericana

Esse artigo foi escrito por Leonardo Oliva e publicado no CONNECTAS em maio de 2024. Uma versão editada é republicada na Global Voices sob um acordo compatilhamento de mídia.

Venezuela has a great wealth of natural resources. If Chavez had not destroyed their economy by increasing the role of government to extreme socialism, the country would be very prosperous.

A Venezuela é um país com muitas riquezas e recursos naturais. Se o Chavez não tivesse destruído a economia aumentando o papel do governo em um socialismo extremo, o país poderia ser muito próspero.

Essa citação é de 4 de abril e foi postada por Elon Musk, o bilionário dono da Tesla e da Space X, no X (antigo Twitter). E não é, nem de longe, a única opinião dele sobre um país da América Latina: “A prosperidade está por vir para a Argentina”, tuitou quando Javier Milei ganhou a eleição em novembro passado; e “Ele tem razão”, ao celebrar o salvadorenho Nayib Bukele na mesma rede social em fevereiro.

Musk usa a plataforma, da qual é dono, para fincar a bandeira das suas opiniões sobre toda sorte de assuntos, sempre de forma controversa. Da pandemia da COVID-19, à guerra na Ucrânia e à Copa do Mundo no Catar, até o consumo de drogas, praticamente qualquer assunto já foi abordado pela língua afiada do segundo homem mais rico do mundo (cuja fortuna é de 195 bilhões de dólares, segundo a Forbes).

Estranhamente, muitas das suas últimas postagens no X fazem referência à América Latina, onde ele mostrou afinidade com os líderes políticos da direita como Milei, Bukelele e o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro. Já, em contraste, os alvos dos seus posts estão sempre no espectro da esquerda, como o Chavismo ou o presidente Lula Da Silva.

Boa explicação sobre o que faz os países serem mais ou menos prósperos.

Musk, como os perfis jornalísticos feitos sobre ele retratam, é um homem pragmático, um empreendedor com instinto para negócios, sem levar em conta ideologias. Ele não hesitou, por exemplo, em viajar no último fim de semana para a China e fazer negócios com o governo comunista.

Entretanto, ele tem se tornando um ativo porta-voz do discurso mais reacionário. “Ao longo de 2022, ele foi de elogios benignos e moderação até expressar preocupações furiosas sobre como a *woke mind (mente desperta) e a censura autoimposta pelas elites da mídia são uma ameaça existencial para a humanidade”, é o que se lê na celebrada biografia de Musk escrita por Walter Isaacson e publicada em setembro de 2023.

Nessa guinada em direção aos extremos, Musk utilizou-se da América Latina para fazer eco dos seus negócios e de seus ataques. A exaltação ao libertário Milei foi além dos tuítes: em 12 de abril, ele recebeu o Presidente argentino no escritório da Tesla no Texas. Eles conversaram, tiraram fotos e declararam “amor” mútuo, enquanto Milei se encontrava no meio de uma polêmica pela aplicação de uma mudança drástica na economia argentina, que a oposição considera destrutiva.

Ao mesmo tempo, o fundador das empresas Neuralink (chips entre computador e cérebro) e Starlink (acesso de satélite à internet) se envolveu em uma briga com um juiz brasileiro, que ordenou que ele bloqueasse uma série de contas no X por, supostamente, estarem espalhando desinformação sobre o governo Lula. As acusações do empresário contra o magistrado, Alexandre de Morais, (alegando “censura”) foram aplaudidas por Bolsonaro, que declarou que o objetivo de Musk é “libertar o mundo inteiro”.

Vi muitos tuítes preocupantes sobre a recente eleição no Brasil. Se esses tuítes forem corretos é possível que os funcionários do Twitter tenham dado preferência aos candidatos de esquerda.

Para Marco Bastos, analista político brasileiro, o bolsonarismo apoia as reivindicações  do empresário por “conveniência”. Além disso, a defesa da liberdade de expressão por Bolsonaro é inconsistente sendo o ex- presidente um firme defensor da ditadura militar e, por tanto, não um bom exemplo de quem respeita essa liberdade no Brasil.

Leia mais em: No X, Elon Musk impulsiona a campanha contra a Suprema Corte brasileira

O Brasil e a Argentina são duas nações que vivem uma crescente polarização política na América Latina. E, nesse confronto, Musk decidiu se posicionar o mais à direita possível. Estranhamente, ele falhou em fazer o mesmo nos Estados Unidos, o país que adotou (Musk nasceu na África do Sul). Lá, os extremos são representados pelos candidatos presidenciais Joe Biden e Donald Trump. Mesmo tendo questionado o democrata, ele nunca se posicionou explicitamente à favor do republicano; e chegou até a questionar outro ultraconservador anti cultura woke: Ron DeSantis, o governador da Flórida.

Cada vez mais politicamente ativo (alguns dizem que ele está perseguindo uma carreira nesse campo), Musk não hesitou em posicionar-se na política europeia. Em dezembro, participou, na Itália, de uma convenção na qual dividiu palco com a primeira-ministra Giorgia Meloni, um exemplo da direita europeia, e com o presidente do partido espanhol ultraconservador Vox, Santiago Abascal. Para eles, Musk disse:  “Por favor, não importe o vírus mental woke dos Estados Unidos!”

Nesses tempos em que “a extrema direita está na moda (de novo)” como declara o cientista político e historiador, Steve Forti, o dono da Tesla abraçou essa tendência como um convertido, considerando que ele apoiou o democrata Barack Obama, apenas uma década atrás.

A guinada de Musk para a direita “desconcertou seus amigos progressistas, incluíndo sua primeira esposa, Justine e, sua então namorada, Grimes”, afirmou Isaacson em sua biografia. Mas longe de isolá-lo, trouxe a ele novos amigos. Vários deles estão na América Latina, onde é idolatrado como se fosse um messias, apesar de ser um homem de negócios, muito bem-sucedido, mas um homem de negócios, afinal.

No México seu admirador mais fiel é Samuel Garcia, o governador direitista de Nuevo Leon. Esse indivíduo, que compartilha de traços excêntricos com Milei, Bukele e Trump, gaba-se de ter persuadido Musk a instalar uma fábrica da Tesla em Monterrey, um anúncio que ainda está para ser concretizado. Garcia faz campanha em um Cybertruck, o veículo luxuoso da Tesla que custa cerca de 1oo mil dólares.

“Ano passado, Elon Musk disse que ia investir em uma Gigafábrica em Monterrey, próximo a fronteira com o Texas”, explica o economista Ernesto del Castillo. A proximidade com o Texas não é uma coincidência dado que Musk tem vários interesses empresariais na região, em particular a sede corporativa da Tesla em Austin, e também tem operações perto da fronteira com o México com a empresa Space X”, contou o professor de Tecnologia de Monterrey ao CONNECTAS.

Apesar de ter colocado os olhos no estado de Nuevo Leon até agora os investimentos de Musk no México se resumem à Starlink, a empresa de internet de alta velocidade que usa satélites de sua outra empresa, a Space X). É o mesmo serviço que Milei anunciou recentemente na Argentina, como resultado de sua nova amizade com o sul-africano. Além disso, um município na província de Córdoba, na Argentina, está usando a Starlink como provedora de internet.

A um futuro eletrizante e inspirador!

Mas seriam esses negócios o suficiente para Elon Musk dedicar parte do seu tempo à política latino-americana? Para Mark P. Jones, cientista político na Universidade Rice, no Texas, o empresário criou um vínculo com a região que é ainda mais motivado pela ideologia do que a economia. O mesmo motivou Musk a comprar o Twitter, que deu a ele influência política e não dinheiro.

The reason for his connection with Milei, Bolsonaro, and Bukele is because they are in sync, and clearly because they are criticized by the left. But in the end, it is convenient for Musk to have friends in Latin America because it helps him in case of conflict, for instance, with Lula in Brazil. That serves him to show he is not in conflict with the region, but with the left in Latin America.

A razão para a conexão dele com Milei, Bolsonaro e Bukele é que eles estão em sintonia e são criticados pela esquerda. Mas, no fim, é conveniente para Musk ter amigos na América Latina porque isso o ajuda em qualquer conflito, por exemplo, com o Lula, no Brasil. Isso serve para mostrar que ele não está em conflito com a região e sim com a esquerda na América Latina.

Com investimentos em setores estratégicos, como veículos elétricos, telecomunicações e inteligência artificial, Musk se tornou um dos homens mais poderosos e influentes no mundo. Ainda mais do que os governantes como Milei, que, antes de correr atrás de uma reunião bilateral com o Presidente dos Estados Unidos na Casa Branca, preferiu encontrar com o bilionário na sede da Tesla em Austin. Coisa que ele comentou oficialmente no X.

“Uau”, Musk comentou quando o presidente anunciou o superávit fiscal do seu programa econômico em 23 de abril na Argentina, país que é o quarto maior produtor de lítio no mundo, o mineral essencial para as baterias dos carros elétricos fabricados justamente pela Tesla.

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