O fracasso de dois impérios na educação dos ciganos

Festival cigano em Tyumen. Foto por RG72, Wikimedia Commons. Usada sob licença CC BY-SA 4.0.

A grande maioria dos ciganos do Império Russo no final do século 19 era analfabeta. Apenas de 2% a 4% da comunidade sabia ler e escrever em russo. Os músicos ciganos representavam um grupo especial que vivia nas grandes cidades, mas mesmo eles permaneciam semianalfabetos. A política referente ao idioma romani naquela época fazia parte da política geral em relação aos povos pequenos e seus idiomas no Império Russo e, posteriormente, no Império Soviético. A falta de um território próprio foi a razão pela qual o status da população cigana e as possibilidades de atender às suas necessidades educacionais sempre foram significantemente inferiores às de outros povos, mesmo aqueles em número muito menor.

Crianças ciganas dançam nas ruas de Moscou, em 1925. Fotógrafo desconhecido. Imagem da Wikimedia Commons. Domínio público.

No entanto, nas décadas de 1920 e 1930, durante cerca de 15 anos, a liderança da URSS adotou uma política de desenvolvimento democrático das minorias, que se aplicava ao povo cigano. Foram criadas associações públicas ciganas e o teatro Romen (teatro de artes ciganas), que existe até hoje. Surgiram conjuntos musicais ciganos, uma seção cigana na União de Escritores Proletários e a União de Ciganos de toda a Rússia.

De 1917 até o início da década de 1930, como parte da política de “retorno às origens” (коренизация em russo, apoio aos idiomas e culturas étnicas), as autoridades soviéticas apoiaram o desenvolvimento das línguas nativas dos povos da USRR. Foram criados alfabetos com base na escrita latina ou cirílica e padrões literários para tais, e o Estado desenvolveu a cultura e a educação em massa nesses idiomas.

Foi implementado o primeiro programa de educação especial para ciganos, como parte do programa escolar nacional. Foram abertas várias turmas e escolas, nas quais as matérias do ensino fundamental eram ensinadas na língua romani, e foi fundada uma faculdade de treinamento para professores ciganos. Como a política da época era eliminar o analfabetismo, foi criada uma língua escrita para o romani, com base no idioma de uma das diásporas, os ciganos russos. Entre 1928 e 1938, foram publicados aproximadamente 300 trabalhos em russo romani, incluindo livros didáticos, obras originais de autores ciganos (cerca de 30) e traduções de clássicos russos.

De acordo com o projeto educativo Arzamas, os discursos de Stalin também foram publicados na recém-criada escrita romani. Nas décadas de 1920 e 1930, foram criados materiais pedagógicos no idioma, incluindo a “Cartilha para escolas romani”, um guia para a gramática e ortografia, e livros didáticos até a 4a série. Um total de 13 livros didáticos foram publicados até 1938, bem como livros para leitura literária e antologias de literatura cigana.

Mas, em 1938, devido à uma mudança drástica na política nacional interna, esse processo foi interrompido. As escolas e turmas de língua romani foram dissolvidas e fundidas com as escolas de língua russa. A maioria dos alunos ciganos foi expulsa e a escrita romani foi abolida. Todos os programas culturais e educativos foram encerrados. As estruturas de ensino para os ciganos foram declaradas prejudiciais, o que isolou as crianças da vida soviética. Grande parte da comunidade que continuou a levar um estilo de vida nômade não recebeu educação durante esse curto período, embora o processo tenha contribuído para o surgimento de uma fina camada de intelectuais ciganos, principalmente entre grupos urbanos de músicos.

Uma prática constante do regime bolchevique foi a deportação de grupos sociais e povos inteiros, que se intensificou do início da década de 1930 até meados da década de 1950, quando 15 nações e mais de 40 grupos étnicos foram deportados. Cerca de 3,5 milhões de pessoas foram expulsas de suas terras natais, e muitas morreram durante o processo. Mais de 800 mil exilados foram parar na Sibéria, incluindo alguns ciganos.

No dia 5 de outubro de 1956, o Presidium do Soviete Supremo da URSS emitiu o decreto “Sobre a participação no mercado de trabalho de ciganos envolvidos em vadiagem” (conhecido entre os ciganos como “Decreto de Assentamento”). Sob ameaça de prisão, eles foram obrigados a morar em casas. Para isso, receberam um empréstimo para construí-las e, nos primeiros anos, seus movimentos foram rigorosamente monitorados. Também foram obrigados a encontrar emprego. Alguns homens passaram a trabalhar em fazendas coletivas como cavalariços, guardas ou agrônomos, outros em empresas próximas. As mulheres, em sua maioria, não trabalhavam, e algumas se dedicavam à cartomancia.

A transição das famílias ciganas para o assentamento permanente foi estritamente controlada pela administração local por cerca de 10 anos. Como resultado, o nível médio de educação das crianças ciganas aumentou, embora majoritariamente no âmbito do ensino primário, com menos frequência até a 5a e 6a séries.

A situação da educação continua alarmante até hoje. Dados sociológicos mostram que cerca de 80% das crianças ciganas com mais de 11 anos não frequentam a escola. Por isso, entre as décadas de 1960 e 1980, na tentativa de atrair as crianças para as escolas, a maioria dos ciganos começou a seguir um modelo de educação comparável ao das famílias camponesas na Rússia pré-industrial e pré-revolucionária, em que as crianças eram alfabetizadas, mas, após os 12 anos, 90% delas deixavam de ir à escola.

Esse modelo continua funcionando porque corresponde à tradição cigana de se integrar à sociedade e divulgar sua cultura. Por outro lado, as escolas russas não atendem às necessidades dos alunos ciganos, especialmente em termos de idioma e modo de falar. Sem métodos de ensino especiais e professores que saibam como ajudar essas crianças a aprender a sua língua, seus problemas de aprendizagem são frequentemente tratados como problemas médicos, o que não tem absolutamente nada a ver com a realidade.

Inicie uma conversa

Colaboradores, favor realizar Entrar »

Por uma boa conversa...

  • Por favor, trate as outras pessoas com respeito. Trate como deseja ser tratado. Comentários que contenham mensagens de ódio, linguagem inadequada ou ataques pessoais não serão aprovados. Seja razoável.