
Consequências do bombardeio ao hospital infantil e maternidade em Mariupol, 9 de março de 2022. (CC BY 4.0 DEED). Fonte https://armyinform.com.ua/2022/03/26/francziya-vymagatyme-vid-rf-znyaty-oblogu-mariupolya/
Autor armyinform.com.ua
Quase dois anos e milhares de sanções depois, a capacidade de guerra de Moscou permanece intacta e a Rússia continua a bombardear a Ucrânia do mesmo modo, se não mais, como naquela manhã fatídica de 24 de fevereiro de 2022, data em que começou a invasão em grande escala. O Kremlin continua as suas operações militares e está lançando centenas de drones e mísseis contra a população e cidades ucranianas. A economia da Rússia recuperou-se para os níveis anteriores à guerra e continua a crescer, devido a aumentos maciços nas despesas militares. A maioria dos russos convencionais, especialmente aqueles que vivem em áreas financeiramente importantes como Moscou e São Petersburgo, ainda encaram a guerra como uma espécie de reality show, torcendo pelos agressores que atacam as casas ucranianas.
Porém, a Rússia não alcançou os seus objetivos militares, devido principalmente ao esforço heroico de muitos ucranianos que estão arriscando tanto e sacrificando as suas vidas pelo seu país. Eles impediram que a Rússia expandisse a guerra para outras partes da Ucrânia e para os países europeus vizinhos. O Ocidente ajudou fornecendo armas, apoio financeiro e humanitário para a Ucrânia se defender. A ajuda dos países democráticos tem sido crucial para reforçar a resistência da Ucrânia e permitiu que o país retomasse alguns dos territórios perdidos e libertasse as pessoas da ocupação russa.
No entanto, muito mais pode e deve ser feito para ajudar a Ucrânia, dadas as dificuldades da contraofensiva, o fornecimento insuficiente de armas e os ataques crescentes do lado russo, especialmente à medida que armas e dinheiro continuam a fluir para o Kremlin.
Como é possível que, após a imposição de abrangentes sanções ocidentais, um apelo internacional ao boicote à Rússia e o isolamento do Kremlin na cena global, a Rússia ainda seja capaz de continuar a travar a guerra como antes?
O Ocidente tentou prejudicar a capacidade bélica da Rússia, impondo sanções que proíbem a venda de armas à Rússia, limitam os seus lucros provenientes das exportações de energia e interrompem os fluxos financeiros. Mais de 26.000 sanções no total. No começo, as coisas pareciam funcionar: o rublo entrou em colapso, as empresas estrangeiras começaram a sair e os analistas previram uma queda acentuada no PIB do país. No entanto, a Rússia recuperou-se, e bastante rápido, encontrando alternativas às proibições ocidentais e confiando em aliados autocráticos e aproveitadores para continuar a enviar armas e equipamento para as linhas de frente.
Embora o Ocidente tenha aplicado um número sem precedentes de sanções, não fez o suficiente para fazer cumprir estas medidas, deixando muitas lacunas e caminhos para a evasão das sanções. As sanções energéticas, visando as exportações mais lucrativas da Rússia, só entraram em vigor no décimo mês da invasão e não contemplaram todo o comércio. A UE, o principal consumidor de gás da Rússia, comprou quatro vezes menos gás de gasodutos russos, porém aumentou em 40% a compra de gás natural liquefeito (GNL) russo, ou seja, embora os lucros energéticos tenham diminuído, permanecem elevados devido a essa substituição.
O Ocidente não agiu suficientemente rápido para impedir a Rússia de encontrar mercados alternativos para as exportações de energia. Quando os estados ocidentais aplicaram um limite de preço de US$ 60 por barril ao petróleo russo, esperavam que essa medida fosse facilmente aplicada, uma vez que a Rússia transporta o seu petróleo majoritariamente em navios de propriedade ocidental. Entretanto, a Rússia está adquirindo petroleiros para criar a sua própria frota independente, muitas vezes provenientes de países ocidentais como a Grécia. No ano passado, os russos compraram mais de 100 petroleiros de diferentes vendedores. Frequentemente, são navios antigos sem seguro que apresentam elevados riscos ambientais. Essa frota torna a venda do petróleo ao preço de mercado mais elevado. E mesmo quando os russos utilizam barcos ocidentais, que exigem que o preço máximo seja aplicado, o preço continua demasiado elevado.
Muitos setores lucrativos, como o ouro ou os diamantes, não foram sancionados, principalmente devido a lobbies empresariais e empresas poderosas nos países sancionadores que não querem perder os lucros que obtêm com o comércio com a Rússia. Eles têm pressionado seus governos a adiar as restrições.
As sanções não foram capazes de impedir o comércio ilícito de armas e artigos militares, como chips, tecnologia e drones, que entram na Rússia através de países terceiros ou de empresas que violam ilegalmente as sanções. Durante mais de um ano, a Rússia tem conseguido comprar produtos sancionados de empresas ocidentais, às vezes negociando abertamente com a Rússia, devido à falta de mecanismos de aplicação adequados. A Rússia também continua a obter armas, drones e tecnologia militar da China, do Irã e da Coreia do Norte.
É claro que as sanções tiveram alguns efeitos. As receitas energéticas diminuíram e a Rússia tem de ser mais criativa na procura das armas de que necessita. Isso complica a vida do Kremlin, mas não restringiu a sua capacidade de travar a guerra como antes. A Ucrânia está ficando sem recursos, enquanto a Rússia pode comprar e produzir tudo o que precisa com as receitas que continua gerando.
Tudo isso leva-nos à necessidade de fazer mais para ajudar a Ucrânia, bloqueando as vias de evasão das sanções. São necessários maiores esforços para melhorar as medidas de aplicação. As empresas nos Estados sancionadores que conduzem comércio proibido com a Rússia devem estar sujeitas a sanções e proibidas de fazer negócios nos EUA e na Europa. As empresas fora da coligação sancionadora que facilitam o comércio sancionado também deveriam ser proibidas de acessar os mercados ocidentais. Os países que nunca aplicaram sanções à Rússia e permitiram o comércio relacionado com a guerra e com o Kremlin deveriam ser pressionados e persuadidos a deixar de lucrar com essa prática. As sanções financeiras deveriam ir além do congelamento dos principais bancos russos, passando a utilizar ativos russos congelados para ajudar a Ucrânia.
Os governos ocidentais têm sido fortes na ajuda à defesa da Ucrânia, mas têm sido fracos na implementação de sanções contra a agressão contínua da Rússia. As democracias desenvolvidas devem agir em conjunto para endurecer as sanções à Rússia.