Celebrando a lenda: Marta vira nome de prêmio de gol mais bonito do futebol feminino

Marta veste a camisa da seleção brasileira durante uma partida em 2023 | Imagem: Marcelo Camargo / Agência Brasil

Marta Vieira da Silva é uma das melhores jogadoras de futebol do mundo. Ela detém o recorde de gols marcados em Copas do Mundo, atuando em seis delas com a camisa da Seleção Brasileira de Futebol e tem uma carreira de mais de 20 anos em campo. Agora o nome dela também é o prêmio anual concedido ao gol mais bonito marcado no futebol feminino.

A atleta brasileira de 37 anos se tornou a primeira pessoa ainda em vida a nomear um prêmio da FIFA com a criação de uma nova categoria que estreará em 2025.

Lenda.👑🇧🇷

#AMELHOR

Além de receber um prêmio em sua homenagem, Marta também recebeu o Prêmio Especial durante a cerimônia anual da FIFA, concedido a jogadores de futebol com destaque na carreira. No Brasil, sua carreira mudou para sempre o status nacional do futebol feminino.

Durante um sincero discurso de agradecimento em português, Marta disse:

Eu quero que, assim como estou enxergando essa homenagem, quero que todas as mulheres possam enxergar um futuro promissor, onde não seja direcionado somente ao futebol, ao esporte, mas a qualquer atividade. O que a gente busca diariamente é fazer com que o mundo seja melhor para todos, sem distinção, buscar igualdade, respeito. E deixo essa mensagem para todos que têm o poder de transmitir essa mensagem, que façam, porque as próximas gerações vão agradecer, assim como agradecemos a um Ronaldo, um Zagallo, um Pelé.

Desde 2019, existe uma regra obrigatória para que todos os clubes de futebol que atuam na Série A do Brasileirão tenham um time feminino.  No ano passado, foi anunciado que até 2027 a regra será ampliada para as quatro divisões do Campeonato Brasileiro.

Entre os clubes das três principais divisões do futebol brasileiro de hoje, há apenas uma mulher presidente, Leila Pereira, do Palmeiras. Em 17 de janeiro, Pereira convocou uma coletiva de imprensa exclusiva para mulheres jornalistas. Ela respondeu aqueles que reclamaram da iniciativa, dizendo para “não serem histéricos”. Durante a entrevista, ela disse:

Não pode ser normal. Ter só uma mulher à frente de um grande clube na América do Sul. Isso não é normal. Por que acontece? Porque sofremos diversas restrições que nos impedem de chegar aonde podemos chegar.

A trajetória da Marta

Marta nasceu e cresceu em uma cidade chamada Dois Riachos, no nordeste do estado de Alagoas, com uma população de 11 mil habitantes à época. Lá, ela aprendeu a jogar em campos de terra, sendo a única menina entre os meninos, dizendo que preferia uma bola a uma boneca.

O pai abandonou a família quando ela era bebê e a mãe saía às 5 da manhã para trabalhar na plantação, só regressando à noite, como a própria Marta recordou em um artigo publicado no site The Players’ Tribune intitulado “Carta ao meu eu mais novo”:

Whenever it rained, she would catch the water to help grow food for the family to eat back home. When she wasn’t on the farm, she’d head over to city hall, where she’d clean and serve coffee. So you never saw her that much. She never really got the chance to come to your games or watch you play.

Sempre que chovia, ela pegava a água para ajudar a cultivar alimentos para a família comer em casa. Quando não estava na roça, ia à prefeitura, onde limpava e servia café. Você nunca a via muito. Ela nunca teve a oportunidade de ir aos jogos ou de te ver jogar.

O futebol feminino foi legalizado no Brasil apenas três anos antes do nascimento de Marta, em 1983. O esporte permaneceu proibido às mulheres no país que se considerou “o país do futebol” por mais de 40 anos. A ditadura em vigor em 1941 determinou que as mulheres não eram autorizadas a praticar desporto em “condições incompatíveis com a sua natureza”, argumentando que isso poderia afetar a capacidade de se tornarem mães e donas de casa.

Aos 14 anos, Marta pegou um ônibus e saiu de sua cidade natal em direção ao Rio de Janeiro, embarcando em um caminho que a levou a fazer seletivas com chuteiras de segunda mão: “grandes e recheadas de jornal na ponta para caber”, até se tornar uma atleta profissional, jogando em estádios internacionais, com torcedores vestindo camisetas com seu nome acima do número 10.  Algumas das estrelas do futebol masculino que vestiram a camisa 10 em nível de clube ou nacional são Pelé, Ronaldinho, Diego Maradona, Mesut Özil e Lionel Messi.

Marta jogou em times do Rio e de Belo Horizonte e recebeu uma ligação que a levou para a Suécia, e atualmente joga no Orlando Pride, nos Estados Unidos.

Em 2006, ganhou pela primeira vez o prêmio de Melhor Jogadora do Ano da FIFA, e depois repetiu o feito mais cinco vezes (2007, 2008, 2009, 2010 e 2018). Também defendeu a seleção brasileira em seis Copas do Mundo — a última em 2023 — e marcou o recorde de 17 gols, conforme relata o site da federação: ​

…more than any other player – regardless of gender – in the history of the World Cup. She is also one of only three players to have scored at five World Cups, along with Christine Sinclair and Cristiano Ronaldo.

…mais do que qualquer outro jogador, independentemente do sexo, na história da Copa do Mundo. Ela também é uma das três únicas jogadoras que marcaram em cinco Copas do Mundo, junto com Christine Sinclair e Cristiano Ronaldo.

Em 2008, Pelé, a lenda brasileira, que alguns consideram o maior jogador de todos os tempos, apelidado de “Rei”, chamou Marta de “Pelé de saia”. Em entrevista, ele comemorou a estrela em ascensão que ela estava se tornando no Brasil na época:

Soube que mais de 60 mil torcedores foram prestigiar a seleção brasileira. Quem podia imaginar isso?

Fora do campo, Marta também se tornou uma defensora da igualdade de direitos. Na Copa do Mundo de 2019, ela posou com uma chuteira que não trazia nenhuma marca de patrocínio. Desde então, usa chuteiras cobrindo marcas patrocinadoras, mostrando apenas um sinal rosa e azul de igualdade de gênero.

Marta recusou todas as propostas de marcas desportivas para patrociná-la por considerar o valor oferecido injusto em comparação com os seus colegas do sexo masculino.

Além disso, em 2019, entrou em campo usando batom roxo escuro, uma marca de beleza e cosméticos acabava de assinar contrato de patrocínio com ela.  E assim, os batons que ela usa nas partidas também viraram moda.

Enquanto crescia, como ela lembrou em outro artigo no Players’ Tribune, não tinha nenhuma jogadora para admirar, então se inspirou em Rivaldo, que também era canhoto.

Para as gerações que vieram depois dela, no entanto, isso mudou:

It makes me so proud that maybe there are kids out there watching me, and that it may inspire them to reach for the stars. That would mean the world to me. It would be more valuable to me than any titles or medals or trophies that I have won. Being someone little girls could look up to, someone who showed them their dreams could come true? Having an impact like that, having that as a legacy? That, to me, is all I could dream of.

(…)

We have come so far. And I am beyond excited to see where things go next.

Fico muito orgulhosa de que talvez haja crianças por aí me observando e que isso possa inspirá-las a alcançar as estrelas.  Isso significaria muito para mim. Seria mais valioso para mim do que quaisquer títulos, medalhas ou troféus que ganhei. Ser alguém que as meninas poderiam admirar, alguém que lhes mostrasse que seus sonhos poderiam se tornar realidade?  Ter um impacto assim, ter isso como legado? Isso, para mim, é tudo que eu poderia sonhar.

(…)

Chegamos tão longe. E estou muito animada para ver o que acontecerá a seguir.

Inicie uma conversa

Colaboradores, favor realizar Entrar »

Por uma boa conversa...

  • Por favor, trate as outras pessoas com respeito. Trate como deseja ser tratado. Comentários que contenham mensagens de ódio, linguagem inadequada ou ataques pessoais não serão aprovados. Seja razoável.