COICA: nova líder acredita que as mulheres podem ser a chave para união

Foto de Fany Kuiru Castro (Jitoma Monayanho), utilizada sob permissão da COICA.

Uma das mais importantes organizações indígenas está fragmentada, comprometendo seus objetivos de proteger a Amazônia e os povos amazônicos que a habitam.  Em janeiro de 2023, Fany Kuiru Castro, uma mulher da etnia Uitoto da Colômbia cujo nome tradicional é Jitoma Monayanho (Sol do Amanhecer), foi a primeira mulher eleita para liderar a Coordenadoria de Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (COICA) em seus quase 40 anos de existência, mas sua liderança é contestada por Tuntiak Patricio Katan Jua, um homem do povo Shuar do Equador.  Fany Kuiru lamenta a profunda divisão dentro da organização e, em entrevista à Global Voices, afirma que “as mulheres pediram que eles nos deixassem governar porque podemos alcançar um consenso”.

A COICA, fundada em 1984 em Lima, inclui nove organizações indígenas amazônicas do Equador, Bolívia, Brasil, Colômbia, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela.  Representa cerca de 511 povos amazônicos que vivem em uma área de cerca de 240 milhões de hectares de floresta. Segundo a COICA: “a Amazônia tem 30% da biodiversidade e 70% do oxigênio do planeta, mas sua real importância está na inter-relação que os povos indígenas nativos têm com a floresta para garantir a vida de todos”.  Um dos objetivos da COICA é dialogar com os governos da região para proteger 80% da Amazônia até 2025 e promover a titulação de territórios em favor dos povos indígenas, que estão sendo assediados pela mineração e pelo desmatamento.

Em novembro de 2022, Tuntiak Katan se autodenominou líder durante um congresso que não foi convocado pelo conselho de administração da COICA.  A referida nomeação é considerada ilegítima por uma parte da organização e comprometeu o Conselho nomeado em 2023.  O governo equatoriano reconheceu a eleição de Katan em fevereiro, mas o anulou em 13 de março após uma ação judicial de Fany Kuiru, que é advogada da Universidade Santo Tomás de Aquino, em Bogotá.

Fany Kuiru também tem mestrado em estudos políticos e internacionais pela Universidad del Rosario, Colômbia.  Recém-formada como advogada, trabalhou por três anos litigando em nome de mulheres chefes de família, e mais tarde se concentrou na luta social e em vários processos por direitos territoriais, saúde e educação.

A Global Voices entrevistou a líder Uitoto, atual coordenadora da COICA, via WhatsApp, para conhecer sua própria perspectiva sobre os desafios que enfrenta e como planeja superar a crise.

Johanna Fernanda Sánchez Jaramillo (JFSJ): Qual tem sido o seu envolvimento no movimento indígena?

Fany Kuiru Castro (FKC): A los 14 años empecé a ocupar espacios de discusiones colectivas en el territorio y luego, a los 21 años, estuve en las luchas de recuperación de mi territorio del Resguardo indígena Predio en Putumayo (Colombia). Desde joven he estado involucrada en trabajos sociales y comunitarios para el movimiento indígena. A las mujeres siempre se nos dificulta ser madres y ser lideresas. Muchas compañeras no avanzan porque son madres y tienen un esposo, un compañero, que no les permite liderar los procesos. En mi caso no. Siempre tuve claro lo que quise en la vida y por herencia de mis abuelos, de mis ancestros, de la familia y del clan, quienes somos líderes siempre estamos para servirle a la comunidad, a la sociedad, a nuestras familias.

Fany Kuiru Castro (FKC): Aos 14 anos, me envolvi em discussões coletivas na região e, aos 21 anos, participei das lutas para recuperar meu território da Reserva Indígena Predio em Putumayo (Colômbia).  Desde jovem tenho me envolvido em trabalhos sociais e comunitários para o movimento indígena.  É sempre difícil para as mulheres serem mães e, ao mesmo tempo, líderes.  Muitas companheiras não fazem progresso porque são mães e têm um marido ou um parceiro que não lhes permite liderar.  Não no meu caso.  Eu sempre fui clara sobre o que eu queria alcançar na vida, e eu segui o legado dos meus avós, meus antepassados, minha família e o clã.  Somos todos líderes sempre servindo a comunidade, a sociedade, nossas famílias.

Foto de Fany Kuiru Castro (Jitoma Monayanho), utilizada sob permissão da COICA.

JFSJ: Como foi a sua jornada para ser eleita coordenadora da COICA?

FKC: Siempre fui solidaria con las mujeres y estuve en los espacios donde están los hombres, pero no siempre algunas compañeras son bien recibidas. Creo que he tenido demasiado carácter y la capacidad de comprender a los compañeros y, por eso, he estado en esos escenarios.

Pero estoy consciente de que para las mujeres es difícil estar en espacios organizativos, en las estructuras y que tengan participación política. Eso me ha llenado de mucho coraje para unir a las mujeres, que busquemos y encontremos la forma de que sobresalgan, que el rol que desempeñen sea importante en las comunidades porque las mujeres somos fundamentales en la vida comunitaria, la toma de decisiones y el acompañamiento a procesos importantes.

Después del análisis de la situación de las mujeres, uno de nuestros mandatos fue la participación paritaria en las estructuras organizativas de nivel local, regional e internacional. Por eso nos proyectamos para este periodo de la Coica para que una mujer estuviera al frente, pero no pensé que fuera yo.

Lamentamos que el compañero Tuntiak Patricio Katan Jua haya desconocido ese congreso del año 2023  y se haya autoproclamado en noviembre de 2022 en Paramaribo como coordinador general. Me parece gravísimo de un líder. Eso no es ser líder, es ser una persona de mala fe y desconocer un proceso colectivo porque no les conviene a sus intereses personales. Hago un llamado a todos los compañeros indígenas, a que aquí deben primar intereses colectivos y no personales.

Las mujeres hemos pedido que nos dejen gobernar porque podemos llegar a la unidad. Hoy la Coica está fragmentada, lamentablemente, y a esa Coica llegamos las mujeres. Está dividida por dos o tres personas no más, pero que lamentablemente han sido apoyados por una ONG inescrupulosa.

FKC: Sempre fui solidária com as mulheres e estive em espaços onde os homens estão presentes, onde algumas mulheres nem sempre são bem recebidas.  Acho que tive muita personalidade e capacidade de entender meus companheiros de equipe e, portanto, estive nesses espaços.

Mas estou ciente de que é difícil para as mulheres estarem em espaços e estruturas organizacionais e terem participação política.  Isso me deu muita coragem para unir as mulheres, para encontrar uma maneira de elas se destacarem, para que seu papel nas comunidades seja importante, porque as mulheres são essenciais na vida comunitária, na tomada de decisões e no apoio a mudanças significativas.

Depois de analisar a situação das mulheres, vimos que um de nossos mandatos precisava ser a participação igualitária nas estruturas organizacionais nos níveis local, regional e internacional.  É por isso que planejamos que uma mulher fosse responsável por esse mandato da COICA, mas eu não achava que seria eu.

Lamentamos que nosso colega Tuntiak Patricio Katan Jua tenha ignorado o congresso de 2023 e tenha se proclamado coordenador geral em Paramaribo, em novembro de 2022.  Penso que este é um problema muito sério para um líder.  Isso não é ser um líder, é ser uma pessoa de má-fé que ignora um processo coletivo porque não atende aos seus interesses pessoais.  Apelo a todos os colegas indígenas para que os interesses coletivos e não pessoais prevaleçam aqui.

Nós, mulheres, pedimos que eles nos deixassem governar porque podemos alcançar a unidade.  Hoje, a COICA está fragmentada, infelizmente, por não mais do que duas ou três pessoas, mas lamentavelmente elas foram apoiadas por uma ONG sem escrúpulos.

JFSJ: O que significa ser a primeira mulher coordenadora da COICA?

FKC: Es una gran responsabilidad y hay muchos desafíos. Primero porque hay muchos compañeros indígenas retrógrados que creen que la mujer es para estar en la casa cocinando, lavando y cuidando los hijos. Aunque por supuesto no estamos desmeritando el trabajo de las hermanas que se quedan en la casa cuidando los hijos, sino que ahora existimos mujeres con capacidad, no porque seamos mujeres nos tienen que reconocer en la Coica no, porque tenemos capacidad y solicitamos participación y guiar nuestra organización. No es por capricho ni por intereses personales, es el momento de que la mujer sea la que oriente los destinos de nuestra organización con toda la capacidad y visión que hay sobre cómo reorganizar, reestructurar y refundar nuestra Coica.

Creo que hemos hecho un trabajo excelente con las mujeres porque caminamos, trabajamos juntas y hoy, gracias a eso, hay cohesión del Consejo de Mujeres de Coica. Yo hago parte de este y eso me facilitó el trabajo con las mujeres, haciendo propuestas en la cumbre construimos una agenda común por los derechos de las mujeres, se creó una red de mujeres y se contemplan temas importantes para nosotras como el cambio climático, emprendimientos económicos, autonomía alimentaria. Eso es lo que venimos trabajando como amazónicas porque es primordial estar unidas y así darles la mano a nuestros compañeros porque hasta ahora la voz Coica ha sido voz masculina. Nosotras tenemos nuestra proyección y sabemos qué hacer en la Coica.

FKC: É uma grande responsabilidade e há muitos desafios. Primeiro, porque há muitos colegas indígenas retrógrados que acreditam que as mulheres só devem estar em casa cozinhando, lavando e cuidando das crianças. Embora, é claro, não subestimemos a importância das mulheres que ficam em casa cuidando dos filhos, mas agora há mulheres com capacidades.  Não é porque somos mulheres que eles têm que nos reconhecer na COICA, mas porque somos competentes e pedimos para participar e orientar nossa organização.  Não é por capricho ou por interesses pessoais, é hora de as mulheres guiarem o futuro de nossa organização com toda a capacidade e visão sobre como reorganizar, reestruturar e restabelecer nossa COICA.

Acho que fizemos um excelente trabalho porque nós, mulheres, trabalhamos em conjunto e hoje, graças a isso, há coesão no Conselho de Mulheres da COICA. Fazer parte deste conselho tornou mais fácil para mim trabalhar com as mulheres e fazer propostas na cúpula para construir uma agenda de trabalhos comum para os direitos das mulheres.  Foi criada uma rede de mulheres que considera questões importantes para nós, como as alterações climáticas, o empreendedorismo econômico, a autonomia alimentar.  É nisso que temos trabalhado como amazonenses, porque é essencial estarmos unidas e colaborar com nossos colegas, porque até agora a voz da COICA tem sido uma voz masculina.  Temos os nossos planos e sabemos o que fazer na COICA.

Foto de Fany Kuiru Castro (Jitoma Monayanho), utilizada sob permissão da COICA.

JFSJ: Quais são os desafios da organização?

FKC: En este momento, nuestra organización es débil, nos quedó chiquita para los desafíos actuales de la cuenca Amazónica. El desafío es pensar en todos, no dejar Coica para que cada cuatro años esté dividida por intereses individuales. Si no blindamos, si no renacemos a la Coica con pilares más fuertes, nunca vamos a avanzar. Los retos son muchos porque la cuenca Amazónica tiene muchos conflictos, en este momento hay diálogos internacionales sobre la Amazonia que están parados debido a este desorden que hay en Coica.

Por eso hacemos un llamado a los aliados y cooperantes que no estén esperando que el problema se resuelva porque esto va a ser difícil, deben apostarle a la legalidad, deben entender que fuimos elegidos en Quito en el marco de la legalidad porque se realizó el Congreso conforme al estatuto. Los otros que armaron el desorden deben ser llamados por su mayores y sabedores(as) para que definan qué se debe hacer con ellos.

También hay desconocimiento de muchas comunidades y pueblos en las bases comunitarias que se han convertido en organizaciones familiares y están representando a su país en la Coica. Eso no puede ser, pues desde todo punto de vista es parte también de la corrupción y eso es lo que queremos sanar.

FKC: Neste momento, nossa organização é fraca, somos pequenos demais para os desafios atuais da bacia amazônica.  Um desafio é pensar em todos e não deixar que a COICA seja dividida por interesses individuais a cada quatro anos.  Se não protegermos, se não restabelecermos a COICA com bases mais fortes, nunca faremos progressos. Os desafios são muitos porque há muitos conflitos dentro da bacia amazônica.  Neste momento, há diálogos internacionais sobre a Amazônia que foram suspensos devido a essa desordem dentro da COICA.

É por isso que pedimos aos aliados e parceiros para que não esperem que o problema seja resolvido, porque isso vai ser difícil.  Eles devem confiar na legalidade.  Devem entender que fomos eleitos em Quito dentro de um quadro legal porque o Congresso foi realizado de acordo com o estatuto.  Os outros que criaram essa confusão devem ser chamados por seus anciãos(ãs) e sábios(as) para decidir o que deve ser feito com eles.

Há também falta de conhecimento dentro de muitas organizações comunitárias que se tornaram organizações nepotistas e estão representando seu próprio país na COICA [em vez de representar a região].  Isso não pode ser, porque, de todos os pontos de vista, também faz parte da corrupção da qual queremos nos livrar.

JSFS: Quais ferramentas você irá utilizar para unir a COICA?

FKC: Mi objetivo como coordinadora, como mujer, es que todo esté en orden. Porque en nuestra cultura nos enseñan que dentro de la maloca [ed: maloca significa casa, y en este caso, significa la “gran casa” que es la Amazonía] cada cosa debe estar en su lugar. Cuando se sale de su entorno es que hay desarmonía y hoy estamos viviendo una desarmonía que tiene nombre propio y no va más allá de cuatro personas, pero que han sido financiadas por unas ONG inescrupulosas y por eso tienen la capacidad de hacer eventos ilegales e ilegítimos. A ellos los llamamos también al diálogo, pero no para que nos manipulen ni para que nosotros cedamos a sus intereses, pues no lo vamos a hacer.

Asimismo, hay que hablar con los mayores, con las sabedoras, con los jóvenes, escuchar a la población no incluida, incorporarla y una vez dialoguemos hermanados, en el territorio, podemos ir a una cumbre de pueblos donde digamos ‘vamos a marchar hacia delante para que la Coica esté blindada de futuras divisiones’.

FKC: Meu objetivo como coordenadora, como mulher, é que tudo esteja em ordem.  Porque na nossa cultura nos ensinam que dentro da maloca [ed: maloca significa ‘casa’, e neste caso, significa a ‘grande casa’ que é a Amazônia] tudo deve estar em seu lugar.  Quando se deixa o ambiente, há desarmonia e hoje vivemos uma desarmonia que tem nome próprio e não ultrapassa quatro pessoas, mas que foi financiada por ONGs sem escrúpulos, e é por isso que têm a capacidade de organizar eventos ilegais e ilegítimos. Pedimos também que mantenham um diálogo, mas não para que nos manipulem ou para que cedamos aos seus interesses, porque não faremos isso.

Da mesma forma, devemos conversar com os idosos, com aqueles experientes, com os jovens, ouvir a população que não foi incluída até agora, trazê-los e, uma vez que tenhamos um diálogo no território, podemos participar de uma cúpula de comunidades indígenas onde dizemos “vamos avançar para que a COICA seja protegida de futuras divisões”.

JSFJ: Qual mensagem você tem para as mulheres que desejem aderir a essas posições?

FKC: A las hermanas de la cuenca Amazónica les envío un abrazo fraterno. Tenemos un gran reto, ustedes me eligieron como su única candidata para la coordinación general y el día que lo hicieron les dije que esta no era solo tarea mía, sino de todas. Las invito a seguir de pie hermanas porque ya hemos logrado un peldaño de lo que hemos solicitado, como fruto de nuestra lucha, hemos llegado a este lugar, pero hemos recibido una Coica fragmentada.

Sin embargo, nosotras tenemos toda la fuerza, el conocimiento, la espiritualidad para avanzar. Nuestros hermanos tienen que ceder. Yo si quisiera que cada coordinación, cada país hable con sus representantes, es el momento de ceder a las mujeres ese espacio. No les vamos a hacer daño, al contrario, estamos apoyándolos para que la Coica sea más paritaria y más incluyente, como somos las mujeres.

Nosotras somos las verdaderas defensoras y protectoras de esa gran maloca, la casa, nuestra que es la Amazonía. Las llamo a que permanezcamos unidas, puesto que sé que algunas compañeras están siendo perseguidas por sumarse a esta lucha.

FKC: Às irmãs da bacia amazônica mando um abraço.  Temos um grande desafio, você me escolheu como a sua única candidata à coordenação geral e nesse dia eu disse que este não era apenas o meu trabalho, mas o de todos.  Convido vocês, irmãs, a continuarem de pé, porque já alcançamos esse objetivo que é um trampolim em nossas reivindicações, como resultado de nossa luta chegamos a esse ponto, mas temos uma COICA fragmentada.

No entanto, temos toda a força, conhecimento e espiritualidade para seguir em frente.  Nossos irmãos têm que ceder.  Quero que cada coordenação, cada país fale com os seus representantes, está na hora de dar esse espaço às mulheres.  Não vamos prejudicá-las, pelo contrário, vamos apoiá-las para que a COICA possa ser mais igualitária e mais inclusiva, como nós, mulheres.

Somos as verdadeiras defensoras e protetoras dessa grande maloca, nossa casa, que é a Amazônia. Peço a vocês que permaneçam juntas, pois sei que algumas colegas estão sendo perseguidas por se juntarem a esta luta.

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