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Assédio contra árbitra de futebol em um jogo em Ruanda destaca os desafios das oficiais femininas

Categorias: África Subsaariana, Camarões, Marrocos, Ruanda, Sudão, Esportes, Mídia Cidadã
Salima Mukansanga an international football referee from Rwanda. She became the first woman to referee at the African Cup of Nations & one of three women referees selected to officiate at the FIFA World Cup in 2022. Image Source; YouTube video screengrab

Salima Mukansanga, uma árbitra de Ruanda que atua no futebol internacional. Ela se tornou a primeira mulher a apitar uma partida da Copa das Nações Africanas e uma das três mulheres selecionadas para apitar a Copa do Mundo em 2022. Fonte da imagem: foto de um vídeo do YouTube [1].

Um caso recente de abuso contra uma árbitra de futebol acendeu uma luz em relação às dificuldades que essas mulheres enfrentam em uma profissão majoritariamente masculina, apesar de recentes avanços alcançados nos últimos anos.

Em 21 de janeiro de 2023, Salima Mukansanga, [2] uma das árbitras do futebol africano feminino, passou por um incidente físico e verbal durante uma partida local entre Kiyovu Sport e Gasogi United. O futebol é famoso em Ruanda e a Primus National League, [3]da qual os dois times fazem parte, têm um grande número de seguidores.

Mukansanga é uma das pioneiras a apitar um torneio masculino de futebol. Ela entrou para a história durante a Copa do Mundo Fifa de 2022 como a primeira árbitra africana na competição.

Além disso, em janeiro de 2022, ela se tornou a primeira mulher a apitar um torneio continental masculino na Copa das Nações Africanas, [4] realizado em Camarões. Seu trabalho como árbitra em jogos locais e internacionais a tem tornado alvo de torcedores locais, como aconteceu durante o jogo do Kiyovu Sport e Gasogi United. De acordo com um relatos da mídia, um grupo de torcedores do Kiyovu Sport insultou Mukansanga de ”prostituta” com um cântico repetitivo. [5]

De acordo com JulesKarangwa, funcionário da Federação Esportiva da Ruanda [3] (FERWAFA), a segurança precisou intervir para protegê-la do confronto com os fãs após o término do jogo. A federação publicou uma nota em suas redes sociais condenando a ação dos torcedores:

1/3 FERWAFA condena os comportamentos antidesportivos praticados pelos torcedores do @SCKiyovuSports [6] durante e após seu jogo contra Gasogi Utd no estádio Bugesera no Matchday 16 da @PrimusLeague [7] no dia 20/01/2023, quando alguns torcedores foram vistos dirigindo palavras abusivas à arbitra do jogo.

— Rwanda FA (@FERWAFA) 24 de janeiro de 2023 [8]

Estes atos desvalorizam as conquistas alcançadas pelos árbitros de futebol africano nos últimos anos. Em um passado recente, árbitros africanos—homens e mulheres— têm apitado [9] jogos de alto nível. Durante a Copa do Mundo da Fifa em novembro de 2022, havia seis árbitros de origem africana [10]. Havia também seis árbitras, incluindo Stephanie Frappart [11] da França, Yamashita Yoshimi [12] do Japão, Neuza Back [13] do Brasil, Karen Diaz Medina [14]do México, e Kathryn Nesbitt [15] dos Estados Unidos — com Mukansanga completando o sexteto das árbitras.

Árbitra turca de futebol Dicle Öz. Imagem: CeeGee licenciada sob CC BY-SA 4.0.

O caso de Mukansanga não é único no futebol, um esporte ainda amplamente dominado pelos homens. Na América Latina, a situação é bem parecida. Melany Bermejo, [16] uma árbitra do México, disse que em 2016, torcedores a submeteram a várias formas de assédio, incluindo agressão física, verbal e flertes. A assistente de arbitragem Lixy Enriquez disse que as mulheres precisam se esforçar duas vezes mais [16] do que os árbitros homens para serem aceitas. Ela teve que suportar insultos de suas colegas, que diziam a ela para ”voltar para a cozinha.”

Até 2016, a Fifa tinha 720 árbitras registradas — 324 árbitras principais e 396  assistentes — tanto de linha como  assistentes de vídeo (VAR). O torneio no Catar aumentou as preocupações sobre os direitos humanos e de gênero, e isso serviu como uma mensagem positiva para a Fifa, [17] fazendo com que mais mulheres apitassem torneios oficiais e campeonatos continentais como a Copa da África, a Copa da Ásia e a Copa Libertadores [18].

Munira Ramadan, a pioneira na arbitragem do futebol feminino do Sudão

Observando a história do futebol, Munira Ramadan [19], do Sudão, se tornou possivelmente a primeira mulher a apitar um jogo de futebol da Liga do Sudão entre 1975 e 1980. No entanto, sua façanha nunca foi reconhecida, uma vez que ela nunca se registrou para obter as credenciais internacionais [20] da Fifa.

Ramadan foi uma mulher pioneira, que inclusive participou de esportes  como o arremesso de disco e a natação. Ainda fez parte da seleção nacional de basquete do Sudão, onde também foi árbitra. Ela preparou o terreno para as demais árbitras na África [21] e no resto do mundo. Em 2019, um trio de árbitras do Sudão participou de uma partida qualificatória entre Argélia e Chade realizada em abril de 2019 [20] para Jogos Olímpicos.

Primeira arbitragem realizada apenas por mulheres na Copa Africana das Nações

Em 2022, a CAF convocou Mukansanga como integrante da equipe de arbitragem formada apenas por mulheres, junto com Carine Atemzabong de Camarões, Fatiha Jermoumi e a assistente de vídeo (VAR) Bouchra Karboubi, ambas do Marrocos, para a Copa Africana das Nações realizada em Camarões [22].

A decisão da Fifa de apontar árbitras [23] para apitar jogos masculinos alcançou um novo marco em novembro de 2022 no Catar, quando as mulheres foram escolhidas para realizar arbitragens na Copa do Mundo pela primeira vez. Pierluigi Collina, presidente do conselho da Fifa, [24] observou que, mesmo que o público notou que eram mulheres, sua seleção foi exclusivamente baseada no fato de serem árbitras de futebol.

Os esforços da Fifa para contratar árbitras são louváveis. As ligas de futebol locais e regionais, por outro lado, ainda estão encontrando uma maneira para que as árbitras sejam aceitas.