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Periferias aparecem menos nos planos de governos em eleições no Brasil em 2022

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Brasil têm eleições para presidência e governos estaduais em 2022. Promessas dos candidatos abordam pouco temas das periferias (Matheus Pigozzi/Agência Mural)

Este texto é de autoria de Paulo Talarico e foi publicado originalmente em 26 de agosto de 2022, no site da Agência Mural [1]. O artigo é reproduzido aqui em acordo de parceria com o Global Voices, com edições.

As periferias não estão na boca ou nos planos de governo de candidatos à presidência do Brasil, mas entraram mais na linguagem dos candidatos a governador de São Paulo. Ao menos é o que indicam os planos de governo [2] apresentados pelos candidatos à Justiça Eleitoral para a campanha das eleições de 2022, que tem o primeiro turno marcado para 2 de outubro.

Levantamento da Agência Mural indica uma queda no uso do termo “periferias” e “periférico” nas promessas apresentadas pelos presidenciáveis, o que muda uma tendência vista em 2018.

Há quatro anos, nas últimas eleições presidenciais, as menções passaram de 7 para 53. Este ano, foram apenas 11 e a metade dos candidatos não fez nenhuma citação a essas palavras.

Foi levado em conta para o levantamento todas as candidaturas apresentadas. Apesar de a eleição estar polarizada entre o ex-presidente Lula (PT, Partido dos Trabalhadores) e o atual mandatário Jair Bolsonaro (PL, Liberal), 12 candidatos  apresentaram registro de candidatura, mesmo número de concorrentes em 2018 — um deles teve a candidatura negada [3] depois da análise.

Na contramão, os candidatos a governador do estado com maior número de eleitores no país vêm registrando uma alta desde 2014 e chegaram a 22 citações. Em São Paulo, 10 candidatos [4] disputam o governo.

Os planos de governo apresentados são como “cartas de intenção” sobre o que será feito em um eventual mandato e trazem alguma análise sobre o cenário nacional e estadual.

A presença ou não dos termos periferias e periférico não significa que não há propostas que afetam os territórios, mas podem servir como uma percepção de como os candidatos têm observado esse tema.

Presidência

Imagem: Matheus Pigozzi/Agência Mural

Os textos apresentados pelos presidenciáveis mostram uma certa distância do tema periférico. A redução em quase 80% das menções foi impulsionada pelo excesso do termo em 2018 no plano de Guilherme Boulos (PSOL, Socialismo e Liberdade) – sozinho, a proposta dele continha 36 menções [5].

Mas os candidatos deste ano também não fizeram por onde sobre o assunto.

O candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL [6], Liberal), as senadoras Simone Tebet (MDB [7], Movimento Democrático Brasileiro) e Soraya Thronicke (União Brasil [8]), Eymael (DC [9], Democracia Cristã), Felipe D’Avila (Novo [10]) e Roberto Jefferson (PTB [11], Trabalhista Brasileiro) não fazem citação ao termo. Pablo Marçal (Pros [12], Republicano da Ordem Social), que teve a candidatura indeferida [3] no começo de setembro, mencionou uma vez para dizer que veio da periferia de Goiânia (GO).

O ex-presidente Lula (PT [13], Partido dos Trabalhadores) menciona apenas uma vez o termo periferia, uma queda em comparação com o plano apresentado por seu partido em 2018, quando trouxe as periferias sete vezes.

Na época, Lula foi substituído por Fernando Haddad, que mencionou oito vezes a palavra no plano que apresentou em substituição ao anterior.

Desta vez, o plano apresentado por Lula usa a palavra para defender amplo acesso à cultura “fortalecendo a memória e a diversidade cultural, valorizando a arte, a cultura popular e periférica, garantindo a plena liberdade artística”.

O tom foi semelhante ao de Ciro Gomes (PDT [14], Democrático Trabalhista), que promete estimular “as manifestações culturais que propiciam a inclusão social e a cultura periférica de rua, como as danças, grafites e slams”. O candidato concorreu em 2018 e agora, mantendo uma menção nas duas ocasiões.

Coube a candidatos que correm por fora nas pesquisas [15] de intenção de voto (marcam menos de 1%) a maior presença periférica nas propostas.

“Será criado um programa de contratação de médicos e pessoal de saúde para as regiões menos assistidas do país e para as regiões periféricas aos grandes centros urbanos”, diz o programa de Sofia Manzano (PCB [16], Comunista Brasileiro), que fala quatro vezes sobre as periferias brasileiras.

Ela e a candidata Vera Lúcia (PSTU [17], Socialista dos Trabalhadores Unificado) também enfatizaram o termo para falar sobre o combate ao racismo e a morte de jovens negros.

“As polícias têm-se constituído em máquinas de matar a juventude e a população pobre da periferia, especialmente o povo negro”, afirma Sofia no plano de governo apresentado. 

O programa dela propõe ainda a extinção da Polícia Militar [18] — que no Brasil tem papel de policiamento ostensivo e preservação de ordem — e a reestruturação da segurança pública, sob o controle direto da população trabalhadora.

Vera também menciona a violência contra a juventude negra na periferia e propõe “emprego para todos os jovens, como parte do plano de obras públicas; auxílio emergencial para todos os jovens desempregados de um salário mínimo”.

Por fim, Léo Péricles (UP [19], Unidade Popular) usou o plano para falar de educação e que quer “ampliar a rede de escolas públicas de ensino fundamental, médio, técnico e superior, em especial nas periferias das grandes cidades e no interior do País”.

A reportagem também procurou o termo “favela”, que apareceu apenas três vezes e também teve mais ênfase na disputa estadual.

Governadores

Imagem: Matheus Pigozzi/Agência Mural

No caso da disputa dos candidatos ao governo de São Paulo, apenas três candidatos não fazem menção direta às palavras “periferia/periférico”: o atual governador Rodrigo Garcia (PSDB [20], Social Democracia Brasileira), Edson Dorta (PCO [21], Causa Operária) e Antônio Jorge (DC).

Em relação aos que falam do termo, a cultura e a letalidade policial são as marcas das menções dos candidatos.O ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), foi quem mais usou a expressão: oito vezes, no total.

Ele aborda a gravidade da pandemia de Covid-19 [22] sobre “a população preta das periferias. Também cita os impactos nas escolas no período e ao falar sobre cultura. “Defendemos que os investimentos em cultura cheguem a todo território paulista, contribuindo para o desenvolvimento local, e também ao fomento da cultura popular, das identidades regionais e das periferias”, diz o texto.

Haddad também usa o termo ao abordar a letalidade policial e a proposta de incluir a disciplina racismo estrutural nas academias de polícia — os estados brasileiros têm suas próprias polícias [23] Militar e Civil.

O plano coloca como meta a democratização da informação digital, que “é um elemento essencial para a incorporação da juventude, sobretudo a pobre e periférica, ao exercício da política e da cidadania”.

O ex-ministro de infraestrutura de Bolsonaro, Tarcísio de Freitas (Republicanos [24]), menciona duas vezes as periferias, primeiro ligando a questão à segurança pública.

“Vamos enfrentar de forma integrada as questões de desordem social, devolvendo a paz e a tranquilidade noturna aos cidadãos das periferias”, promete.

Ele também cita a diferença de expectativa de vida entre a periferia e o centro de São Paulo, que chega a 23 anos. O candidato traz cinco vezes as favelas no plano, ao citar que São Paulo tem o maior número de comunidades e sobre o desejo de empreendedorismo de moradores.

E promete avançar na urbanização. “Vamos promover a regularização da oferta existente, com titulação, urbanização das favelas, regularização fundiária, inclusive com retrofit de imóveis abandonados”.

Com seis citações à temas das periferias, Carol Vigliar (UP) foi a segunda que mais usou a palavra. Ela propõe “ampliar a rede de escolas públicas de ensino fundamental, médio, técnico e superior, em especial nas periferias das grandes cidades e no interior de São Paulo”.

Também fala que fará uma revisão na concessão da energia elétrica e uma tarifa social “combatendo as contas abusivas cobradas da população e, em especial, dos moradores das periferias”.

Cita ainda mercados populares nessas regiões e fortalecer bancos de alimentos para evitar que famílias fiquem em insegurança alimentar. Por fim abordou a violência e a cultura, além da “padronização das escolas do centro e das periferias”.

Gabriel Colombo (PCB) diz que fará “programas emergenciais de empregos”, que seriam frentes de trabalho urbanas e rurais para obras de saneamento, habitação, reforma de escolas, hospitais, zeladoria das regiões empobrecidas e periféricas do estado e ampliação da malha metroferroviária.

Por fim, Elvis Cezar (PDT) prevê a “ampliação dos editais de fomento à cultura, com ênfase a periferia”.