- Global Voices em Português - https://pt.globalvoices.org -

Tribunal Eleitoral do Brasil aproxima plataformas antes das eleições presidenciais, mas dúvidas sobre compromissos das empresas permanecem

Categorias: América Latina, Brasil, Eleições, Mídia Cidadã, Política, GV Advocacy, Brazil election 2022, Unfreedom Monitor

Imagem por cortesia de Giovana Fleck

O Tribunal Superior Eleitoral do Brasil (conhecido por TSE) tem monitorado a desinformação eleitoral desde 2017, quando o conceito de “fake news” ganhou força nas eleições dos Estados Unidos. Ainda assim, não havia previsão que pudesse ter preparado o tribunal para o papel que as redes sociais desempenharam nas eleições gerais de 2018 que acabou colocando o candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro na presidência.

As autoridades eleitorais ficaram alarmadas com uma enchente de desinformação no WhatsApp, presente em 99% dos celulares brasileiros [1], bem como no Facebook. Também houve o uso de ferramentas de mensagens em massa do WhatsApp [2] pela campanha de Bolsonaro, espalhando notícias falsas contra o seu concorrente, Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores. A prática já foi declarada ilegal [3] pela Justiça Eleitoral.

Hoje, informado pela experiência de 2018, bem como pelas lições de outros países, o Tribunal Superior Eleitoral aproximou as plataformas para combater a desinformação eleitoral e os contra-ataques às instituições democráticas, na tentativa de limitar o papel que as redes sociais desempenharão nas Eleições Gerais de 2022.

Apesar do entusiasmo, os acordos que estabeleceram a cooperação entre o TSE e as plataformas são não vinculativos e um pouco opacos [4], deixando muitas questões em aberto sobre as ações realizadas pelas plataformas para garantir um ambiente de informação seguro a poucas semanas do primeiro turno das eleições.

Investigadores do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD), vinculados à Universidade Federal da Bahia (UFBA), que estão monitorando se os compromissos assumidos pelas plataformas estão sendo cumpridos, identificaram muitas falhas [5], particularmente em relação ao conteúdo de verificação de fatos, velocidade de processamento de relatórios e transparência no combate à desinformação.

Os acordos

Em 2019, sob a presidência da ministra Rosa Weber, o Tribunal Superior Eleitoral lançou o “Programa de Combate à Desinformação”, um experimento com controles direcionados às eleições municipais de 2020. Em agosto de 2021, o programa se tornou permanente pelo então presidente do TSE, o ministro Luís Roberto Barroso.

Três dos ministros do TSE também são ministros do Supremo Tribunal Federal, entre eles o atual presidente, ministro Alexandre de Moraes. Ambas as instituições foram atacadas [6] por grupos pró-Bolsonaro e antidemocráticos, que acreditam falsamente que os tribunais estão envolvidos em uma campanha contra Bolsonaro. Os ataques têm como alvo o ministro Moraes mais do que qualquer outro, pois ele é o relator de muitas ações judiciais que dizem respeito a Bolsonaro ou a aliados próximos.

Em fevereiro de 2022, oito plataformas firmaram acordos com o TSE comprometendo-se a combater a desinformação no processo eleitoral: Twitter, TikTok, Facebook, WhatsApp, Google, Instagram, YouTube e Kwai. Desde então, outras empresas, como LinkedIn e Spotify, aderiram ao acordo, incluindo uma incomum: Telegram.

Em apenas alguns meses, o Telegram passou de inimigo do Supremo Tribunal a aliado. Em janeiro, o presidente do TSE, ministro Barroso, disse que, se o Telegram não cooperasse com o tribunal na nomeação de um representante legal no país, entre outros requisitos, o Congresso deveria proibir sua operação no país. Em março, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes decidiu bloquear a operação do Telegram [7] no Brasil, caso a empresa não cumprisse esta e outras decisões judiciais. A decisão foi tomada no contexto do caso de Allan dos Santos [8], blogueiro pró-Bolsonaro envolvido em atividades antidemocráticas. A decisão de Moraes foi a demonstração final de uma insatisfação que havia sido construída ao longo de meses. No entanto, o bloqueio não entrou em vigor, porque o Telegram finalmente agiu.

Os acordos entre as empresas de rede social e o TSE são baseados em memorandos de entendimento, que listam as ações e medidas a serem tomadas conjuntamente pelo tribunal e cada plataforma. Para o Telegram [9], por exemplo, o acordo envolve: canal de acesso à plataforma para verificação pelo TSE, acesso à API do Telegram, criação de um canal exclusivo para o TSE denunciar violação de conteúdo, rotulagem de desinformação e participação em reuniões de rotina com o TSE.

No geral, os acordos obrigam as plataformas, independentemente da natureza e da infraestrutura, a se comprometerem a priorizar as informações oficiais como meio de mitigar o impacto prejudicial das notícias falsas no processo eleitoral brasileiro.

O WhatsApp, ainda no centro das atenções devido ao seu papel nas eleições de 2018, prometeu implementar ou ajudar a implementar uma série de medidas para disseminar “informações confiáveis e de qualidade sobre o processo eleitoral, como o acesso à API e ao desenvolvimento de um pacote de adesivos sobre as eleições a serem usadas no aplicativo”, de acordo com um comunicado postado [10] pelo TSE.

Mesmo assim, o WhatsApp criou tumulto devido à sua decisão de reter o lançamento do recurso Comunidades, que possibilita grupos maiores e difusão de mensagens, até depois das eleições. A decisão enfureceu Bolsonaro, que pensou que o WhatsApp estava seguindo ordens do TSE — o que não é o caso. Mas, além dos próprios interesses de Bolsonaro, a posição do WhatsApp também tem despertado preocupação entre as autoridades, que entendem que seria mais seguro divulgar o recurso apenas em 2023, temendo agitação civil entre o segundo turno das eleições e a tomada de posse. Além disso, o Ministério Público no Brasil vê o lançamento de grupos maiores como uma regressão nos esforços da empresa para combater a desinformação [11].

Porém, todos os acordos são não vinculativos, o que significa que não haverá imposição no caso de uma plataforma não atender às ações listadas no Memorando de Entendimento. Além disso, o desenvolvimento contínuo dos acordos entre o tribunal e as plataformas é pouco transparente, o que significa que a sociedade, em geral, recebe pouca informação sobre como está acontecendo a cooperação.


Visite a página do projeto para obter mais artigos do Unfreedom Monitor [12].