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Por que os nigerianos são tão rápidos em descartar a saúde mental dos adolescentes?

Categorias: Nigéria, Juventude, Mídia Cidadã, Saúde, The Bridge

Protesto na Nigéria pelo fim da estigmatização contra doenças mentais em 5 de março de 2021. Imagem via Wikipedia Damilareadeyemi [1] via (CC BY-SA 4.0) [2]

Quantas crianças precisam morrer ou acabar com suas vidas antes de entendermos que a saúde mental é importante? Por quanto tempo os adolescentes têm que sofrer com problemas de saúde mental em silêncio porque a maioria dos nigerianos mais velhos diz que eles estão “apenas querendo atenção?” A Organização Mundial da Saúde [3] (OMS) afirma que a falha em abordar os problemas de saúde mental em adolescentes pode impedi-los de aproveitar oportunidades e levar uma vida próspera. As crianças, assim como os adultos, experimentam problemas como distúrbios alimentares graves, trauma, insônia, entre outros. Então, por que somos tão rápidos em descartar seus problemas?

A adolescência é um período de formação [4] em que os pais e o ambiente das crianças moldam seus hábitos, estilos de vida e resiliência emocional. Há muitos fatores que podem edificar ou derrubar um jovem durante esta fase. Quando não recebem a devida atenção, fatores físicos, emocionais e sociais podem marcá-los permanentemente e criar barreiras a oportunidades futuras.

Na Nigéria, embora haja uma consciência gradual dos problemas gerais de saúde mental [5], ainda há pouco ou nenhum cuidado direcionado à saúde mental das crianças nigerianas. Isso pode ocorrer porque a atitude da sociedade “em relação à doença mental é gravemente tratada com preconceitos e equívocos”, afirma [6] Torinmo Salau, jornalista do jornal Nigerian Guardian.

Além disso, os problemas de saúde mental às vezes estão ligados a crenças espirituais ou religiosas e, em alguns casos, os problemas podem ser atribuídos à “possessão maligna [7]“, o que torna difícil para a obtenção dos cuidados necessários. Em uma pesquisa de 2020 realizada na Nigéria por Africa Polling Institute e EpiAFRIC [8], 54% dos entrevistados acreditavam que os problemas de saúde mental eram causados pela possessão de espíritos malignos. 

Consequências de desconsiderar a saúde mental do adolescente

Adolescentes que passam por problemas de saúde mental tendem a ter pouco engajamento e concentração na vida escolar [9]. Ao lidar com problemas como depressão ou ansiedade, uma criança pode se isolar dos outros, levando a uma vida social e acadêmica prejudicada. Da mesma forma, as crianças podem acabar tirando a própria vida quando suas preocupações não são adequadamente gerenciadas ou atendidas.

De acordo com o Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (UNICEF [10]), “o suicídio é a quarta principal causa de morte entre jovens de 15 a 19 anos. Todos os anos, quase 46.000 crianças entre 10 e 19 anos tiram a própria vida; cerca de uma criança a cada 11 minutos”. Com o entendimento nigeriano de que não existe doença mental, a comunidade tende a minimizar [11] as emoções negativas que as crianças experienciam. A educação sobre saúde mental é “extremamente baixa entre” os adolescentes nigerianos, conforme revelado em um estudo [12] da farmacêutica clínica Deborah O. Aluh e outros dois colegas.    

Mas, embora a conscientização possa ser baixa, os problemas de saúde mental entre os adolescentes nigerianos não são; eles são apenas subnotificados ou apresentados tardiamente aos hospitais. Um estudo realizado por Pleasure Ogbonna e cinco outros pesquisadores da ciência da enfermagem em Enugu, sudeste da Nigéria, identificou [13] a esquizofrenia como a “doença mental mais comum diagnosticada” entre os adolescentes nigerianos. Da mesma forma, a doença mental atinge o pico a partir dos 18 anos e é “mais branda aos 15 anos”, diz Ogbonna.

Por exemplo, uma garota com um transtorno alimentar tem mais probabilidade de ser castigada do que ajudada devido à mentalidade de que ela apenas não gosta de comer. Ela provavelmente nunca receberá a ajuda de que precisa e pode não conseguir ter acesso à assistência de saúde mental de um hospital. Isso ocorre porque apenas 3,5% do orçamento de saúde da Nigéria é destinado a cuidados de saúde mental, segundo [14] o jornalista nigeriano Ogar Monday.

Quando os pais desconsideram a saúde mental de seus filhos, pode haver um mal-entendido [15] entre eles, o que pode causar conflitos na família. Por exemplo, se o responsável não pode aceitar que seu filho está sofrendo de ansiedade social, esse pode não entender a relutância da criança em participar de reuniões sociais, e isso pode levar a uma punição injustificada. Além disso, quando o estado mental de um adolescente não é observado adequadamente, isso pode levar a mau comportamento [16] e arrogância; por exemplo, a UNICEF relata uma avaliação [17] de Saúde Mental e Apoio Psicossocial (MHPSS) que mostra que crianças, especialmente nas zonas de conflito no nordeste da Nigéria, passam por sofrimento psicológico que se manifesta em agressão, comportamento antissocial, entre outros. Consequentemente, algumas crianças podem destruir seu futuro ao se envolver em comportamentos delinquentes, e a sociedade como um todo pode sofrer de problemas de saúde mental não tratados.

Combatendo o problema

O governo não pode continuar desprezando a saúde mental das crianças. É preciso criar instalações [18] funcionais que ajudem a estabilizar e controlar problemas de saúde mental relacionados à criança e oferecer o apoio de que precisam para viver de modo saudável e próspero. Juntamente com as ONGs, o governo deve assumir a responsabilidade de financiar e desenvolver essas instalações para ajudar essas crianças quando os pais não conseguirem fornecer cuidados adequados.

Quanto aos próprios pais, fazer perguntas ajuda muito no monitoramento da saúde mental de uma criança. Embora algumas crianças, por natureza, tendam a não se abrir para os pais, algumas o farão. Quando uma criança percebe que há um espaço positivo para expor seus problemas, ela se sentirá confortável em se abrir sobre qualquer problema que a preocupe. Isso proporciona espaço para os pais ficarem em sintonia com o que seus filhos pensam. Fazer perguntas também pode promover laços mais fortes entre famílias e até mesmo sociedades.  

O autor William Chapman disse uma vez: “uma faca pode ser puxada, mas as palavras estão embutidas em nossas almas”. Imagine uma criança vivendo obcecada com seu peso ou uma criança que acredita ser inútil se demonstrar suas emoções. Como observado anteriormente, a adolescência é uma idade de formação, e tudo o que dissermos aos nossos jovens agora refletirá em suas ações mais tarde. Escolher cuidadosamente uma linguagem positiva e afirmativa ao conversar com os jovens pode ajudar a promover a mentalidade de que sua saúde mental é importante, e elevar sua inteligência emocional.

A Nigéria é um país que está se desenvolvendo gradualmente de muitas maneiras, incluindo uma crescente compreensão e aceitação das doenças mentais. É por isso que é tão importante aumentar a conscientização sobre esse fenômeno. É fundamental que todos aprendam mais sobre a questão da saúde mental e como ela afeta as crianças, para depois transmitir o conhecimento.

Concluindo, o entendimento de que os adolescentes não passam por problemas de saúde mental deve ser desencorajado. Quando levamos em conta as consequências de não considerar o estado mental de nossos filhos, fica claro que deve haver um esforço consciente para garantir o sucesso deles. Isso, é claro, deve ser um esforço conjunto dos pais, comunidades e governo para proteger o ambiente e a saúde dos adolescentes.