Colômbia, dividida e diante de mudanças profundas nas próximas eleições presidenciais

Foto por Leon Hernandez/Flickr (CC BY-NC-ND 2.0)

A Colômbia escolherá seu novo presidente e vice-presidente nas eleições de domingo, 19 de junho. Ao contrário dos anos anteriores, existe uma polarização política sem precedentes e uma grande possibilidade de que os candidatos de esquerda, que nunca antes estiveram no poder, vençam.

Em 29 de maio, os resultados do primeiro turno das eleições presidenciais mostraram que nenhum candidato passou a margem de 50% mais um voto necessária para ganhar. Consequentemente, será realizado o segundo turno entre Gustavo Petro e sua companheira de candidatura Francia Márquez – que obtiveram 40,32% dos votos – e a dupla “outsider” Rodolfo Hernández e Marelen Castillo – com 28,15%. Segundo os analistas do órgão de comunicação social independente Silla Vacía, o poder político – representado pelo uribismo, um movimento político demagógico e neoliberal liderado pelo ex-presidente Álvaro Uribe Vélez – foi o maior perdedor nestas eleições, deixando a arena aberta para “uma batalha entre dois populismos”.

Os candidatos do “Pacto Histórico” são Petro, antigo membro do Movimiento 19 de abril (M19), grupo de guerrilha urbana desmobilizado, senador e ex-prefeito de Bogotá, e destacadamente a candidata a vice-presidente, Márquez, uma ativista ambiental e advogada de ascendência africana, que é também uma ex-trabalhadora doméstica. Pela primeira vez na história da Colômbia, uma popular coligação de esquerda pode chegar ao poder e reformular as alianças geopolíticas da região.

“A Colômbia nunca foi liderada por revolucionários como o México ou a Bolívia, ou por movimentos populares como o peronismo na Argentina, ou por um socialista como Salvador Allende no Chile”, declarou à BBC. “Os políticos reformistas de esquerda que quase chegaram ao poder foram assassinados”.

Do grupo “Ligas Gobernantes Anticorrupción (Ligas Governantes Anticorrupção)”, o candidato presidencial é o multimilionário Hernández. Apesar das acusações de corrupção, ele concentrou a sua campanha numa plataforma anticorrupção e na crítica aos políticos tradicionais. Também causou controvérsia não só porque vários uribistas o apoiaram – apesar de ele afirmar ser independente – mas também porque muitos o veem como um espelho da imagem do ex-presidente dos EUA, Donald Trump. Marelen Castillo, sua candidata a vice-presidente, é também afro-colombiana, o que significa que o país verá pela primeira vez uma vice-presidente afro-colombiana tomar posse em 7 de agosto, independentemente de quem ganhar no segundo turno.

Segundo o jornal El Espectador, o que acontece na Colômbia “reflete um fenômeno político que abala várias nações do continente”, com populismos de direita como o de Donald Trump nos Estados Unidos, Jair Bolsonaro no Brasil, Nayib Bukele em El Salvador, ou populismos de esquerda como o de Pedro Castillo no Peru.

Estas eleições suscitaram certa desconfiança porque a Comissão Nacional Eleitoral não foi capaz de contratar um auditor internacional, e por isso o pleito foi realizado com as convencionais auditorias de software a nível nacional. Isso gerou ansiedade entre os eleitores sobre possíveis fraudes eleitorais de vários partidos.

Por que o país está dividido?

Para muitos, a polarização política extrema começou em 1948, quando o político progressista Jorge Eliecer Gaitán foi assassinado, levando à formação de grupos violentos de guerrilha e contra-guerrilha. A violência, agora com narco-paramilitares e narco-guerrillas, continua ainda hoje, especialmente nas zonas rurais. Recentemente, por exemplo, o grupo paramilitar Clan del Golfo (Clã do Golfo) organizou um ataque armado que afetou 178 municípios rurais, como uma retaliação contra a extradição para os Estados Unidos do seu líder mais importante, Dairo Antonio Úsuga David, conhecido como Otoniel.

Essa polarização, portanto, deriva da guerra civil colombiana, que deixou centenas de milhares de mortos e milhões de desalojados, e que ainda está em curso, apesar de um acordo de paz histórico firmado em 2016 com um dos principais grupos guerrilheiros. Muitas pessoas criticam a forma como o atual presidente Iván Duque lidou com o processo de paz entre o governo e as FARC-EP, que aproximou o conflito de um fim, mas não acabou com a violência.

Num estudo realizado em fevereiro de 2022, 73% da população manifestou desaprovação em relação ao governo de Duque. A maioria das pessoas está insatisfeita com questões essenciais como corrupção, segurança pública, economia, emprego, saúde, ambiente e educação. Em 4 de junho de 2022, Duque foi condenado à prisão domiciliar por não ter cumprido uma decisão judicial para a proteger uma reserva natural.

Por um lado, as forças de direita, aproveitando o descontentamento geral causado pelos grupos armados de guerrilha, têm lançado mensagens contra ideias de esquerda e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), especialmente nos meios de comunicação tradicionais, com intensificação desde que o governo de Uribe tomou posse em 2002. Agora, uma parte significativa da população teme um governo de esquerda porque lhes foi dito que, se Gustavo Petro vencer, a Colômbia “se transformará em Cuba ou Venezuela”. Temem que Petro possa ser um populista que levará a Colômbia à falência ou ao autoritarismo. Mais de 90% dos colombianos não apoiam o presidente venezuelano Nicolás Maduro. Estima-se que, em março de 2021, 1,7 milhões de venezuelanos viviam na Colômbia, muitos fugindo de uma crise humanitária cada vez mais profunda.

Por outro lado, outros eleitores colombianos dizem ter despertado quando souberam a verdade sobre os “falsos positivos” – os assassinatos de milhares de cidadãos, principalmente por membros do exército colombiano, para os apresentar como uma vitória na luta contra as guerrilhas e os traficantes de drogas – e também pelo resultado da greve nacional em 2021, desencadeada pelo anúncio de uma reforma fiscal. Durante a greve, 80 jovens foram mortos e muitos outros feridos; diferentes organizações consideram as forças estatais responsáveis pelo uso arbitrário e desproporcionado de força. Os grevistas também protestaram contra os massacres e assassinatos de muitos líderes sociais (cujas mortes ainda não cessaram), a corrupção e a inflação, e exigiram a defesa da dignidade, da vida, da igualdade social e dos direitos humanos. Muitos manifestantes rejeitaram o governo de Duque, que consideram ter utilizado os mecanismos estatais em benefício próprio.

Em 19 de junho, uma Colômbia dividida votará pelo seu futuro. Independentemente de quem vencer, os colombianos querem mudança.

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