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Xangai prossegue com confinamento em toda a cidade apesar do clamor público, escassez de alimentos e caos

Categorias: Leste da Ásia, China, Censorship, Direitos Humanos, Mídia Cidadã, Política, Protesto, Saúde, Tecnologia, COVID-19

Uma imagem viralizou nas redes sociais chinesas. Uma geladeira vazia foi colocada na varanda em protesto contra a escassez de alimentos durante o confinamento.

O confinamento de 26 milhões de pessoas em Xangai foi prorrogado [1] indefinitivamente até que o último surto da Ômicron seja controlado.

A fase 2 do confinamento para toda a cidade foi anunciada em 27 de março e, inicialmente, estava programada para terminar em 5 de abril. Contudo, o número de casos confirmados aumentou e atingiu a marca de 17.077 [2] na data programada para término da fase 2 e as autoridades da cidade decidiram conduzir uma nova rodada de testes universais, esperando conter o surto sob a política de COVID-zero.

Enquanto isso, por trás das cortinas, a cidade está um caos pois a comida de muitos moradores está acabando, serviços básicos de saúde estão sendo negados e o acesso a bens básicos do dia a dia está difícil, de acordo com o último relatório [3] da Human Rights Watch.

No entanto, o caos está sendo censurado nas redes sociais e nas ruas vazias, conforme comentários do professor Weixian Pan:

A mediação romantizada do vazio, a silenciosa Xangai apagou os ocupados profissionais de logística/medicina que percorriam a cidade, e descartaram o quão confuso e caótico esse momento realmente é. A cidade está agora permeada por fúria, exaustão e desapontamento por parte das pessoas.

Acesso restrito a alimentos

O confinamento interrompeu a cadeia logística da cidade que atende às necessidades básicas dos 26 milhões de moradores de Xangai. Enquanto muitos moradores reclamam nas redes sociais que eles estão famintos, incapazes de ir às lojas e que não recebem rações adequadas, legumes e alimentos foram abandonados nas ruas e apodreceram [7] devido à indisponibilidade de mecanismos de entrega.

Em alguns centros de quarentena para pacientes assintomáticos não há funcionários suficientes para distribuir alimentos e suprimentos, o que faz com que as pessoas lutem pela própria sobrevivência. Abaixo está um vídeo compartilhado pelo cartunista político, Rebel Pepper, que mostra o caos em um dos centros de quarentena no leste de Xangai:

Um posto de quarentena em um campus escolar abandonado no distrito de Nanhui no leste de Xangai. Ninguém estava lá para administrar os suprimentos. A comida entregue foi deixada em espaço aberto para as pessoas pegarem.

Mais e mais conflitos eclodiram à medida que moradores tentaram escapar do confinamento do distrito em busca de comida. Rebel Pepper compartilhou um vídeo filmado em uma das zonas de conflito:

Tumulto em um distrito residencial em Xangai. Tudo que ouço são gritos desesperados de ‘Estamos morrendo de fome!’ Eu nunca imaginei que uma crise dessas pudesse acontecer em Xangai. Eu tenho monitorado vídeos censurados vindos de Xangai. Se você não aguenta, apenas não assista.

Mortes sem relação com COVID 

Até agora as autoridades alegam que não houve mortes relacionadas à COVID na atual onda de surtos em Xangai, porém, as evidências parecem contradizer tal alegação.

Um relatório censurado da Caixin mostra que 20 idosos morreram [12] em um centro de cuidados em Xangai na atual onda de surtos. Alguns funcionários e idosos testaram positivo para COVID-19 na instalação.

Um médico da linha de frente em Xangai disse ao site de jornalismo investigativo, Initium, que o número de mortes não relacionadas à COVID ultrapassou as mortes relacionadas à COVID [13] pois os hospitais sofrem com a escassez de profissionais de saúde que foram colocados em quarentena ou mobilizados para conduzir testes universais de COVID. Além disso, alguns hospitais rejeitaram pacientes que precisavam de atendimento emergencial por não apresentarem resultado negativo do teste de PCR das últimas 24 horas.

O blogueiro chinês @fangshimin coletou um número não verificado de alegações sobre mortes não relacionadas à COVID circulando no WeChat:

Xangai é como um inferno na terra agora. Um funcionário de 40 anos da Beckman [uma empresa de atacado] sofreu um ataque cardíaco e morreu porque o hospital se recusou a atendê-lo sem um teste de PCR. Dois ex-alunos da Universidade Tsinghua morreram porque ninguém quis fazer a assepsia de suas gargantas após uma cirurgia. Um jovem de 24 anos morreu de pancreatite aguda devido ao adiamento de um tratamento médico emergencial. Uma criança de 2 anos de idade morreu durante a quarentena, a mãe cometeu suicídio.

Cidadãos ficaram ainda mais enfurecidos por conta da separação de crianças dos seus pais em alguns centros de quarentena, o que viola a Convenção das Nações Unidas sobre Direitos da Criança. Abaixo encontra-se um vídeo que mostra crianças em quarentena sem receber os devidos cuidados:

A política extrema de “COVID Zero” em Xangai é mais perigosa do que o próprio vírus. 200 crianças estão separadas de seus pais sem o consentimento deles. Existem apenas 10 enfermeiros cuidando dessas crianças.

Eventualmente, as autoridades fizeram algumas concessões [21] em 4 de abril.

Apesar da crescente frustração, não há indicação de que o confinamento draconiano terminará em breve, pelo menos não até que o surto esteja sob controle. Mais de 10.000 funcionários, incluindo militares [22] do Exército de Libertação Popular, foram enviados de outras províncias para Xangai para auxiliar com o confinamento.

Drones e cachorros robôs foram vistos percorrendo a cidade vazia pedindo as pessoas que cumpram com os protocolos:

Conforme visto no Weibo: moradores de Xangai saem nas varandas para cantar e protestar por conta da falta de suprimentos. Um drone aparece dizendo: “Por favor, siga os protocolos da Covid. Controle o desejo de liberdade da sua alma. Não abra a janela ou cante.”

Robô percorrendo as ruas fazendo anúncios de saúde em Xangai durante o confinamento.

Embora as redes sociais tenham afrouxado a censura a mensagens individuais pedindo ajuda, críticas contundentes à política do governo estão sendo censuradas. Aqui está a piada mais popular que circulou no Weibo nas últimas semanas:

上海管控最好的地区是评论区 ​

O setor mais bem administrado em Xangai é o setor de comentários.