“Encanto”: uma visão colombiana sobre o filme da Disney

 

Família Madrigal. Imagem da Disney, disponível na Wikimedia.

Alguns meses após a estreia nos cinemas, pode-se dizer que o filme “Encanto” da Disney foi um sucesso na Colômbia. Embora os filmes da Disney sejam comumente associados a princesas e contos de fadas, “Encanto” tem um contexto que enche os colombianos de orgulho, graças à dedicação dos cineastas na pesquisa sobre os detalhes tradicionais e culturais da Colômbia. 

“Encanto” conta a história de uma família matriarcal que vive em uma casa mágica, no coração da Colômbia, em que cada integrante possui um dom mágico, como o da superforça, de prever o futuro e o da cura. Todos, menos a neta da matriarca da família, Mirabel Madrigal, que está em busca do seu lugar na família.

Os dois diretores do filme, Jared Bush e Byron Howard, desde 2016 pesquisaram sobre a Colômbia, ao lado de um comitê da Disney. 

Pôster do filme Encanto da Disney. Imagem da Disney, disponível na Wikimedia.

Eles também foram orientados por profissionais colombianos como antropólogos, botânicos, arquitetos, músicos e linguistas. Vale destacar que, para a dublagem em espanhol, escalaram um elenco quase inteiramente hispânico, que incluiu cantores e atores colombianos, como Carlos Vives, Sebastián Yatra e Maluma

A inspiração está em toda a beleza que muitos desconhecem da Colômbia, e até os colombianos se surpreendem pelo realismo mágico, ao estilo de Gabriel García Márquez, escritor colombiano e vencedor do Nobel de Literatura (1982).

Por meio da cúmbia, da salsa e de diferentes músicas, o filme nos mostra a Colômbia como um país multicultural, que se manifesta em símbolos muito tradicionais, como o acordeão, a ruana, a bolsa Wayúu, as alpargatas, os sombreiros e outros trajes típicos. A seguir há um vídeo do famoso cantor colombiano Rubén Dario Salcedo.

A diversidade étnica dos colombianos também é perceptível em “Encanto”. Há personagens com diferentes tons de pele e olhos, altura, fisionomia e tipo de cabelo.

Nos esportes, observa-se também costumes nativos da Colômbia, como o tejo e o futebol. Além disso, a personagem Luisa Magridal é uma homenagem à levantadora de peso María Isabel Urrutia, ganhadora da primeira medalha de ouro da Colômbia, nos Jogos Olímpicos de Sidney em 2000. Pode-se dizer também que essa querida personagem Luisa é uma homenagem ao pintor e escultor da Antioquia Fernando Botero

Captura de tela da atleta María Isabel Urrutia, no canal Señal Colombia/Youtube

Quanto à cultura popular, temos as superstições. Vemos Bruno jogando sal por cima do ombro porque há uma crença popular de que isso ofereça proteção em momentos difíceis. A fofoca se reflete principalmente em Dolores Madrigal. Na Colômbia, boatos, comentários e fofocas de todo tipo são frequentes em diferentes locais e contextos.

A variedade gastronômica, representada por várias regiões colombianas, como o eixo cafeeiro, o litoral ou o centro de Bogotá, é mostrada em talheres pintados feitos em El Carmén de Viboral, uma cidade no leste da Antioquia conhecida como o “berço da cerâmica artesanal” e declarada Patrimônio Imaterial da Nação em 2020.

Captura de tela de uma artesã em El Carmén de Viboral, no canal Comercial Vivoral Cerámica/Youtube

O café, a espiga de milho, os bolinhos, o ajiaco (sopa de frango e batata), além das ervas e seus benefícios, como mostra a personagem Julieta Madrigal, mãe de Mirabel, que guarda plantas medicinais em seu bolso.

Bolinhos colombianos. Wikimedia commons (CC BY-SA 2.0)

Evidencia-se o país megadiversificado, onde a flora e a fauna se misturam à exuberância da vegetação amazônica, que é muito bem detalhada. E as montanhas que cercam a cidade de “Encanto” parecem ter sido inspiradas no Vale do Cocora.

Vale do Cocora. Flickr (CC BY-NC-ND 2.0)

 A orquídea, a flor nacional da Colômbia, está no cabelo de Mirabel Madrigal. O dom de Isabela Madrigal, irmã de Mirabel, de conjurar flores também faz alusão às silletas de flores e às palmeiras nos arredores da casa. As silletas são feitas pelos camponeses da aldeia de Santa Elena, com tábuas de madeira, que servem de base para um arranjo de flores, e são equipadas com uma corda para poderem ser carregadas na cabeça e nas costas. Elas são exibidas na tradicional Feira das Flores em Medellín para relembrar como os camponeses carregavam suas flores e percorriam longas distâncias para vendê-las no centro de Medellín. 

Garotinha silleteira. Wikimedia commons (CC BY-SA 2.0)

araras, burros, capivaras, onças e beija-flores… As borboletas amarelas também parecem fazer uma homenagem a Gabriel García Márquez e ao seu livro “Cem anos de solidão”.

Ainda assim, acredito que poderiam ter incluído alguns vizinhos da família Madrigal, a fim de mostrar os problemas sociais. Contudo, no início mostram que se trata de uma família deslocada devido à violência, o que é muito válido considerando que a Colômbia é o país com mais deslocados internos do mundo.

O filme passa uma imagem positiva da Colômbia, em que tudo é abundante, enquanto as estatísticas do relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, FAO, mostram uma porcentagem muito alta de pessoas que passam fome no país. 

“Encanto” literalmente encanta, quem assiste tem a chance de expressar suas emoções e relaxar para admirar, rir, sentir raiva ou chorar, mas acima de tudo sonhar, pois, no fim, reflete a Colômbia bela e positiva que sempre quisemos ter e mostrar.  

Inicie uma conversa

Colaboradores, favor realizar Entrar »

Por uma boa conversa...

  • Por favor, trate as outras pessoas com respeito. Trate como deseja ser tratado. Comentários que contenham mensagens de ódio, linguagem inadequada ou ataques pessoais não serão aprovados. Seja razoável.