
Stickers criados pela campanha “Olha o barulhinho”, para engajar adolescentes | Ilustração: Giovana Fleck/Global voices
Em outubro, brasileiros vão às urnas eleger presidente, governadores de 26 estados e do distrito federal, além de deputados e senadores.
Há poucos meses do pleito, porém, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) do país soou um alerta: o número de jovens registrados para votar é o mais baixo das últimas décadas, e mostra tendência de queda.
No Brasil, desde a Constituição de 1988, a primeira após a ditadura militar, o voto de jovens a partir de 16 anos é facultativo, acima de 18 anos é obrigatório — quem não pode votar por motivos de viagem ou trabalho, por exemplo, precisa justificar à Justiça Eleitoral.
O TSE realizou um apelo virtual que deu início a uma campanha nacional, envolvendo influenciadores. Com foco nos usuários do Twitter e Instagram, a hashtag #RolêdasEleições foi criada para promover a “Semana do Jovem Eleitor”: em uma semana, mais de 96 mil títulos foram solicitados por todo o país.
Só no estado do Rio Grande do Sul, de acordo com o jornal Zero Hora, o número de pessoas acima de 16 anos com título de eleitor teve aumento de 86% em um mês.
Famosos brasileiros também decidiram usar suas redes sociais para compartilhar informações sobre como fazer o registro e prazos para adolescentes correrem atrás — até 4 de maio.
Lázaro Ramos, ator e o diretor, foi uma das personalidades a publicarem sobre a campanha no Twitter:
E agora já está acontecendo o tuitaço #RolêdasEleições, para incentivar o primeiro voto e a emissão do título. E toda voz importa!
Participe com a gente, publicando uma mensagem de incentivo no Twitter usando a hashtag #RolêdasEleições
— Lázaro Ramos (@olazaroramos) March 16, 2022
A cantora Anitta, que chegou ao número um do ranking mundial do Spotify, no fim de março, também compartilhou c0m seus 16,5 milhões de seguidores no Twitter:
Tem 16 ou 17 anos ou fará 16 anos ATÉ 02 de Outubro? Mudou de cidade e quer votar para o novo presidente do Brasil?
Então, fique sabendo que é muito fácil tirar ou transferir o título hoje em dia! É tudo online e não precisa de biometria!— Anitta (@Anitta) March 23, 2022
Ela chegou a ser citada pelo ator norte-americano Mark Ruffalo, conhecido pelo papel de Hulk e ativista nos Estados Unidos, que se colocou contra o presidente Jair Bolsonaro e compartilhou ainda outra campanha brasileira:
In 2020, Americans only defeated Donald Trump because record voters used their democratic rights, especially young people. To defeat Bolsonaro, Brazilians aged 16 and 17, must register to vote in the next elections. They have until May 4th to do this at https://t.co/EzvkuIzyrL https://t.co/cbIfSWYwZ9
— Mark Ruffalo (@MarkRuffalo) March 24, 2022
Em 2020, os norte-americanos só derrotaram Donald Trump porque eleitores em número recorde usaram seus direitos democráticos, especialmente jovens. Para derrotar Bolsonaro, brasileiros com idades entre 16 e 17 anos, precisam se registrar para votar nas próximas eleições. Eles têm até o dia 4 de maio para fazer isso
Vem Pirililili
Movimentos também foram criados para a mobilização, entre eles o “Olha o barulhinho” (em referência ao barulho feito pela urna, quando o voto está finalizado) e o SeuVotoImporta, criado por ativistas, como Helena Branco, 19 anos.
Ao podcast O Assunto, ela contou que começou a se interessar pelo tema nas eleições municipais de 2020. Elas se deram conta que a maioria das pessoas desconhecia prazos e informações sobre como tirar o título.
“O TSE está fazendo seu trabalho, mas como a gente leva para os adolescentes essa mensagem de uma maneira diferente? Então, desenvolvemos uma campanha que foi pensada para ser divertida, descolada e falasse a língua da galera que ia tirar o título, que estava nessa faixa etária”, conta ela.
No “Olha o barulhinho”, futuros eleitores podem encontrar tutoriais com estética jovem e referências às trends do TikTok e memes, além de stickers para serem usados no Telegram ou WhatsApp.
De acordo com levantamentos do TSE e do IBGE, a participação dos jovens e adolescentes nas urnas vem caindo no Brasil.
Com base nos dados recolhidos pelo Censo 2010 e em PNADs de 1994 a 2022, nas eleições presidenciais de 2014, a porcentagem de jovens participantes era de 19,5%. Para o ano de 2022, o eleitorado entre 16 e 17 anos havia caído para 10% no primeiro dia do ano.
Entre os possíveis fatores estão a inversão da pirâmide etária brasileira — a população está ficando mais velha — e a relação com a política — seis em cada 10 jovens tem medo de falar sobre o tema e serem cancelados, como mostrou uma pesquisa do instituto Ipec no ano passado.
A pesquisa mostrou ainda que 20% dos jovens desconhece o Congresso Nacional ou o STF (Supremo Tribunal Federal).
À direita
Flávio Bolsonaro, senador pelo Rio de Janeiro e filho do presidente Jair Bolsonaro, comentou a iniciativa em seu perfil no Twitter, em tom de deboche:
23:59 Lula tem 550% das intenções de voto e ganha de todo mundo.
00:00 Pufavô, jxvens, tirem o título de eleitor pra tirar o Bozo da presidência.
— Flavio Bolsonaro (@FlavioBolsonaro) March 25, 2022
Ele publicou outra mensagem abaixo tentando explicar o teor do texto:
Sabemos da importância de tirar o título, mas o jovem não é bobo e sabe muito bem do currículo do ex-presidiário.
— Flavio Bolsonaro (@FlavioBolsonaro) March 25, 2022
As redes sociais também passaram a ter manifestações de jovens declarando voto no atual presidente — a hashtag #SouJovemSouBolsonaro foi usada por quem queria defender a posição do voto nele.
Entre as postagens com a frase, havia críticas a artistas que pedem publicamente a saída de Bolsonaro.
À esquerda
Artistas que se apresentaram na edição brasileira do festival Lollapalooza, entre os dias 25 e 27 de março em São Paulo, também lembraram aos jovens sobre a importância do título e de ir às urnas.
A apresentação da cantora Pabllo Vittar, porém, levou a discussão para o campo dos candidatos. Pabllo pegou uma toalha de um fã, com a foto do ex-presidente Lula, e gritou “Fora, Bolsonaro”.
PL vai ao TSE após Pabllo Vittar usar bandeira de Lula no Lollapalooza https://t.co/8HGfLRwqgb
— UOL (@UOL) March 26, 2022
O ato foi um dos citados por advogados do partido de Bolsonaro, o PL (Partido Liberal), que acionaram a justiça eleitoral alegando que se tratava de campanha antecipada.
Um ministro do Tribunal Superior Eleitoral, Raul Araújo, proibiu então artistas de se manifestarem politicamente no tempo restante do festival — um dia — sob pena de multa, o que levou a ainda mais manifestações contrárias ao atual presidente brasileiro e à censura.
A banda de rock Fresno abriu o último dia, quando a decisão já era pública, exibindo “Fora Bolsonaro” no telão e entoou críticas ao presidente no microfone. Em uma das músicas da banda, no início do show, o vocalista Lucas Silveira puxou os versos:
E o prеsidente, basicamente, quer te exterminar
E o ideal fascista já conquistou teu núcleo familiar
F****!
O ministro voltou atrás à decisão no dia seguinte, uma segunda-feira, com o festival já terminado.
Um balanço divulgado no dia 25 de março pelo TSE diz que, entre os dias 14 e 18 de março, 96.425 mil jovens tiraram títulos de eleitor pela primeira vez. Dentre eles, 52.561 pessoas são do gênero feminino e 43.864 do masculino.