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Moçambicanos não terão mais acesso à saúde negado por conta de sua vestimenta

Categorias: África Subsaariana, Moçambique, Saúde
Fim do acesso às unidades sanitárias em função da indumentária | Foto Observatório Cidadão para Saúde (usada com permissão, Novembro 2021)

Fim do acesso às unidades sanitárias em função da indumentária | Foto Observatório Cidadão para Saúde (usada com permissão, Novembro 2021)

Até 2020, pouco se falava sobre regras dos hospitais que barravam pacientes por conta de suas roupas em Moçambique. A situação começou a mudar quando, em Junho do mesmo ano, uma organização da sociedade civil denominada Observatório do Cidadão para Saúde (OCS [1]) publicou uma petição [2] com vista a demandar o direitos básico dos moçambicanos à saúde.

Até então, estavam proibidos de acessar os hospitais qualquer pessoa vestindo saia curta, calçado simples, calções, roupa de ginástica, com o torso nu, ou ainda, com o cabelo trançado em dreadlocks [3].

O OCS defendeu em pesquisa [4] que a proibição do acesso às unidades sanitárias em função da indumentária prevalecia, exibindo um claro acto de violação dos Direitos Humanos – em particular o direito à saúde – previstos [5] na Constituição da República e nos instrumentos internacionais de protecção dos Direitos Humanos como a Carta Africana [6] dos Direitos Humanos e dos Povos.

De acordo com o OCS, em Outubro de 2020, o Ministério da Saúde (MISAU), através da Direcção Nacional de Assistência Médica, emitiu uma circular que desencorajava [7] os profissionais de saúde a proibir o acesso do utente à Unidade Sanitária (US) em função da  roupa.

Contudo, apenas um ano depois, em Outubro de 2021 a medida entrou em acção e com a publicitação já nos hospitais. Assim, através da sua página no Twitter, o OCS tem divulgado os impactos do acto, que considera uma conquista importante sobretudo em tempos de pandemia:

Iva Mugalela, professora de dança, exultou na sua página Facebook, ao afirmar que a decisão já era sem tempo:

Foi muita luta, mas valeu a pena…Espero que se estenda para outras instituições….mas dreads mesmo???? Ihiiii distras… Clélia Francelina [13], sei que isto faz parte do teu trabalho, well done… Julio Messa [14], pronto, pelo menos já podes ir de shorts, sem stress (apesar de que, o melhor é não ter que ir, ntsem).
Andarei com esse panfleto na bolsa e uma foto aqui no cell…
Nilza Nhamachua chamou [15] mesmo atenção que a forma como os hospitais agem em Moçambique é resultado do que acontece no quotidiano. Ou seja, a partir de casa:
Alberto Correia Brown eu ate hoje luto no seio da minha familia para fazer entender que o facto de alguém ter Dreadlocks não lhe torna diferente na sua maneira de ser, estar e pensar na sociedade. Esse estigma não só parte da rua mas de casa mesmo. Ainda precisamos de descolonizar mentes.
Na mesma publicação, houve quem exigisse que se deve ir mais além na melhoria da provisão dos serviços de saúde no país, refere [16] Mendes Alfazema:
Também deve ser proibido que os profissionais de saúde façam perguntas desnecessárias para pacientes com necessidades urgente de atendimento….Passei muito mal, estava entre a vida e a morte e não queriam me atender antes de abrir processo.
A fundamentação em torno da proibição para que as pessoas pudessem aceder aos hospitais por uma norma da vestimenta não encontra nenhum fundamento legal formal ou devidamente escrito. Supõe-se, assim, que tenha sido uma decisão societária, baseada nos costumes e práticas locais.
Contudo, do estudo [4] mencionado pelo Observatório do Cidadão para Saúde não se consegue extrair dados ou números precisos de quantas pessoas tenham realmente sofrido os impactos da medida proibitiva. Assim, sendo esta uma decisão recente, espera-se analisar com maior vagar os resultados que a nova mudança trará nos tempos que seguem na forma como os serviços de saúde são oferecidos aos moçambicanos.