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Na Macedônia do Norte, ativistas de direitos animais são ameaçados por denunciar possível tráfico de filhote de leão

Categorias: Europa Oriental e Central, Kosovo, Macedônia, Ativismo Digital, Censorship, Direitos Humanos, Liberdade de Expressão, Meio Ambiente, Mídia Cidadã, Primeira Mão
[1]

Diversas fotos do filhote de leão “Simba” retiradas de redes sociais (e deletadas pelos donos após a revelação do anúncio). Foto da  Meta.mk (CC BY-NC 2.5 [2]).

Esta história é baseada na reportagem original [3] da agência de notícias Meta.mk. Devido a um acordo de intercâmbio de conteúdos entre a Global Voices e a Metamorphosis Foundation, aqui reproduzimos a sua versão editada.

Na Macedônia do Norte, uma denunciante e ativista de animais está sofrendo ameaças de morte após denunciar publicamente a circulação de uma série de fotos de um filhote de leão [4] nas redes sociais. Ela tem pedido às autoridades que atuem contra o tráfico animal.

Em seu perfil no Facebook, Tina Mickovska, que também trabalha como porta-voz do zoológico de Escópia, situado na capital do país, escreveu [5] que, embora tema por sua vida, não dará nenhum passo atrás em sua luta pela defesa dos animais.

Contudo, apesar dos inúmeros questionamentos a respeito da situação do filhote de leão, o Ministério do Interior continua sem dar nenhuma explicação sobre o caso do animal visto nas redes sociais em carros de luxo, vilas e hotéis [4]. De acordo com as leis locais, o Ministério do Interior deveria investigar como o animal entrou no país, quem o fotografou e quando, e quem publicou as fotos nas redes sociais.

Ostentação nas redes sociais revela atividade ilícita

Fotos e vídeos de homens, mulheres e crianças da Macedônia do Norte posando com o filhote de leão foram vistas com frequência nas redes sociais [6]em setembro de 2021.

Mickovska voltou a publicar alguns desses vídeos no Facebook e pediu aos usuários que marcassem as publicações em que o animal aparecesse, observando que o tráfico de animais silvestres é estritamente proibido na Macedônica do Norte.

Ela também informou que as leis locais e europeias incluem rigorosas sanções e sentenças de vários anos de prisão para quem traficar animais silvestres.

„Повеќе познати скопски фаци, меѓу кои и сопственик на луксузен хотел во Скопје се сликале со лавчe. Лавчиња очигледно има и во Куманово, не е само едно.

Algumas personalidades locais da Escópia tiraram fotos com um filhote de leão, inclusive o dono de um hotel de luxo da cidade. É óbvio que existem outros filhotes de leão em Kumanovo, este não é o único.

O jornal Sloboden pečat publicou [7] denúncias de fontes anônimas de que outros filhotes foram comercializados em semanas anteriores.

A investigação da Meta.mk nas redes sociais identificou o dono de um perfil bastante popular no TikTok, que se exibia com o pequeno filhote em seus vídeos, apresentando-o como “Simba”. Quando foi contatado por jornalistas da Meta.mk, ele negou que o filhote presente em seus os vídeos havia estado em território macedônio.

Јас лавчето го видов во Косово во Гњилане во ресторанот „Маја е зез“ каде што има уште еден голем лав. Сопственикот на ресторанот ми го даде да го повозам.

Vi o filhote de leão em Kosovo, em Gnjilane [8], no complexo turístico Maja e Zezë, onde há outro leão, adulto. O dono do restaurante me deixou levar o filhote para dar uma volta.

No entanto, em uma conversa telefônica com a Meta.mk, os funcionários do complexo de Kosovo desmentiram a afirmação de que lá haveria um filhote de leão.

“Continuamos cuidando do leão adulto que temos há anos [9] e assim será até encontrarmos a melhor solução, mas não temos nenhum filhote de leão aqui”, afirmaram os trabalhadores do complexo Maja e Zezë Resort.

No dia 26 de setembro, uma mulher de Kumanovo [10]­ — cidade ao norte do país —, que informou em seu perfil do Facebook que trabalha no Ministério da Cultura, publicou fotos em que aparece carregando e acariciando um filhote de leão. As fotos, que também mostram crianças, foram eliminadas da rede pouco antes da publicação do artigo da Meta.mk.

Os proprietários de perfis que mostravam fotos semelhantes também eliminaram essas fotos ou mudaram suas contas do Instagram, Facebook ou TikTok para privadas assim que o escândalo veio à tona. A Anima Mundi, associação de direitos dos animais, publicou cópias anonimizadas de algumas imagens [11] em sua página no Facebook com o intuito criar conscientização.

Problemas fronteiriços nos Balcãs

O tráfico de animais silvestres não é um problema novo para as instituições da Macedônia do Norte.

Em resposta às indagações da Meta.mk, a Administração Aduaneira afirma que funcionários da alfândega têm incessantemente impedido o tráfico de animais exóticos, apreendendo-os quando estes são transportados ilegalmente para a Macedônia do Norte. Os autores desses crimes foram denunciados e os animais foram acomodados em um zoológico onde recebem os cuidados adequados.

Os funcionários explicam que o procedimento de importação desse tipo de animal exótico não é tão simples: é necessário ter uma licença de importação de animais e plantas ameaçadas de extinção (CITES) emitida pelo Ministério do Meio Ambiente e Planejamento Físico, e a aprovação de um inspetor veterinário na fronteira.

Um caso famoso de tráfico de animais na região é o do leão Johny, que foi contrabandeado da Albânia para Kosovo em 2019, e continua enjaulado no complexo Maja e Zezë [12]. Em fevereiro de 2020, a relatora da Comissão de Assuntos Externos de Kosovo, Viola von Cramon, pediu que o animal fosse trasladado do complexo Maja e Zezë o mais rápido possível.

Animais silvestres não devem ser mantidos em jaulas nem sob cuidados particulares. É contra a sua natureza e dificilmente conseguem cumprir os critérios de bem-estar animal. Manter um leão ilegalmente em uma jaula é muito cruel e totalmente ultrapassado. Insto aos ministros, senhores Muharrem Nitaj e Blendi Kosi, que cheguem a um acordo definitivo e apropriado para transferir o leão de Kosovo para a Albânia, e logo para um santuário da Vier Pfoten. 

 ————–                                                                                                                                                                                                                         

Em Kosovo, um leão foi mantido ilegalmente em uma pequena jaula. A Vier Pfoten providenciou o traslado do animal a um santuário, porém, os ministérios de Kosovo e da Albânia não autorizaram o seu transporte. Insisto que os ministérios ajam imediatamente! Minhas declarações completas aqui,

Segredo público na Macedônia Norte

Depois de analisar as fotos das redes sociais, a Inspetoria Estadual do Meio Ambiente [19] fiscalizou no dia 1º de outubro o hotel cinco estrelas localizado em Escópia — o Hotel Park —, em busca de Simba, o filhote de leão. Em declarações [20] à Meta.mk, o inspetor Pejo Kirovsk, que comandou a investigação, informou que o filhote não estava lá.

Увидот само што заврши и можам да ви кажам дека по деталната инспекција увидовме дека во просториите на објектот на хотелот нема лавче. Инспекцијата во овој објект беше одредена бидејќи имавме дојави дека лавчето е забележано на фотографии направени тука.

Acabamos de concluir uma exaustiva inspeção e atestamos que não há nenhum filhote de leão nas instalações do hotel. A intervenção foi feita com base nas denúncias das fotos em que o filhote aparecia, fotos essas que supostamente foram feitas aqui.

[21]

Anúncio classificado [22] de oferta de um filhote de lobo selvagem de três meses, em Escópia. Captura de tela do site Pazar3.mk.

Enquanto isso, a Anima Mundi [23] exigiu que as autoridades atuassem urgentemente e que informassem à população quem são os responsáveis por permitir a entrada de filhotes de leão na Macedônia do Norte.

Em declarações à Rádio Free Europe, a ativista de direitos animais Radmila Peševa destacou [24], ainda, que restaurantes fora de Escópia também mantêm em cativeiro outros animais silvestres, incluindo águias, falcões, gorilas e ursos, como atração turística.

E mais, existem anúncios de pessoas que vendem este tipo de animais na internet.

Até o dia 3 de outubro, as autoridades competentes — incluindo o Ministério do Interior, a Administração Aduaneira e a Inspetoria de Proteção Ambiental do Estado —, não haviam respondido aos questionamentos da Meta.mk sobre como o filhote de leão entrou no país.