- Global Voices em Português - https://pt.globalvoices.org -

Comunidade de Trindade diz “não” a operador de pedreira que se dirige à última bacia virgem da região

Categorias: Caribe, Trindade e Tobago, Meio Ambiente, Mídia Cidadã

Presidente do Comitê de Ação Dinâmica do Povo Acono (AVDAC), Simeón Nakhid, e Kelvin Nakhid, vice-presidente do Comitê de Ação do Vale de Maracas (MVAC), observam os efeitos da exploração de pedreiras na região do Vale de Maracas. Foto de Zico Cozier, utilizada com autorização.

Este artigo é de Giselle Permell e foi publicado originalmente em Cari-Bois News [1]. Uma versão editada é reproduzida aqui como parte de um acordo de compartilhamento de conteúdo com a Global Voices.

A frustração é grande no povoado de Acono, onde os habitantes dizem ter esgotado quase todos os meios possíveis na tentativa de impedir que um novo operador de pedreira entre no Vale de Maracas, ao longo do corredor Leste-Oeste de Trindade.

É a terceira vez que a comunidade, que há 70 anos lida com os efeitos ambientais adversos da exploração de pedreiras, teve de se opor às tentativas [2] da Blue Diamond Quarries Ltd. (BDQL) em explorar a pedreira azul (BDQL) para extrair calcário azul na última bacia hidrográfica virgem do vale.

Simeon Nakhid, vice-presidente do Comitê de Ação Dinâmica do Povo Acono (AVDAC), disse à Cari-Bois News que os habitantes não recuarão até que o operador volte atrás.

The bottom line is, we don’t want any new quarry in the Maracas Valley.

Resumidamente, não queremos nenhuma outra pedreira no Vale de Maracas.

Nakhid explicou que a região já sofre com escassez de água e há o temor de que uma nova pedreira possa agravar ainda mais a situação.

A BDQL está realizando um Estudo de Impacto Ambiental [3] (EIA) para conseguir as autorizações necessárias da Autoridade de Gestão Ambiental [4] (EMA) para explorar a mina na bacia hidrográfica de La Caurita, no Vale de Maracas.

A empresa nos enviou um comunicado no qual afirmava que “busca desenvolver a
região” por seu “potencial de desenvolvimento econômico”:

Being in a global pandemic and with many countries pursuing opportunities for its citizens and economy, this is a direct local and foreign investment for both country and community.

One of the goals of BDQL is to be certified in LEED, ISO 9001, ISO 45001 and ISO 14001 in order to maintain global standards and to ensure all concerns of stakeholders are met. We intend to work alongside the community to develop the area and to ensure they benefit from this undertaking. We will create jobs for members of the community and upkeep the area as we operate.

Por estar em uma pandemia e muitos países buscarem oportunidades para seus cidadãos e sua economia, este é um investimento direto local e estrangeiro para o país e para a comunidade.

Um dos objetivos da BDQL é obter a certificação LEED, ISO 9001, ISO 45001 e ISO 14001 para manter os padrões globais e garantir que todas as preocupações das partes interessadas sejam atendidas. Planejamos trabalhar junto com a comunidade para desenvolver a região e garantir que ela se beneficie dessa empreitada. Criaremos empregos para os membros da comunidade e manteremos a região durante a operação.

No entanto, o local proposto fica do outro lado do topo de uma montanha de outra pedreira, operada pelo Grupo de Empresas da Coosal. Nakhid citou a experiência da comunidade com a pedreira existente como uma razão para se opor a uma nova pedreira no vale:

I’ve seen how the natural environment in Acono has changed over the years because of quarrying and the community has had enough.

Vi como o ambiente natural de Acono mudou ao longo dos anos devido às pedreiras, e a comunidade está farta.

Uma empresa chamada Kairi Consultants Ltd. foi contratada para que a comunidade participasse nas consultas como parte dos requisitos para o EIA, que incluiu uma reunião de campo realizada no dia 19 de dezembro de 2020. O consenso entre os participantes foi “Não à nova pedreira”:

Apesar da oposição, a BDQL afirmou ter recebido “comentários construtivos e preocupações da comunidade e [tem] o apoio da maioria dos habitantes”.

Quando entramos em contato com vários vizinhos de Acono, muitos, como a aposentada Julie Reyes De Matas, apontaram para o estado “desagradável” do rio Acono. Outros, como o analista de sistemas Ray Francis, deram uma perspectiva mais matizada:

On one hand, you need the quarry stone for buildings and construction, but then you have a community that feels you don’t care about them 'cause you won’t try to fix up the place after you get what you want.

Por um lado, você precisa da pedra da pedreira para os prédios e a construção, mas então você tem uma comunidade que sente que você não se importa com eles porque não tenta consertar o lugar depois de conseguir o que deseja.

O AVDAC escreveu à EMA no dia 14 de janeiro de 2020, detalhando os principais problemas que a comunidade teve com a pedreira proposta, incluindo:

The Acono River, the main drainage for the watershed that Coosal’s quarry occupies, is destroyed—muddy, dry and lifeless. It is so unfit for human use that it was diverted away from WASA’s [the Water and Sewerage Authority] intake.

O rio Acono, principal drenagem da bacia que ocupa a pedreira de Coosal, está destruído: turvo, seco e sem vida. É tão impróprio para uso humano que foi desviado da entrada da WASA [a Autoridade de Água e Esgoto].

Simeon Nakhid mostra o estado do rio Acono. Foto de Zico Cozier, utilizada com autorização.

A carta afirma ainda que agora a comunidade conta apenas com o rio Caurita como a única fonte de água confiável, que flui da bacia de La Caurita, onde a Blue Diamond Quarries espera estabelecer suas operações.

A pedreira proposta estaria no centro das rotas de excursão até os petróglifos de Caurita [5], o maior local de arte rupestre documentado em Trindade, descrito pelo National Trust do país como “um importante local espiritual para os primeiros povos ou ameríndios de Trindade”. A Comunidade dos Primeiros Povos de Santa Rosa [6] dá um significado espiritual especial a este lugar e à região circundante.

Outras causas de preocupação são a destruição de estradas e pontes de acesso à comunidade, que não conseguem suportar maquinários pesados, o escoamento que pioraria a situação do rio e aumentaria a probabilidade de inundações, e a perturbação a vida e segurança dos moradores, muitos dos quais vivem em casas próximas à beira da estrada, que não resistiriam às fortes explosões a uma distância tão curta.

O Comitê de Ação do Vale de Maracas [7] (MVAC) também se manifestou contra, liderando os apelos para que se faça um acompanhamento e haja colaboração com outros grupos da comunidade.

Em 2016, ambas as organizações se opuseram à tentativa da Blue Diamond Quarries de explorar o vale. Simeon Nakhid, disse que agora está preocupado com o fato de que, mesmo juntos, o ADVAC e MVAC não serão suficientemente poderosos para deter a pedreira desta vez. Ele não acredita que possa haver um acordo e sugeriu que a comunidade pode não ter escolha a não ser tomar medidas drásticas, como bloquear o acesso.

Esse seria o último recurso. Em vez disso, estão estudando todas as opções disponíveis. A carta que seu grupo enviou à EMA destacou a existência de 15 anos de resistência à pedreira proposta e pediu a todos os interessados que abordem os problemas que já assolam a comunidade como consequência da exploração da pedreira.

Instead of facilitating any new attempts to exploit the valley, we urge the EMA and all other stakeholders to focus on improving and rehabilitating the environment […] through the restoration of the water courses available to us by damming the Concorde River upstream of Coosal’s and making it available to the Acono Water Works; by mandating ecologically appropriate rehabilitation of quarry lands to increase the resilience of the watershed; and by listening to the community when we say NO.

Em vez de facilitar qualquer outra tentativa de explorar o vale, apelamos à EMA e a todos as demais partes interessadas que foquem em melhorar e reabilitar o meio ambiente […] mediante a restauração dos cursos de água disponíveis para nós, represem o rio Concorde acima do Coosal para colocá-lo à disposição da obra hidráulica do Acono, que ordenem uma reabilitação ecologicamente adequada dos terrenos das pedreiras para aumentar a capacidade de recuperação da bacia, e que escutem a comunidade quando dizemos NÃO.

Cópias da carta foram enviadas ao ministro de Minas e Energia, Franklin Khan, ao ministro de Obras e Transportes, Rohan Sinanan, ao deputado de Tunapuna, Esmond Forde, à Autoridade de Águas e Esgotos (WASA) e à Kairi Consultants Ltd., que respondeu:

We are conducting a neutral study. So we get information from the community as well as government agencies on the issue and we use that information to make our assessment.

Estamos realizando um estudo neutro. Por isso obtemos informações da comunidade e de agências governamentais sobre o assunto e usamos essas informações para fazer nossa avaliação.

A BDQL afirma que, nesta fase, “está apenas realizando a avaliação de impacto ambiental necessária para solicitar a aprovação da EMA”:

This will then feed into how we set up operations in a conscious manner while accounting for the needs of the communities. Lessons have been learnt from past operations and the concerns of the community are being addressed in our plans. These plans are dynamic and are being guided by the social and environmental assessments.

Isso nos ajudará a estabelecer as operações de forma consciente, ao mesmo tempo em que consideramos as necessidades das comunidades. As lições aprendidas com as operações anteriores e as preocupações da comunidade são levadas em consideração em nossos planos. Os planos são dinâmicos e conduzidos por avaliações socioambientais.

Enquanto isso, a comunidade espera saber se está realmente sendo ouvida e se suas preocupações serão atendidas.