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Campanha de desinformação se intensifica com chegada de refugiados afegãos à Macedônia do Norte

Categorias: Direitos Humanos, Guerra & Conflito, Mídia Cidadã, Migração e Imigração, Política, Religião
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Refugiados do Afeganistão chegando ao Aeroporto Internacional da Escópia na noite de 30 de agosto de 2021. Foto: Meta.mk, usada com permissão.

Esta história é baseada na cobertura [2] original [3] do Meta.mk. Uma versão editada é republicada aqui sob um acordo de compartilhamento de conteúdo entre a Global Voices e a Metamorphosis Foundation.

O primeiro grupo com 149 afegãos, que saiu de Tiblíssi, na Geórgia, chegou no Aeroporto Internacional da Escópia no final da noite de 30 de agosto. Imediatamente após a aterrisagem do avião, os veículos de emergência médica transportaram uma mulher grávida, seu marido e seu filho à clínica ginecológica da Escópia, enquanto outra pessoa, que havia desmaiado, também foi levada ao hospital.

Os afegãos que saíram de Cabul foram recebidos pelo governo da República da Macedônia do Norte e pela sociedade civil local, com alguns expressando solidariedade e empatia [4]. Contudo, desde a tomada do poder pelo Talibã [5], partidos políticos de extrema direita e a mídia afiliada intensificaram a campanha xenofóbica contra a ajuda aos refugiados.

Após a chegada dos atuais refugiados à Escópia, o ministro das Relações Exteriores, Bujar Osmani, afirmou que eles incluem representantes da Open Government Partnership – OGP [6] (Parceria para Governo Aberto), uma rede internacional de boa governança, bem como funcionários de outras organizações internacionais ou não governamentais, acompanhados de seus cônjuges e filhos. Ele disse:

Со овие луѓе делиме заеднички вредности за слобода, за демократија, за мир и за еднаквост. За жал, не по нивна волја, на овие луѓе денес, но и на нивните семејства им е загрозена безбедноста, загрозени им се нивните животи, и затоа ние одлучивме да им помогнеме сега, денес, веднаш – т.е. кога им е најмногу потребно.

Nós compartilhamos os valores comuns de liberdade, democracia, paz e igualdade com essas pessoas. Infelizmente, e sem ter nenhuma culpa, a segurança deles e de suas famílias foi ameaçada, suas vidas estão em perigo. Por isso decidimos ajudá-los agora, hoje, imediatamente, no momento em que mais precisam.

A situação dos refugiados perseguidos por campanhas políticas

Acolher a última onda de refugiados na Macedônia do Norte tem sido um assunto de debate público por várias semanas. Incluindo a questão das despesas de estadia, que foi resolvida depois que ficou claro que os Estados Unidos e doadores privados as cobririam.

Os perfis das pessoas que chegam também são conhecidos, o primeiro-ministro Zoran Zaev afirma que serão “pacificadores, ativistas de direitos humanos, mulheres, crianças, pessoas que trabalham em questões de democracia e para auxílio às nossas forças armadas”, visto que o exército da República da Macedônia do Norte também fez parte das forças de coalizão da OTAN no Afeganistão por duas décadas.

Partidos de direita, em particular a oposição VMRO-DPMNE, membro do Partido Popular Europeu, se opuseram à operação de ajuda, embora no passado tenham se orgulhado da participação militar do país na missão do Afeganistão (quando estavam no poder). 

Comportamento semelhante também foi observado em grupos de direita na vizinha Sérvia, cujas instituições políticas e de mídia têm influência significativa nos Balcãs Ocidentais.

Não sei o quanto alguém precisa odiar os Estados Unidos para expressar simpatia pelo sucesso do Talibã, mas é óbvio que na Sérvia muitos chegaram a esse nível.

Depois que a Macedônia do Norte, juntamente com a Albânia e o Kosovo, anunciou [8] a disposição para aceitar refugiados afegãos, um nítido aumento nas tentativas de manipular as populações locais e incitar o rancor foi observado.

Os nacionalistas macedônios foram da questão do número dos refugiados [9] para a propagação de desinformação sobre o momento [10] e a natureza de sua permanência [11]. Isso incluiu reviver velhas teorias de conspiração propagadas pelo ex-primeiro-ministro foragido Nikola Gruevski sobre a substituição da população macedônia por uma “invasão” de imigrantes muçulmanos. Os propagandistas também ressuscitaram um velho medo sobre o gênero [12] dos refugiados, com falsas alegações de que apenas homens em idade de combate estariam vindo para formar células terroristas adormecidas. Um equívoco muito comum que representa erroneamente as vítimas do Talibã como uma tropa desenvolvida de seus opressores [13].

Enquanto os exércitos de trolls [14] amplificavam essas mensagens islamofóbicas por meio das redes sociais, também havia muitas pessoas que se opunham à onda de promoção ao ódio que incita o pânico e à desinformação que explorava a situação dos refugiados.

A especialista em direitos humanos, Mirjana Najchevska, comentou:

Aqueles que agora fogem do Afeganistão não são ladrões, violadores ou fanáticos religiosos. Aqueles que fogem são intelectuais, pensadores livres e pessoas emancipadas. Parece que esse tipo de pessoa é assustadora para alguns na Macedônia.

Mais desinformação, “fabricada nos EUA”

A chegada de refugiados afegãos à Macedônia do Norte também foi precedida por desinformação vinda dos Estados Unidos, armada para minar o atual governo diante do público americano.

Um desses dados de desinformação se tornou viral: o comentarista político conservador, teórico da conspiração, apresentador de rádio e produtor de televisão norte-americano Glenn Beck [16] publicou um tuíte contendo um trecho de sua entrevista com o senador do Arkansas, Tom Cotton, apresentando uma falsa alegação de que o governo dos EUA pediu aos seus aliados macedônios a não aceitarem refugiados.

Ouvi relatos de que o NOSSO Departamento de Estado disse à Macedônia para parar de aceitar refugiados afegãos. @SenTomCotton [17] me disse que ouviu relatos semelhantes. Se nosso governo não salvar essas pessoas, NÓS SALVAREMOS. Mas o Departamento de Estado deve parar de atrapalhar.

No vídeo Beck diz que “eles (é incerto quem são “eles”) estão procurando lugares para levar as pessoas e abrigá-las, a Macedônia era um desses lugares e nossa embaixadora… ou embaixador da Macedônia foi chamado pelo Departamento de Estado e instruído a não levar nenhuma dessas pessoas”.

O serviço de verificação de fatos Truthmeter desmascarou essas afirmações [20]. Seus jornalistas contataram o governo da Macedônia do Norte e o Ministério das Relações Exteriores, perguntando se é verdade que receberam esse tipo de solicitação das autoridades norte-americanas. A resposta deixou claro que as afirmações do tuíte e do trecho do vídeo são falsas:

This is not true. The government has approved accepting 780 Afghan citizens in order to save their lives. The complete humanitarian mission by the Government is implemented in complete cooperation with the United States.

Isso não é verdade. O governo aprovou o acolhimento de 780 cidadãos afegãos para salvar suas vidas. A missão humanitária completa do governo é implementada em total cooperação com os Estados Unidos.

Ao contrário das afirmações de Beck, o primeiro-ministro Zoran Zaev, no mesmo dia (26 de agosto de 2021), apenas algumas horas antes da publicação do tuíte, reiterou sua política de receber refugiados afegãos:

If we save only one person, I think we are saving the world. We are providing solidarity, we called and offered together with our strategic partners as a country, in accordance to our capabilities and capacities, to share this responsibility, promote principles and values with the democratic world, when it comes to accepting people from Afghanistan under threat of losing their lives.

Se salvarmos apenas uma pessoa, acredito que estamos salvando o mundo. Somos solidários, convocamos e oferecemos junto aos nossos parceiros estratégicos como um país, de acordo com as nossas capacidades de dividir essa responsabilidade, a promoção dos princípios e valores do mundo democrático, no que diz respeito ao acolhimento de afegãos ameaçados de perder a vida.

Glen Beck, durante sua carreira como comentarista e personalidade da mídia, promoveu diversas teorias da conspiração sobre os liberais norte-americanos, do ex-presidente Barack Obama [21] ao filantropo George Soros [22], e até mesmo alegando falsamente que o sobrevivente do holocausto Soros, quando menino ajudou [23] a “enviar judeus para os campos de extermínio”. Embora Beck tenha se desculpado por essas afirmações, alguns consideraram que foi tarde demais [21].

“Levando todos esses argumentos em consideração, estamos classificando esta afirmação do comentarista conservador Glenn Beck, declarada em sua rede de mídia The Blaze, como falsa”, escreveu Truthmeter.mk [20].