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Operação caranguejo: Angola debate-se com graves actos de corrupção política

Categorias: Mídia Cidadã

Corrupção em Angola – YouTube [1]: Televisão Pública de Angola, captura de ecrã 9 de Junho de 2021

No dia 31 de Maio, os Angolanos foram surpreendidos com um caso de corrupção que marca o debate [2] sobre o enriquecimento sem justificativa no país. Em 2020, uma série de reportagens da Televisão Pública de Angola (TPA), designadas [3] “O Banquete”, expuseram supostas acções corruptas de figuras da política angolana.

O foco das reportagens é o Major do exército Pedro Lussaty [4], até então um desconhecido do público, ligado à Casa de Segurança do Presidente da República angolana.

Em Maio de 2021, Lussaty foi detido pela Procuradoria-Geral da República (PGR) angolana. A sua detenção faz parte do que a polícia designou “Operação Caranguejo [5]“, numa acção liderada pelos Serviços de Informação e Segurança do Estado (SINSE) e Serviço de Investigação Criminal (SIC).

Corrupção em Angola – YouTube [1]: Televisão Pública de Angola, captura de ecrã 9 de Junho de 2021

Do que se viu na reportagem, sabe-se que o Major Pedro Lussaty possui [1] apartamentos, residências e diversas malas contendo  milhões de dólares e kwanzas (moeda de Angola). Como descreveu  a TPA:

Só em kwanzas, o suposto milionário tinha no apartamento 800 milhões de kwanzas. O País têm 30 milhões de habitantes e, com 800 milhões de kwanzas dava para pagar quase um salário mínimo à todos os angolanos.

O milionário revelou na mesma reportagem [1] que desconhecia o valor exacto do dinheiro em sua posse. “Eu só tirava [dinheiro]”, revelou. A reportagem da TPA afirma que Lussaty possuía mais dinheiro [6] do que o jogador de futebol português Cristiano Ronaldo, um dos maiores jogadores do planeta.

Quem é Pedro Lussaty?

Natural do Lubango, província da Huíla, sabe-se que ingressou nas Forças Armadas Angolanas (FAA) em 1997.

Lussaty é licenciado em informática, tendo trabalhado até 2019 na Casa de Segurança do Presidente da República, como auxiliar da secretária geral.

Deixou de exercer as suas funções quando o actual Presidente de Angola, João Lourenço, eleito [7] em Agosto de 2017 pelo actual partido no poder, MPLA, exonerou-lhe do cargo, alegadamente como forma de evitar que casos de corrupção continuassem naquela instituição.

Reacção dos Angolanos

Desde que o caso foi noticiado, angolanos foram às redes sociais manifestar sua indignação.  O país vive uma grande crise dos preços de alimentos nos centros urbanos, por conta de uma alta na inflação, com destaque para as províncias do Sul do país. Esse é o caso das províncias do Cunene e Huíla, assim como a capital do país Luanda, onde há famílias em situação de extrema pobreza.

Tal fez com que o jornalista Nok Nogueira apelasse que os angolanos deixassem o caso com a Justiça, por forma a olharem o que realmente se passa em Angola, como referiu [8] no seu Facebook:

Deixem o caso Lussaty com a justiça. Desliguem ainda os televisores e perguntem-se como vai o País real, aquele que esta para além da encenação.

Enquanto isso, a internauta Tânia Campos escreveu no seu perfil do Facebook [9] que se o caso tivesse acontecido no Brasil, já teria levado todos os angolanos para actos de manifestação pública, sobretudo para exigir a saída do partido no poder.

Um acontecimento como o caso Lussaty em rede pública, em outro País, por exemplo, no Brasil, estaríamos todos na rua a exigir a queda do MPLA.

Houve ainda quem visse no caso do Major Lussaty apenas um exemplo do que sucede em vários outros casos em Angola:

O mesmo pensamento é partilhado por demais usuários que comentaram sobre o caso:

Corrupção em Angola

O Índice de Percepção da Corrupção de 2020, divulgado [12] pela Transparência Internacional (TI), revela que Angola continua no grupo dos países com maior percepção da corrupção. O país ficou na 142 posição, com 27 pontos, em 100.

Importa destacar que os actos de corrupção não datam de época recente. De facto, durante a anterior governação, liderada por José Eduardo dos Santos por mais de 30 anos, Angola foi vista [13] como um país onde os políticos próximos ao poder sempre enriqueceram de forma ilícita.

Um exemplo é Isabel dos Santos, filha [14] do então Presidente, acusada [15] de várias acções de corrupção que envolvem não só o seu pai, mas  actores do partido que governa o país desde a independência.

Numa série de reportagens  denominada ‘Luanda Leaks [16]‘, publicada [17]s em 2020 pelo Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação (ICIJ), foram revelados vários exemplos de como as empresas públicas de Angola foram usadas para benefícios individuais durante duas décadas da gestão de dos Santos.

Na sequência das reportagens e da detenção de Lussaty pela “Operação Caranguejo”, o actual Presidente da República, João Lourenço, exonerou [18] o chefe da Casa de Segurança, Pedro Sebastião, como supostamente um dos envolvidos no escândalo.

Não se pode afirmar com certeza que João Lourenço será de facto diferente do anterior Presidente, se tivermos em conta que ele ocupava o cargo de Vice-Presidente quando muitos casos de corrupção aconteceram no país.

Os próprios Angolanos não acreditam [19] que a corrupção terminará, tal como foi noticiado em 2020 pelo veículo  de notícias Deutsche Welle (DW). ‘’O combate à corrupção e à impunidade ainda não tem impacto na vida dos moradores de zonas mais pobres, que pedem soluções concretas a problemas crónicos’’, analisou a DW, após conversar com moradores de Luanda.