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Portal de internet do Camboja poderia intensificar vigilância e censura

Categorias: Leste da Ásia, Camboja, Direitos Humanos, Economia e Negócios, Governança, Lei, Liberdade de Expressão, Mídia Cidadã, GV Advocacy
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Uma sala de computadores em comunidade no Camboja. Foto por PANHA KiM (KiM MeY), upload de Panoramio na Wikipedia. (licença Creative Commons Attribution-Share Alike 3.0 Unported [2]).

O subdecreto do Camboja sobre a criação do Portal Nacional de internet (Subdecreto PNI) foi assinado [3] pelo primeiro-ministro Hun Sen em 16 de fevereiro, em meio a preocupações expressadas por diversos envolvidos sobre seus potenciais impactos negativos no comércio eletrônico e nos direitos humanos.

Uma primeira versão do subdecreto foi feita em julho de 2020 e discutida com operadores de telecomunicações em agosto. A proposta era o redirecionamento do tráfego de internet para um único portal a fim de facilitar a coleta de receitas e aprimorar os serviços. Em dezembro de 2020, a Coalizão de Internet da Ásia expressou [4] preocupação de que algumas cláusulas do subdecreto poderiam ser usadas para bloquear automaticamente conteúdo on-line.

Quarenta e cinco grupos da sociedade civil publicaram um abaixo-assinado, após a emissão do subdecreto, alertando [5] que tal diretriz poderia levar à intensificação da vigilância e violação de privacidade. Eles citaram o Artigo 6 do subdecreto PNI, que autoriza o bloqueio de conexões ou conteúdo on-line considerados ameaças “à segurança, receitas nacionais, ordem social, dignidade, cultura, tradições e costumes”. O documento afirma que:

…government surveillance cultivates an environment of fear, creating incentives for self-censorship and directly undermining the ability of journalists and human rights defenders to undertake their work.

This highly subjective and undefined list of reasons for censoring content gives the RGC [Royal Government of Cambodia] broad powers to police and censor online content, with the NIG providing unfettered access to and control over all data exchanges in the country.

… a vigilância governamental cultiva um ambiente de medo, criando incentivo para autocensura e diretamente prejudicando a capacidade de jornalistas e defensores dos direitos humanos realizarem seu trabalho. Essa lista indefinida e altamente subjetiva de razões para censurar conteúdo dá ao GRC (Governo Real do Camboja) amplos poderes para policiar e censurar conteúdo on-line, com o PNI fornecendo livre acesso e controle sobre toda a troca de informações no país.

Vários grupos também estão preocupados com o impacto do subdecreto no comércio eletrônico, devido às regulamentações adicionais impostas às empresas de tecnologia.

We are concerned that this sub-decree will become an obstacle for technology companies and become a reason for investors to not invest in, or even leave, Cambodia’s online sector.

Estamos preocupados com a possibilidade de este subdecreto se tornar um obstáculo para as empresas de tecnologia e uma razão para investidores deixarem de investir ou até saírem do setor on-line do Camboja.

Chak Sopheap, diretor executivo do Centro do Camboja para os Direitos Humanos, destacou que [6] a diretiva foi aprovada em um momento no qual o governo está sendo acusado de silenciar [7] críticos on-line e perseguir líderes da oposição.

O momento da aprovação desse PNI é particularmente preocupante porque nos últimos anos vimos um grande aumento no número de cidadãos sendo ameaçados, assediados e até perseguidos pelo uso da internet e por exercerem seu direito ao discurso livre nas plataformas on-line.

A Human Rights Watch associou [10] o subdecreto às políticas draconianas impostas pelo governo Hun Sen durante a pandemia:

Cambodia’s National Internet Gateway is the missing tool in the government’s toolbox for online repression. It’s no coincidence that after shutting down critical media across the country, the Hun Sen government has now turned its attention to online critics, just in time for the nationally organized commune elections due in 2022.

O Portal Nacional de Internet do Camboja é a ferramenta que faltava entre os instrumentos de repressão on-line do governo. Não é coincidência que, após calar a mídia crítica em todo o país, o governo Hun Sen agora voltou sua atenção para os críticos on-line, a tempo das eleições nacionais comunitárias, previstas para 2022.

O Ministério dos Correios e Telecomunicações insistiu [11] que o subdecreto era necessário para domar o cenário “desordenado [12]” da internet no país. Também classificou as declarações dos grupos de direitos humanos como “infundadas, politicamente motivadas, falsas e contrárias aos objetivos do subdecreto.”

O Ministério também negou que o governo estava tentando instalar um firewall de internet similar ao da China, ou que iria coletar arbitrariamente os dados pessoais de usuários. Ao contrário, o Ministério acrescentou que o subdecreto iria beneficiar [13] os cambojanos:

It will also help prevent illegal cross-border network links, including online gambling, cyber threats, pornography and online fraud.

Também vai ajudar a prevenir ligações com redes estrangeiras ilegais, incluindo jogos on-line, ameaças cibernéticas, pornografia e fraude on-line.

O Camboja tinha 14,8 milhões de usuários de internet móvel em maio de 2020, de acordo [14]com um relatório do Regulador de Telecomunicações do país.

Em maio de 2018, o governo do Camboja adotou [15] a Prakas (proclamação) Interministerial que regulamenta o Controle de Websites e Redes Sociais e expandiu a vigilância na internet, ordenando que diversas agências governamentais bloqueassem websites que hospedassem conteúdo considerado como “incitamento, quebra de solidariedade, discriminação e desordem intencional que comprometa a segurança nacional, interesse público e ordem social”.