Há pouco tempo, foi lançado nas plataformas de streaming um documentário que explora as vidas da multifacetada cultura LGBTQ+ do Japão. Queer Japan, documentário do cineasta, escritor e designer canadense Graham Kolbeins, acompanha as vidas de artistas, ativistas, pioneiros e cidadãos comuns da cultura LGBTQ+ japonesa.
“Queer Japan é sobre amor-próprio, comunidade e resiliência”, nos conta o diretor Graham Kolbeins em uma entrevista para a Global Voices. “É sobre a natureza ambígua de gênero e sexualidade, e sobre como a linguagem molda de maneira fluida a nossa compreensão desses conceitos.”
O documentário foi exibido pela primeira vez em julho de 2019 e posteriormente apresentado em festivais de cinema pelo mundo. Queer Japan conta com entrevistas com mais de 30 membros da comunidade LGBTQ+ do Japão.
O filme apresenta uma variedade de indivíduos envolvidos com arte, ativismo, vida noturna e política no Japão, incluindo um instrutor universitário, um dentista, uma drag queen (e as festas que ela oferece à comunidade LGBTQ+), além da primeira autoridade abertamente transgênero a ser eleita no país, Aya Kamikawa, e o artista visual queer, Nogi Sumiko.
Queer Japan também inclui entrevistas com Gengoroh Tagame, criador de mangás homoeróticos, famoso no Japão e no mundo todo.
“Gengoroh Tagame não é um mestre apenas na arte homoerótica; ele também é responsável pelo renascimento do mangá gay através de uma revista cofundada por ele, a G-men (uma influente revista destinada aos homens gays do Japão)“, conta Kolbeins. “A influência e as referências de Tagame são ecléticas, indo do Marquês de Sade a Go Mishima e Tom of Finland.”
O documentário também apresenta outro cofundador da G-men, o escritor, editor e ativista Hiroshi Hasegawa. Desde que Hasegawa foi diagnosticado como HIV positivo em 1992, ele tem lutado por outros tratamentos — e de melhor qualidade — para a doença no Japão. Hasegawa também desempenhou um papel fundamental na campanha para reduzir o estigma social sobre as pessoas que convivem com HIV e AIDS.
Kolbeins diz que a gênese do que se tornaria o documentário Queer Japan vem de quase uma década atrás e de seu amor pelos mangás japoneses.
“Eu era um grande fã do gênero mangás gays e ficava perplexo ao ver que nenhuma editora na América do Norte se interessava em publicar uma versão em inglês do trabalho desses artistas”, Kolbeins conta. “Na época, eu escrevia para revistas de arte e cultura e decidi conduzir algumas entrevistas para dar destaque aos artistas de mangás gays.”
Embora não haja leis que proíbam relações sexuais consensuais entre adultos, não há leis no Japão que abordem ou proíbam a discriminação contra orientação sexual ou identidade de gênero no ambiente de trabalho, e o casamento entre pessoas do mesmo sexo ainda não foi formalmente legalizado.
Kolbeins conta que decidiu contatar a escritora e tradutora Anne Ishii, atualmente diretora-executiva da Asian Arts Initiative na Filadélfia.
“Começamos a trabalhar por volta de 2012, quando viajamos para Tóquio para trabalhar em uma antologia que estávamos editando juntos, Massive: Gay Erotic Manga and the Men Who Make It“, Kolbeins diz. “Logo depois, fundamos uma marca de moda e editoria chamada Massive Goods (marca de moda, editoria e agência criativa que representa artistas queer e feministas do Japão), dando sequência à nossa colaboração com esses artistas.”
Por esse trabalho, Kolbeins e Ishii ganharam o Creative Artist Exchange Fellowship em 2016, uma parceria oferecida pela Japan-United States Friendship Commission (JUSFC), o que permitiu que eles passassem três meses no Japão entrevistando convidados para o documentário.
“Depois de ganharmos a parceria da JUSFC, completamos o restante do orçamento para a produção do documentário por meio de crowdfunding“, Kolbeins relembra. “Graças ao trabalho que Anne e eu fazíamos na Massive, encontramos uma comunidade que já se interessava por vários dos temas que retratamos no filme.”
Kolbeins, Anne e Hiromi Iida levaram cinco anos para completar o filme antes de lançá-lo no circuito de festivais em 2019.
Kolbeins conta que Hiromi, uma das produtoras de Queer Japan, também desempenhou um papel central no documentário ao conectá-lo à comunidade LGBTQ+ do Japão.
“Eu conheci Hiromi no Twitter, depois de assistir a diversos documentários de curta-metragem que ela produziu sobre a cena drag de Tóquio.”
Hiromi Ishii apresentou Kolbeins a líderes da comunidade como Margarette, que comanda a icônica livraria Okamalt e também apresenta a Department H, que é conhecida como “uma das maiores festas fetichistas de Tóquio”.
Na última década, Kolbeins pôde conhecer a cultura LGBTQ+ japonesa, que ele descreve como “multifacetada, resistente e próspera.”
“Ao mesmo tempo, membros da comunidade queer no Japão enfrentam muitos obstáculos legais, pressão familiar e discriminação”, ele lamenta. “É uma situação que faz com que muitos deles optem por não se assumir publicamente, especialmente nos ambientes de trabalho.”
“A visibilidade e a aceitação continuam crescendo ano após ano, e você pode ver em Queer Japan que há muitas pessoas vivendo com orgulho e de maneira plena enquanto desafiam as pressões da sociedade”, Kolbeins diz. “Há um espírito de solidariedade e coletividade crescente na comunidade.”
O documentário já pode ser assistido em algumas regiões nas várias plataformas de aluguel on-line. Kolbeins espera poder lançar o filme nos cinemas japoneses em 2021, dependendo de como a pandemia estará até lá. As atualizações sobre o documentário são postadas na conta oficial no Twitter, @queerjapan.