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Nigerianos enfrentam negacionismo da Covid-19 por meio das redes sociais

Categorias: África Subsaariana, Nigéria, Arte e Cultura, Ativismo Digital, Governança, Ideias, Língua, Mídia Cidadã, Mídia e Jornalismo, Saúde, COVID-19

Centro de Isolamento da Covid-19 no estado de Ogun. Imagem da dra. Opeyemi Adeyemi. Utilizada com permissão.

Os nigerianos estão reduzindo o efeito das narrativas de negação sobre a COVID-19 por meio de campanhas on-line como #MyCOVID19NaijaStory e #COVIDStopswithMe.

Essas contranarrativas têm como objetivo provar que o coronavírus letal não é uma farsa, e o mais importante, procuram incentivar às pessoas a adotar boas práticas de saúde para reduzir sua propagação.

Até 29 de Julho, a Nigéria havia registrado [1] 41.804 casos confirmados de COVID-19, 18.764 pessoas recuperadas e 868 mortes.

A negação da COVID-19 na Nigéria

Muitos nigerianos acreditam que a pandemia do coronavírus é um farsa, segundo o jornalista da BBC Africa, Yemisi Adegoke, que falou em um documentário investigativo [2] sobre o Hospital da Universidade de Lagos (LUTH), onde os pacientes infectados estão sendo atendidos.

Esse negacionismo é resultado de uma falta de confiança exacerbada por anos de promessas [3] não cumpridas dos governos passados e atual. [4]

Os casos de COVID-19 estão aumentando na ?? , mas algumas pessoas ainda não acreditam que o vírus é real.

As cenas no hospital LUTH contam uma história diferente. Josh e eu tivemos acesso às alas de COVID-19 e conhecemos os médicos e enfermeiros da linha de frente.

Vídeo completo disponível em 08/07/2020.

Além disso, a opinião comum é de que a pandemia é uma invenção estrangeira com o apoio dos políticos nigerianos e seus comparsas, que a veem como a nova galinha dos ovos de ouro.

Por exemplo, Bill Gates doou [9] recentemente 1 milhão de dólares (383 milhões de naira) para a Nigéria combater a COVID-19. Além disso, vários estados da Nigéria continuam a receber fundos [10] da COVID-19 do governo federal.

Infelizmente, essa percepção ganhou força já que os funcionários públicos de fato roubaram os fundos destinados ao combate à COVID-19.

Em 27 de julho, Aderemi Ohekumle da Dataphyre, um grupo de especialistas de veículos de comunicação, informou que a cleptomania [11] descontrolada de alguns órgãos federais desviou os fundos destinados a máscaras de proteção e sabão líquido para o combate à COVID-19, no valor de 1.690 bilhões de naira ou cerca de 4,4 milhões de dólares

Da mesma forma, em Enugu, no sudeste da Nigéria, os pacotes de ajuda destinados aos pobres e vulneráveis durante o confinamento, nunca chegou até eles [12], segundo informa o jornal Ripples.

Por outro lado, outros cidadãos acham que a doença provocada pelo coronavírus afeta apenas os ricos e a classe alta [13], ou que é um exagero.

Embora isso não justifique a negação a respeito do coronavírus, pode explicar o motivo dessa atitude comum entre muitos nigerianos. Isso explica porque essas 2 campanhas se esforçam para mostrar os fatos mais verdadeiros e confiáveis.

#MyCOVID19NaijaStory

 

#MyCOVID19NaijaStory (Minha história nigeriana de COVID-19) tem legitimação popular porque reúne os nigerianos de todas as classes sociais, desde os que se recuperaram da doença até os que estão trabalhando para combater a pandemia ou tratar os pacientes infectados, de modo a humanizar o diálogo uma vez que se concentra em pessoas reais e usa idiomas locais.

O Ministério da Saúde da Nigéria compartilhou em sua conta no Twitter este vídeo de uma mulher que foi infectada pelo vírus e conta sua história em pidgin [14] nigeriano, como parte da campanha #MyCOVID19NaijiaStory:

Muitas pessoas não acreditam que a Covid-19 existe na Nigéria. #MyCOVID19NaijiaStory nos faz entender como essa doença afetou as pessoas em todo o país.

Nem todos os infectados têm sintomas, assumem responsabilidades ou seguem medidas preventivas. Assista e compartilhe.

No vídeo a mulher disse:

I did not believe that COVID exists. They brought the coronavirus samples collection unit to my area and asked us to get tested. I accepted and did the test. I did not believe that COVID was real because I thought our government was using this as another new means to embezzle funds.

After three days, they [health officials] called, informing me that my test result was out. I was told I was positive. […] I also did not travel. That's why I'm puzzled how I got the virus. When I was told that I have the disease, I said that it was impossible, that I don't have it. Being infected is real. But that's not a death sentence.

Eu não acreditava que a COVID-19 existia. Eles trouxeram as unidades de testagem do coronavírus e nos pediram para fazer o teste. Eu aceitei e fiz o teste. Eu não acreditava que a COVID era real porque pensei que nosso governo estava usando isso como outro meio para desviar fundos.

Depois de 3 dias, eles (os representantes da saúde pública) me chamaram para me informar que o meu resultado havia saído e que eu estava infectada. Eu também não viajei. Por isso eu ainda estou confusa sobre como eu fui infectada. Quando me disseram que eu estava com a doença, eu disse que era impossível, que eu não estava. Estar infectado é real, mas não é uma sentença de morte.

A negação da COVID-19 não se limita somente a classe mais baixa.

Damilare Ojo, advogada que mora em Abuja, testou positivo para o coronavírus em 18 de maio e recebeu alta do centro de isolamento de Gwagwalasa, após 7 dias, em 25 de maio. Em 8 de junho, Ojo contou sua história [19] no Facebook com o alerta de que a “COVID-19 é real na Nigéria”.

Em uma thread no Twitter, um médico de Abuja, conta sua historia da COVID-19, incluindo seus sintomas, tratamentos e como ele lidou com a situação. A thread termina com um apelo a favor da boa higiene e das medidas de proteção e também para que as pessoas parem de negar a existência da COVID-19:

Eu comecei a ter os sintomas da Covid-19 há 23 dias. Eu fiz o teste e deu positivo. Passei por muito sofrimento com alguns sintomas como; febre, dor de cabeça, dor de garganta, dor no peito, vômitos, diarreia, inflamação dos gânglios linfáticos e erupções cutâneas parecidas com a catapora durante 14 dias.

#MyCOVID-19NaijaStory também homenageia os valentes profissionais de saúde nigerianos das linhas de frente, como a doutora Opeyemi Adeyemi, que trabalha em um centro de isolamento da COVID-19 no estado de Ogun, no sudoeste da Nigéria.

#MyCOVID19NaijaStory da dra. Opeyemi Adeyemi, centro de isolamento da COVID-19 no estado de Ogun, na Nigéria. Imagem utilizada com autorização.

Adeyemi teve a difícil tarefa de convencer os parentes de uma paciente, que faleceu da COVID-19, a aceitarem que o enterro de sua mãe teria que ser diferente do habitual, segundo informa [22] o Observatório de Saúde da Nigéria. Adeyemi teve que aguentar longos turnos de dez horas além do estigma dos colegas de trabalho que não queriam chegar perto dela pelo medo de pegar o vírus, disse ela.

A enfermeira Adebusola Adewole trabalhou como voluntária na Unidade de Cuidado Intensivo do Centro de Isolamento da Covid-19 de Eti-Osa, em Lagos. “Alguns momentos eu pensei em desistir”  disse [23]. Ela ficou sobrecarregada com o aumento de casos e o estresse geral trabalhar na linha de frente.

O dr. Adedapo Adesanya também trabalhou como voluntário na mesma UCI:

Eu esperei por muitos anos para ter a oportunidade de servir meu país durante uma pandemia. Vocês não conseguem imaginar a alegria que eu senti quando recebi a ligação para me informar que…”

-Adedapo Adesanya, profissional de saúde da frente de linha durante a pandemia na Nigéria.

Devido a situação econômica na Nigéria, muitos nigerianos não podem se dar ao luxo de trabalhar como voluntários. Logo, é duplamente corajoso para Adewole e Adesanya trabalharem como profissionais de saúde voluntários durante a pandemia.

#COVIDStopswithMe

#Covid19StopswithMe (COVID para comigo) é uma campanha para conscientizar e incentivar as boas práticas de higiene lançada pelo produtor musical Michael Collins Ajereh, popularmente conhecido como DonJazzy. Ele quer que os nigerianos se esforcem para combater a propagação da COVID-19.

Em 23 de junho, DonJazzy publicou um vídeo mostrando as precauções que ele toma antes de cortar o cabelo. No vídeo, seu barbeiro utiliza desinfetante e DonJazzy está de máscara.

Bom dia. Eu gostaria de saber quais as medidas que vocês tomam para manter você e sua família em segurança durante esses momentos. Compartilhem, por favor.

DonJazzy usou sua influência nas redes sociais para passar a mensagem. Com 4.7 milhões de seguidores no Twitter, o vídeo teve 19.000 visualizações no Twitter e 212.208 visualizações no Instagram [30] até 29 de junho.

Ele também conseguiu com que outras celebridades se unissem a campanha:

Obrigado, Daniel Amokachi!

No vídeo acima, o jogador de futebol aposentado e ex-treinador da equipe nacional de futebol da Nigéria, Daniel Amokachi, usa uma mistura de inglês e pidgin nigeriano para recomendar aos nigerianos que lavem as mãos com frequência, que respeitem o distanciamento social e que tenham responsabilidade para impedirem a propagação do coronavírus.

DonJazzy também promoveu [34] o vídeo do YouTube [35] da blogueira Oliseh Kadishu alertando sobre a importância de usar álcool em gel.

Os protagonistas dessas três campanhas falam diretamente com os cidadãos, causando grande impacto em suas vidas porque eles podem se identificar. Essas bem-sucedidas contranarrativas confrontam a causa da negação do coronavírus e a falta de confiança habitual associada às intervenções governamentais.