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Estão as ‘vespas assassinas’ japonesas invadindo a América do Norte?

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Japanese "murder wasp" hunting

Vespa gigante japonesa atacando uma colmeia. Imagem cedida por Stephen Wheeler [1].

No início de maio, o jornal The New York Times informou que além da pandemia de Covid- 19, os Estados Unidos enfrentavam ainda uma outra ameaça: “as vespas assassinas  [2]” da Ásia. O artigo desencadeou rapidamente uma avalanche de histórias [3] e discussões [4] nas redes sociais de todo o mundo sobre as “vespas assassinas”. Com o ressurgimento e o aumento de popularidade de um vídeo que viralizou no YouTube em 2018 sobre uma brincadeira estúpida [5], alguns jornalistas garantiram ao público que era improvável que “‘as vespas assassinas’ pudessem nos matar de forma direta [6],” enquanto outros questionavam o que exatamente é uma “vespa assassina”, afinal?

Segundo o relatório do The Times, a vespa gigante asiática (Vespa mandarina [7]) atualmente está presente não apenas no noroeste do estado de Washington [8], mas também logo depois da fronteira dos EUA e Canadá, ao norte, em White Rock [9], cidade próxima a Vancouver. Em setembro de 2019, um ninho da vespa gigante asiática também foi encontrado e destruído nas proximidades da ilha de Vancouver [10].

Japanese murder hornet

Uma vespa gigante japonesa, ou O-suzumebachi (オオスズメバチ) no Japão. Foto de Nevin Thompson.

É um mistério como a vespa gigante asiática chegou ao oeste da América do Norte. As vespas podem ser encontradas em Taiwan, na China, na Coreia do Sul e no Japão, onde o inseto é conhecido como o-suzumebachi [11] (オオスズメバチ), o que se traduz em algo como “a grande vespa pardal”.

As vespas medem aproximadamente 5 cm de comprimento. Elas se defendem de predadores tais como ursos, [12] picando-os e expelindo veneno, e com um ferrão poderoso.

No Japão, as vespas gigantes atacam as abelhas melíferas, o que significa que elas representam uma ameaça significativa para os apiários do estado de Washington, da Colúmbia Britânica e outras partes da América do Norte.

Por que elas são chamadas de ‘vespas assassinas'?

O artigo do The New York Times quase que imediatamente gerou confusão. Alguns criaram polêmica usando uma afirmação de que as vespas “matam até 50 pessoas por ano” no Japão (na realidade são 12 mortes por ano, segundo o Ministério da Saúde do Japão, citado por um comentarista no Twitter [13]).

Os entomologistas do Canadá, que estudam a presença das vespas há pelo menos um ano, também minimizaram a potencial ameaça aos seres humanos.

As vespas gigantes asiáticas possuem mandíbulas que decapitam as abelhas, ferrões que podem ser usados repetidamente e ainda veneno capaz de dissolver tecidos.

Porém, um dos maiores apicultores da Colúmbia Britânica disse ao @caroloffcbc que elas não devem ser chamadas de “vespas assassinas” e que ele está farto da difamação espalhada pela mídia.

Foi uma vespa assassina que escreveu isso https://t.co/SP9zRSZoRG [14]

— Jimmy Thomson (@jwsthomson) 4 de maio, 2020 [15]

No entanto, para muitos observadores japoneses, a parte mais confusa daquele artigo era exatamente de onde vinha o nome “vespas assassinas”.

Martin Fackler [16], ex-chefe da agência do The New York Times em Tóquio, observou [17] que, no Japão [17], as vespas são chamadas de suzumebachi — uma “abelha” (hachi) ou vespa do tamanho de um pardal (suzume).

Fackler e o colaborador nova-iorquino Matt Alt [18] deduziram que o termo “vespa assassina” surgiu no The New York Times como resultado de uma espécie de “brincadeira do telefone sem fio ao inverso”:

Sim, eu fiz uma breve pesquisa em japonês para as variantes da palavra satsujinbachi (殺人蜂), a qual parece ser a origem de “vespa assassina”, e é provável que o termo tenha sido originalmente uma tradução literal do inglês de “killer bee” (abelha assassina), embora os tabloides japoneses agora também usam o termo para se referir às vespas gigantes asiáticas.  https://t.co/mlE8KpKNmu [19]— Martin Fackler (@martfack) 4 de maio, 2020 [20]

Certamente, o termo sensacionalista “vespas assassinas” é uma tradução literal de 殺人バチ, o que é simplesmente uma transliteração japonesa de “abelha assassina”. As vespas gigantes são sim perigosas, mas em 20 anos aqui eu nunca tinha ouvido esse termo. https://twitter.com/martfack/status/1256787714529062918

Como os apicultores japoneses lidam com as vespas gigantes

“A vespa gigante japonesa avisa que vai atacar quando bate os maxilares um no outro,” diz Stephen Wheeler, um apicultor no Japão, em uma entrevista à Global Voices. “As vespas gigantes asiáticas em si não são um problema se você as encontrar. Caso isso ocorra, pare, não tente atacá-las e recue.”

Wheeler trava uma luta todos os anos para manter suas abelhas melíferas a salvo das vespas gigantes. Desde 1993, Wheeler mora em Awaji, uma ilha predominantemente rural a oeste de Kobe e Osaka, no extremo leste do Mar Interior de Seto. Wheeler é apicultor em Awaji há cerca de oito anos, e atualmente arrenda terras agrícolas para o plantio de árvores apícolas para o reflorestamento.

“Um vizinho me deu duas colmeias antigas e eu as coloquei na cafeteria de um amigo. Assim, eu tive a sorte de ter minhas duas primeiras colônias de abelhas melíferas,” disse Wheeler. “Eu crio abelhas melíferas japonesas (Apis cerana japonica [21]), e quando a colônia escapa das lavouras de morango, eu também crio a abelha melífera europeia  (Apis mellifera).”

Wheeler documenta em seu blogue [22] a vida em Awaji, incluindo o cuidado com as abelhas, a produção de mel, o controle das vespas e também a vida dos insetos.

Managing an attack with sticky pads

“Controlamos os ataques das vespas asiáticas com placas adesivas.” Imagem cedida por Stephen Wheeler [1].

Infelizmente, no inverno passado, Wheeler perdeu todas as suas colônias, conforme ele mesmo explica em um vídeo blogue [23].

“Foi uma espiral descendente,” disse Wheeler. “Vespas amarelas no verão, vespas gigantes no outono, o que significa que as abelhas não podem deixar a colmeia para coletar alimento. As reservas de mel e pólen então diminuem, as abelhas não conseguem manter a colmeia em perfeita forma e o estresse se instala. A colmeia sucumbe devido às mariposas de cera ou aos problemas causados pelo ácaro; elas simplesmente abandonam a colônia, o que no outono por si só já é uma sentença de morte.”

Wheeler diz que não restará nenhuma abelha para sobreviver ao inverno e dar continuidade à colônia na primavera.

Em seu canal no YouTube, [24] Wheeler documentou uma série de técnicas usadas por ele na luta contra a vespa gigante asiática. Abaixo, ele explica como as vespas liberam feromônios para pedir ajuda, e como usar esse comportamento contra elas: