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Da Suécia ao México, indígenas explicam por que seus idiomas estão desaparecendo

Categorias: América Latina, Costa Rica, Finlândia, Honduras, México, Noruega, Peru, Suécia, Arte e Cultura, Direitos Humanos, Educação, Etnia e Raça, Indígenas, Liberdade de Expressão, Língua, Meio Ambiente, Mídia Cidadã, Relações Internacionais

Povos indígenas escandinavos. Créditos: Pexels.com

Cada idioma representa uma percepção específica da realidade. É uma forma na qual se materializam as ideias, tradições, costumes, histórias e emoções de uma comunidade, de modo que conservá-las é de vital importância para preservar a identidade de seus indivíduos.

Mas, hoje em dia, cerca de 3000 línguas [1] encontram-se em perigo de extinção no âmbito internacional.

Um exemplo é a língua yagan [2], originária de uma tribo nômade da Patagônia, no extremo sul do Chile e da Argentina, que conta com apenas uma falante; ou o caso do México, país em que mais de 64 idiomas [3] correm o risco de morrer. Mais de 20 línguas europeias [4] também estão a ponto de desaparecer.

A situação ameaça idiomas de todo o planeta, e a Europa e a América [4] não são exceção.

Por que as línguas morrem?

As línguas morrem porque as condições em que as comunidades de falantes vivem não favorecem a prosperidade cultural, segundo linguistas e ativistas como a mexicana Yásnaya Elena Aguilar [5] e a sueca Sofia Jannok [6]. Jannok, em um discurso realizado em um evento TEDx [7], explica os ataques constantes às comunidades:

This is how it is for my people, if not to say for all indigenous people all over the world. Some big companies, driven by people whose goal is money, invade our homes, force us to move, or simply get rid of us.

Assim são as coisas para o meu povo e para todas as pessoas indígenas ao redor do mundo. Grandes empresas, dirigidas por pessoas motivadas pelo dinheiro, invadem nossas casas, forçam nossa mudança ou simplesmente se livram de nós.

Cabe destacar que muitos grupos indígenas no mundo denunciam a expropriação de seus bens e a violação de seus direitos humanos. No México, o ecologista Rarámuri Julián Carrillo foi assassinado [8] após defender os bosques da Sierra Madre do corte ilegal e de ter se posicionado contra as concessões de mineração outorgadas pelo Estado mexicano. O caso do assassinato de Berta Cáceres [9], indígena do povo lenca que se opôs à construção de uma usina hidrelétrica em Honduras, deu a volta ao mundo.

Casos como esses, que muitas vezes ficam impunes [10], continuam acontecendo: no dia 24 de fevereiro de 2020, um grupo armado matou uma ativista indígena do povo brörán [11], na Costa Rica. Os ativistas lamentam profundamente a falta de reação dos governos.

A linguista mexicana Yásnaya Aguilar afirmou [12] perante a câmara dos deputados de seu país em março de 2019 que:

Las lenguas indígenas no se mueren, las mata el Estado mexicano.

As línguas indígenas não morrem, elas são mortas pelo Estado mexicano.

Em abril de 2019, Yásnaya redigiu um discurso em espanhol para a Global Voices [13], que inclui “reflexões sobre o desaparecimento dos idiomas indígenas e sua estreita relação com a perda de território”.

Além disso, a ONG Global Witness [14] e vários ativistas internacionais, como a indígena do povo sámi Eva M. Fjellheim [15], indicam que o agronegócio e a mineração são as principais atividades vinculadas ao assassinato de líderes ecologistas indígenas no mundo. A América Latina lidera [16] a lista de ataques. Fjellheim afirmou [17] à Pikara Magazine que:

En los últimos 10 o 15 años la presión ha aumentado bastante en lo territorial: el interés de explotar los recursos energéticos por las mineras. Nos hemos dado cuenta de que no tenemos ningún derecho real que nos proteja (…).

Nos últimos dez ou quinze anos, aumentou bastante a pressão no que diz respeito ao território e o interesse que as mineradoras têm em explorar os recursos energéticos. Nos demos conta de que não temos nenhum direito real que nos proteja.

Há também quem afirme que uma parte relevante da questão seja a discriminação enfrentada pelos povos indígenas. Em 2017, o escritor quéchua-falante Pablo Landeo, do Peru, disse [18] na Feira Internacional do Livro de Lima que:

Las estructuras sociales determinan la condición de las lenguas originarias y ahí está todo lo relativo a la discriminación y la vergüenza, a la idea de asociarlas como vinculadas al pasado y al retraso.

As estruturas sociais determinam a condição das línguas originárias, e aí está tudo o que se relaciona com a discriminação e a vergonha, com a ideia de associá-las ao passado e ao atraso.

Menina do povo chatino, do México. Créditos: Pixabay.com

A discriminação também engloba a baixa divulgação e a pouca visibilidade dada às línguas nativas. Em muitos casos parecidos com o do México, muito pouco do orçamento cultural [19] é destinado a projetos de literatura e artes indígenas; e, em países como a Suécia, acaba sendo priorizado o ensino de inglês, finlandês ou alemão como segunda língua em vez do ensino de línguas nativas.

Apesar de os países nórdicos, como a Suécia, a Noruega e a Finlândia, estarem a milhares de quilômetros de países como o México e o Peru, parece que há um elemento em comum que os une: a segregação cultural de suas línguas indígenas e a destruição da identidade e da memória histórica de seus povos nativos.

[20]

Homem indígena do povo sámi, da Finlândia. Créditos: Flickr/Youngbrov [20]

Em 2019, ao finalizar o Ano Internacional das Línguas Indígenas, a Organização das Nações Unidas anunciou a Década Internacional das Línguas Indígenas [21], que começará em 2022, com o objetivo de promover e revitalizar os idiomas.

Hoje, após a conclusão do Ano Internacional das Línguas Indígenas, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou uma resolução sobre os direitos dos povos indígenas, que inclui, entre outras coisas, a proclamação da Década Internacional das Línguas Indígenas entre os anos de 2022 e 2032. Seguimos em frente! #SomosIndígenas