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Nova ministra das Finanças da Macedônia do Norte enfrenta ataques sexistas on-line

Categorias: Europa Oriental e Central, Macedônia, Economia e Negócios, Governança, Mídia Cidadã, Mulheres e Gênero, Política
[1]

Nina Angelovska em seu primeiro dia no cargo de ministra das Finanças da República da Macedônia do Norte. Imagem do Ministério das Finanças [1]. Domínio Público.

Nina Angelovska é a primeira mulher a chefiar o Ministério das Finanças na Macedônia do Norte. Logo após a sua nomeação, no final de agosto, ela recebeu uma onda de insultos sexistas e misóginos, virtuais, inclusive do porta-voz do principal partido de oposição, VMRO-DPNME (Organização Revolucionária Interna da Macedônia – Partido Democrático para a Unidade Nacional Macedônia).

Angelovska [2], de 31 anos, é uma das fundadoras do Grouper [3], o primeiro serviço de cupons on-line na Macedônia. De acordo com seu currículo [4], ela se formou em Administração em 2010, como a melhor aluna de sua turma, e fez doutorado em Ciências e Gestão de Organização em 2016. Nesse mesmo ano, a revista alemã The Hundert [5], listou a ministra entre as 100 mulheres fundadoras de startups mais bem-sucedidas na Europa e, em 2018, também entrou na lista anual dos “30 abaixo de 30″ da Forbes [6] na categoria varejo e comércio.

A reação do público com a nomeação de Angelovska se concentrou em sua idade e aparência, em detrimento de sua experiência profissional. Entre todos os ataques contra ela, destacou-se a publicação do porta-voz do VMRO-DPNME, Naum Stoilkovski, que escreveu um post no Facebook [7] repleto de linguagem misógina, incluindo os termos “Garota Džirlo” (um termo sexista que faz referência à extinta empresa de televendas Džirlo [8], cujos famosos comerciais de TV eram apresentados por modelos femininos durante a ex-Iugoslávia) e “group girl” (que alude à promiscuidade). A postagem foi excluída desde então, mas não antes de gerar reações negativas.

A Rede de Proteção Contra a Discriminação, uma coalizão das organizações de direitos humanos da Macedônia do Norte, condenou veementemente [9] os comentários de Stoilkovski:

Служејќи се со примитивен и омаловажувачки говор, во обидот да се дискредитира министерката за финансии, портпаролот на ВМРО ДПМНЕ ја претставува Министерката како наводно промискуитетна и неспособна жена, чија „вистинска” задача е да ги задоволи сексуалните потреби на мажите политичари, што претставува сеприсутен сексистички стереотип за професионално реализираните жени во сите општествени сфери. (…)

Мажите политичари треба да бидат активни партнери, поддржувачи и промотори за вклучувањето на жените во политичкиот и јавниот живот и за воспоставување на родова еднаквост во сите општествени сфери. Повторуваме дека местото на жената е секаде каде што таа сака да биде, политичката моќ им припаѓа на жените, исто како што грижата за семејството им припаѓа на мажите. Женското учество во јавниот живот е предуслов за развој, благосостојба и демократија.

Од тие причини го повикуваме портпаролот на ВМРО ДПМНЕ Наум Стоилковски да упати јавно извинување за својата шовинистичката, сексистичка и мизогина изјава.

Апелираме до медиумите да не ги пренесуваат, без критички коментар, ваквите сензационалистички и сексистички објави со кои се врши вознемирување и повреда на достоинството на жените и се потхрануваат родовите стереотипи. Ја повикуваме Комисијата за заштита од дискриминација, согласно своите законски овластувања да поведе постапка за заштита од дискриминација по службена должност и да утврди вознемирување врз основа на пол и род.

Em um discurso primitivo e depreciativo, na tentativa de desvalorizar a ministra das Finanças, um porta-voz do VMRO-DPMNE, apresenta a ministra como uma mulher supostamente promíscua e incompetente, cuja verdadeira tarefa é atender às necessidades sexuais dos políticos do sexo masculino, um estereótipo sexista generalizado para mulheres realizadas profissionalmente em todas as esferas sociais (…)

Os políticos homens precisam ser parceiros, apoiadores e promotores ativos da inclusão das mulheres na vida política e pública, a fim de garantir a igualdade de gênero em todas as esferas da sociedade. Repetimos que o lugar da mulher é onde ela quer estar, que o poder político pertence às mulheres também, assim como a responsabilidade pelo cuidado da família também pertence aos homens.                                                                                                                                                       

Por essas razões, solicitamos ao porta-voz do VMRO-DPMNE, Naum Stoilkovski, que faça um pedido público de desculpas por sua declaração chauvinista, sexista e misógina. 

Solicitamos à mídia para que não transmita, sem comentários críticos, anúncios sensacionalistas e sexistas que perpetuam assédio e afronta à dignidade das mulheres e perpetuam os estereótipos de gênero. Convocamos a Comissão de Proteção contra a Discriminação, de acordo com suas competências legais, a iniciar um procedimento oficial de proteção contra a discriminação e a determinar assédio sexual e por gênero.

A ministra do Trabalho e da Política Social, Mila Carovska, também reagiu [10] duramente:

Ние жените ќе бидеме се погласни и се поприсутни на јавни клучни позиции каде што се носат одлуки за иднината на државата независно од обидите на шовинистите да го спречат тоа. Заедно ќе се бориме против сексизмот и шовинизмот во нашата држава. (…) Срамно и недолично е однесувањето на портпаролот на ВМРО-ДПМНЕ, Наум Стоилковски. Ова е под секое ниво на политичка култура, под секое ниво на култура воопшто. Никогаш нема да одиме напред ако не го казнуваме и искорениме јавното линчување и етикетирање на жените. Жени продолжуваме уште посилно да се бориме против силите што го влечат назад нашето општество!

As mulheres estarão mais engajadas e mais presentes em importantes posições públicas, onde são tomadas decisões sobre o futuro do estado, independentemente das tentativas dos chauvinistas de evitá-lo. Juntas, lutaremos contra o sexismo e o chauvinismo em nosso país. (…) O comportamento do porta-voz do VMRO-DPMNE, Naum Stoilkovski, é vergonhoso e inapropriado. Isso está em todos os níveis da cultura política, em todos os níveis da cultura em geral. Nunca avançaremos a menos que punamos e eliminemos o linchamento e a rotulagem pública de mulheres. Mulheres, continuaremos a lutar ainda mais contra as forças que estão arrastando nossa sociedade para trás.

Até membros do próprio partido de Stoilkovski reprovaram seus comentários. A parlamentar Daniela Rangelova disse [11] no Facebook: “Eu condeno fortemente qualquer ataque sexista a qualquer mulher… vamos manter o nível de comportamento e parar o discurso de ódio dirigido às mulheres”. Também no Facebook, a deputada Blagica Lasovska escreveu [12] que condena todas as formas de discurso de ódio e sexismo, sejam de representantes do governo ou da oposição. “Eu permaneço na vanguarda dos direitos das mulheres, na luta pelo respeito às mulheres e sua liberdade”, acrescentou.

O VMRO-DPNME considerou suas reações sem precedentes. Quando esteve no poder (2006-2017), eles pressionaram por políticas antiaborto e lançaram campanhas sexistas na mídia, sem nunca enfrentar a resistência pública das mulheres de seu próprio partido.

As organizações formadas por mulheres, outros partidos políticos, ministros e o governo [13] da República da Macedônia do Norte, também condenaram publicamente a publicação de Stoilkovski no Facebook.

Jovens nos principais cargos no governo da Macedônia

Angelovska pode parecer jovem para liderar o Ministério das Finanças, mas não é incomum na Macedônia do Norte pessoas com menos de 35 anos de idade ocuparem altos cargos no governo. Em 1991, Ljubčo Georgievski [14], de 25 anos, tornou-se vice-presidente do país. Um ano depois, Branko Crvenkovski [15] foi eleito primeiro-ministro aos 29 anos. Nikola Gruevski [16] foi nomeado ministro do Comércio aos 28 anos em 1998, e ministro das Finanças um ano depois, antes de finalmente se tornar primeiro-ministro aos 36 anos. Seu gabinete incluía vários pessoas com menos de trinta anos, como Mile Janakievski [17] e Dime Spasov [18], que tinham ambos 28 anos quando assumiram os cargos de ministro dos Transportes e Comunicações e ministro do Trabalho e Política Social, respectivamente. Ao contrário de Angelovska, a idade desses jovens não foi usada para desvalorizá-los.

Inicialmente, Stoilkovski respondeu [19] dizendo que seus críticos haviam distorcido suas palavras:

Мојот став не се однесуваше на министерката туку се однесуваше на Зоран Заев. Да појаснам, никогаш не сум промовирал сексистички ставови, ниту се дел од мојот карактер и светоглед. Напротив реагирав на прес-конференцијата на која што Зоран Заев ја злоупотреби Нина, новата министерка, да го презентира,  по само два дена на таа функција, ребалансот кој што не е нејзин, притоа претставувајќи ја и во потчинета ситуација, да не и дозволи да одговори ниту на новинарско прашање, барем од она што го видов. Апсолутно сметам дека ова е само едно извртување и спин на една изјава која што ја претставува релноста… (…) Групировка е само едно несреќно изведување од нејзината претходна работа. А ‘Џирло девојка’ за оние што не знаат, е основата на она што се нарекува Али експрес трговија…

Minha posição não era sobre a ministra, mas sobre Zoran Zaev (primeiro-ministro da Macedônia do Norte). Para ser claro, nunca promovi atitudes sexistas, nem fazem parte do meu caráter e visão de mundo. Pelo contrário, reagi em uma entrevista [20] coletiva na qual Zoran Zaev agrediu Nina, a nova ministra, ao apresentar, após somente dois dias no cargo, o ajuste orçamentário que não era dela, enquanto a colocou em uma situação de subordinação não permitindo que ela respondesse a uma pergunta de um jornalista, pelo menos o que vi. Eu absolutamente acredito que isso é apenas uma deturpação e uma desinformação em relação a uma declaração que representa a realidade… ‘Gruppirovka’ é apenas uma derivação infeliz de seu trabalho anterior (Grouper). ‘Garota Džirlo’, para quem não sabe, é a base do que hoje é chamado de comércio Ali Express…

Depois que a nova declaração de Stoilkovski incitou uma nova rodada de reações, ele tentou novamente se explicar, alegando que seu post foi mal interpretado, e pediu desculpas [21] se ofendeu a alguém:

Бидејќи и тоа што го кажав не е протолкувано како извинување, еве ќе бидам појасен: изнесената метафора беше погрешно разбрана и протолкувана на погрешен начин, затоа се извинувам ако на некој начин сум предизвикал навреда или таа метафора предизвика навреда на нечии чувства. Како син, брат, сопруг, татко, пријател никогаш не поддржувам ниту пак ќе поддржам сексизам или говор на омраза и останувам застапник за човечките права и слободи. Како човек барам прошка ако ненамерно сум погрешил. Очекувам и овој мој јавен став да биде преземен од медиумите.

E como o que eu disse não é interpretado como um pedido de desculpas, aqui estarei mais claro: a metáfora apresentada foi mal-entendida e mal interpretada, portanto, peço desculpas se, de alguma forma, ofendi ou se essa metáfora ofendeu os sentimentos de alguém. Como filho, irmão, marido, pai, amigo, nunca apoio o sexismo nem o discurso de ódio e continuo sendo um defensor dos direitos humanos e da liberdade. Como ser humano, peço perdão se cometi um erro inadvertidamente. Espero que esta declaração também seja aceita pela mídia.

[22]

Anita Angelovska-Bežovska, presidente do Banco Nacional da República da Macedônia do Norte e Nina Angelovska, ministra das Finanças. Imagem do Ministério das Finanças. Domínio Público.

É frequente a discriminação que as mulheres enfrentam no local de trabalho na Macedônia do Norte. De acordo com a ONU Mulheres: [23]

Despite significant legal changes, gender gaps [24] and inequalities continue across all levels. Women make up only 39.5 per cent of the employed, earn 17.9 per cent less than men per hour of work, and are 64.2 per cent of the country’s economically inactive population.

Apesar das significantes mudanças legais, as disparidades e desigualdades de gênero [24] continuam em todos os níveis. As mulheres representam apenas 39,5% dos empregados, ganham 17,9% menos que os homens por hora de trabalho e representam 64,2% da população economicamente inativa do país.

Os partidos políticos raramente nomeiam mulheres para ocupar altos cargos. Embora as cotas de representação estatutária tenham aumentado o número de mulheres parlamentares [25] de 31% em 2011 para 38% em 2018, os homens ainda são maioria no parlamento. O mesmo ocorre com a política municipal [26]: há 75 prefeitos do sexo masculino contra apenas seis do sexo feminino. Com a nomeação de Angelovska, o número de mulheres ministras é agora cinco [27], dos 23 cargos ministeriais.

Curiosamente, todas as principais instituições financeiras da Macedônia do Norte, agora são chefiadas por mulheres: o Ministério das Finanças, o Banco Nacional (também chefiado por duas vice-governadoras) e a Receita Federal.