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Ativistas indianos opõem-se a projeto de refinaria de petróleo por razões ambientais e protestos se agravam

Categorias: Mídia Cidadã
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Refinaria de petróleo. Patrick Hendry por meio da Unsplash (CC BY-SA 2.0)

Em março de 2019, após grandes protestos de agricultores e ativistas ambientais, o governo indiano transferiu o projeto de uma refinaria de petróleo “verde”, no valor de US$ 44 bilhões, da região ecologicamente sensível de Nanar, em Ratnagiri, na costa do Concão [2]. Recentemente, apelos de grupos pró-refinaria para que a iniciativa retorne a Ratnagiri deixaram ativistas e agricultores temerosos de que o projeto seja reintroduzido na área, o que causaria danos ao meio ambiente e afetaria seus meios de subsistência.

A joint venture formada pelas empresas petrolíferas da Arábia Saudita Aramco e Adnoc [3], e da Índia, Indian Oil Corporation, Bharat Petroleum Corporation e Hindustan Petroleum Corporation foi inicialmente realocada após protestos de moradores e ativistas, que criticavam o investimento contínuo da Índia em combustíveis fósseis. O projeto foi transferido para Raigad, a 100 quilômetros da capital financeira da Índia, Mumbai, quando o governo anunciou a aquisição de 40 vilarejos para o início do projeto.

Em 28 de julho de 2019, o grupo pró-refinaria, Konkan Vikas Samiti (KVS) realizou uma manifestação exigindo que o projeto fosse restabelecido em Ratnagiri, citando as oportunidades econômicas que isso traria para as comunidades locais.

Como resposta, um protesto foi realizado por um grupo contra a refinaria, com o objetivo de impedir o projeto. Ativistas alegam que as leis sobre aquisição de terras na Índia foram utilizadas de forma abusiva para adquirir terras dos agricultores. Para Satyajit Chavan, responsável pela organização Konkan Virodhi Sangharsh Samiti, entidade que lidera os protestos, a retomada do projeto da refinaria de petróleo seria um problema para a região:

We are being careful and alert to avoid resurrection of the project in Ratnagiri's Nanar as it will destroy farmlands, mango orchards and pose a threat to the wildlife in the region. Investors in the region, who have vested interests are trying to revive the project and have politicized the issue despite the government canceling and relocating it under a gazette notification. This is dangerous.

Estamos cautelosos e alertas para evitar a volta do projeto para Nanar, em Ratnagiri, pois isso destruirá fazendas e pomares de manga, além de representar uma ameaça à vida selvagem da área. Os investidores da região, que têm grande interesse, estão tentando retomar o projeto e politizaram o assunto, apesar do cancelamento e relocação do projeto pelo governo após um boletim oficial. Isso é perigoso.

A região de Nanar, em Ratnagiri, é conhecida pelos terrenos rochosos e riachos que atuam como criadouros de várias espécies marinhas. A região também é uma área agrícola de destaque, e milhares de agricultores dependem dos pomares de manga e da pesca para sobreviver. Os moradores locais temem que a biodiversidade da região e seus meios de subsistência sejam afetados pela poluição resultante do projeto da refinaria.

Cilada do desenvolvimento?

Estima-se que o projeto englobe cerca de 16.000 acres de terra [4], o que levou muitos ativistas locais a questionarem a afirmação de que se trata de uma refinaria “verde” e de ser necessária para uma economia emergente como a Índia.

“Embora a localização tenha sido transferida de Nanar para Raigad devido ao impacto ambiental, o projeto também não criaria o mesmo problema em Raigad?” Perguntou a ativista social Ulka Mahajan.

“The governing party shifted the location but how can they bring it elsewhere and are people of Raigad dispensable? All these issues cannot be questioned in isolation and the government needs to answer if we really need the project and do a cost-benefit analysis.”

O partido governante mudou o local, mas como eles podem implantar o projeto em outro lugar? As pessoas de Raigad são dispensáveis? Todas essas questões não podem ser analisadas isoladamente, e o governo precisa responder se realmente precisamos do projeto e fazer uma análise do custo-benefício.

Enquanto os especialistas afirmam que o projeto, com uma produção estimada em 1,2 milhão de barris por dia, poderia oferecer à Índia suprimentos constantes de combustível, outros questionam a poluição que potencialmente pode ser gerada no distrito de Maigashtra, em Raigad. Também foram levantadas questões sobre o impacto nas aldeias de pesca e nos pomares de manga.

Prashant Jade, um agricultor de Ratnagiri, informou à Global Voices:

Protests were instigated by groups affiliated with the government to prevent the project from moving out of Nanar. I don’t want this project to come here as Konkan is an eco-sensitive zone with diversity. We don’t follow pollution control norms in India as stringent as in Europe. The project is called green refinery but we know it will be polluting the local environment.

Os protestos foram instigados por grupos afiliados ao governo, para impedir que o projeto saísse de Nanar. Não quero esse projeto aqui, pois Concão é uma zona ecologicamente sensível e diversificada. Na Índia nós não seguimos normas de controle de poluição tão rigorosas quanto na Europa. O projeto é chamado de refinaria verde, mas sabemos que irá poluir o meio ambiente da região.

As leis de aquisição de terras da Índia foram manipuladas, acrescentou Ulka Mahajan. Essas leis determinavam o consentimento de ao menos 70% dos proprietários afetados, e também exigiam uma prova do impacto social. Aprovadas pelo parlamento em 2013, as leis também quadruplicaram a compensação por terras rurais, incluindo as terras agrícolas.

The 2013 central land acquisition faced four ordinances and they could not pass the bill in the parliament. Despite that, they are using the Land Acquisition Act in the name of large scale projects. We don't know who will benefit since the law for the first time had helped weak and voiceless citizens raise their voices regarding their land.

A aquisição central de terras de 2013 enfrentou quatro decretos, e não poderia ser aprovada pelo parlamento. Apesar disso, a Lei de Aquisição de Terras está sendo usada em prol de projetos de grande escala. Não sabemos quem será beneficiado, pois a lei, pela primeira vez, ajudou os cidadãos frágeis e sem voz a se manifestarem em relação às suas terras.

Houve algum espaço democrático, que serviu de plataforma para expressar preocupações após a realização de pesquisas de avaliação social. Essa disposição da lei foi eliminada por uma emenda nas leis estaduais. Isso vai contra a vontade dos agricultores e das comunidades locais, opina Mahajan.

A Índia é uma economia dependente do petróleo, e mais de 80% de sua demanda é atendida por importações do Oriente Médio, incluindo a Arábia Saudita e o Iraque. Os analistas dizem que as sanções do Irã e a falta de petróleo bruto da Venezuela afetaram a economia indiana, resultando em uma desaceleração nos índices de crescimento.

Em 2015, o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, anunciou uma nova aliança de nações [5] para a expansão em larga escala do uso de energia solar, e disse que os combustíveis fósseis colocam o planeta em perigo. Embora a Índia tente diversificar e aumentar seus investimentos em energia solar e eólica, os projetos que envolvem combustíveis fósseis continuam aumentando, sem apresentar redução no volume de investimentos. De acordo com Modi:

Solar technology is evolving, costs are coming down and grid connectivity is improving. The dream of universal access to clean energy is becoming more real. This will be the foundation of the new economy of the new century. 

A tecnologia solar está evoluindo, os custos estão caindo e a conectividade da rede está melhorando. O sonho do acesso universal à energia limpa está se tornando mais real. Este será o alicerce da nova economia do novo século.

Enquanto a Índia continua a investir localmente em combustíveis poluentes, aos ativistas e especialistas resta questionar as promessas do governo à comunidade global sobre as mudanças climáticas.

Um ativista ambiental local que trabalhou com o governo, sob condição de anonimato, afirmou que, devido ao projeto, mais de 50.000 veículos pesados passarão a circular entre a capital financeira da Índia, Mumbai, e o estado ocidental de Goa para fins de transporte, aumentando assim a poluição veicular e afetando os ecossistemas locais.

Para Mahajan, falta visão a projetos assim:

At the international level, they commit a lot about tackling climate change and focusing on renewables but here, they focus on export-driven trade and GDP and we have environmental losses and loss of livelihood. But will they achieve anything in the near future? 

Em nível internacional há um grande compromisso para combater as mudanças climáticas e investir em energias renováveis, mas aqui o foco é no comércio impulsionado pelas exportações e no PIB, e temos prejuízos ambientais e perda dos meios de subsistência. Mas será que irão realizar algo no futuro próximo?

As fontes da matéria foram entrevistadas por Vishal M. para a Global Voices