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Novo documentário explora as raízes da perseguição em Myanmar na comunidade rohingya

Categorias: Leste da Ásia, Mianmar (Birmânia), Direitos Humanos, Guerra & Conflito, História, Mídia Cidadã, Política, Refugiados
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Uma comunidade de refugiados rohingya. Foto de Shahida Tulaganova, usada sob permissão

Um novo documentário fornece uma visão geral e histórica da situação dos muçulmanos rohingyas, em Myanmar.

O filme “Exiled” (Exilado) [2], dirigido pela veterana correspondente de guerra, Shahida Tulaganova [3], “explora as raízes da violência crescente” no estado de Rakhine, em Mianmar, a partir da perspectiva dos refugiados rohingyas, de ex-funcionários do governo birmanês e de monges budistas radicais. Também foi entrevistado no filme o general Khin Nyunt, ex-chefe da Inteligência Militar birmanesa, acusado de planejar a política de perseguição à etnia rohingya.

Myanmar tem uma população predominantemente budista, mas também abriga mais de 100 grupos étnicos minoritários, incluindo os rohingyas, que o governo se recusa a reconhecer e considera como “imigrantes ilegais” de Bangladesh e da Índia.

Nos últimos anos, a violência comunitária irrompeu entre pessoas locais e grupos budistas radicais na cidade. O discurso de ódio contra os rohingyas, que são predominantemente muçulmanos, também tem se intensificado [4].

Desde 2017, milhares de rohingyas foram forçados [5] a fugir de suas casas depois que o Exército do governo entrou em conflito com o Exército de Salvação Rohingya de Arakan (ARSA).

Grupos de direitos humanos há muito tempo informam sobre a deterioração da situação dos rohingyas em vários campos de refugiados. Eles também criticaram o governo [6] que chegou ao poder em 2015 sob a liderança de Aung Sang Suu Kyi [7], por continuar as políticas “genocidas” do regime militar anterior.

Contexto histórico

O filme “Exiled” [8] aborda no contexto histórico a violência infligida à população rohingya.

A diretora do filme, Tulaganova, soube pela primeira vez sobre da situação em Rakhine em 2012, quando tumultos provocaram incêndios nas comunidades rohingyas. Ela monitorou e estudou a questão nos anos seguintes e foi motivada a contar a história dos rohingyas no contexto da evolução da atual Myanmar, em vez de meramente destacar eventos esporádicos de violência contínua e a crise humanitária. Ela disse a Global Voices que:

It was very important for me to show the whole story and talk to people who set up the system of extermination of Rohingya, like former chief of Burmese military intelligence, General Khin Nyut,and show that exodus of 2017 is not a sporadic, one off outcome of violence. It has been happening as of 1978, but the world didn't know about it.

Para mim, foi muito importante mostrar toda a história e conversar com as pessoas que criaram o sistema de extermínio dos rohingyas, como o ex-chefe da inteligência militar birmanesa, o general Khin Nyut, e mostrar que o êxodo de 2017 não é esporádico, é resultado da violência. Isso vem acontecendo desde 1978, mas o mundo não sabia disso.

Tulaganova teve dificuldades para obter um visto de jornalista, o que também limitou seu trabalho.

I had to sign several papers saying that I will not travel anywhere near Rakhine state and I had to sign those. However, I was desperate to get the point of view of people who live there, so I had to think of a Plan B. So, I have found a courageous and very talented Burmese film-director who was willing to travel to Rakhine state and interview people on my behalf. And it all worked out. Unfortunately, I was given visa for 10 days only and I was feeling like Cinderella, who has to manage to get access and film everyone I had to in such a short time. But I had fantastic and very experienced field producers in Burma who made it happen.

Eu tive que assinar vários documentos atestando que eu não iria viajar para nenhum lugar perto do estado de Rakhine. No entanto, eu estava desesperada para entender o ponto de vista das pessoas que vivem lá, então tive que pensar em um plano B. Encontrei um corajoso e talentoso diretor de cinema birmanês que estava disposto a viajar para Rakhine e entrevistar pessoas em meu nome. E tudo deu certo. Infelizmente, recebi o visto por apenas 10 dias e estava me sentindo como a Cinderela, que tem que conseguir acesso e filmar tudo em tão pouco tempo. Mas eu tive produtores de campo fantásticos e muito experientes em Burma, que fizeram isso acontecer.

A cineasta está ciente de que seu filme nunca será exibido em Myanmar, mas ela espera que mais pessoas dentro e fora do país venham a entender melhor a perseguição e a sistemática contra os rohingyas. Ela acrescenta que “Exiled” oferece uma história universal sobre a violência sofrida pelas minorias étnicas.

I wish people in Myanmar see this film since it is not only about Rohingya, it is about all ethnic minorities, which face persecutions for years. I believe, that Myanmar audience can learn a lot from this film.

My target audience is the world. I tried to tell the story of genocide and this is a universal story. What happened to Rohingya echoes to what had happened to Jews during the Second World War, to Bosnians during Yugoslav war and etc- this is a story about state-organized and planned systematic extermination of an entire ethnic group. And when I talk about extermination, with Rohingya it is not only physical extermination. It is about denial of education, healthcare, childbirth – the system which is ultimately designed to kill them morally and physically. This is the most horrible part of their story for me.

Queria que as pessoas em Myanmar assistissem a este filme, já que não é apenas sobre os rohingyas, mas sobre todas as minorias étnicas, que enfrentam perseguições por anos. Eu acredito que o público de Myanmar pode aprender muito com este filme. Meu público-alvo é o mundo. Eu tentei contar a história do genocídio e esta é uma história universal. O que aconteceu com os rohingyas reflete ao que aconteceu com os judeus durante a Segunda Guerra Mundial, aos bósnios durante a guerra na Iugoslávia, etc. Essa é uma história sobre o extermínio sistemático organizado e planejado pelo Estado de todo um grupo étnico. E quando falo de extermínio, no caso dos rohingyas não é apenas o extermínio físico. Trata-se de negar educação, saúde, assistência natal; um sistema que, em última análise, é projetado para matá-los moral e fisicamente. Esta é a parte mais horrível dessa história para mim.

[9]

Alguns membros da equipe de produção. Foto de Shahida Tulaganova, usada sob permissão.

Quando perguntada sobre o que a comunidade internacional pode fazer para ajudar os rohingyas, Tulaganova pediu aos funcionários das Nações Unidas para adotar ações mais decisivas:

First and foremost, the UN and other agencies operating in the Rakhine state should recognize that they have failed both the Rakhine Buddhists and Rohingya Muslims. UN was trying to play it safe and in many instances, refused to call Rohingya -Rohingya, because of the insistence [10] of Burmese officials. So did many other foreign countries. This is wrong.

I think that serious sanctions have to be imposed on Burmese officials (military and political). I think that the world powers should recognize this is a genocide and put pressure on the government of Burma to get their act together and recognize Rohingya as nationals of Myanmar without any verification process, provide safe return of Rohingya to their villages and pay compensation for the loss of their property.

Antes de tudo, a ONU e outras agências que trabalham no estado de Rakhine devem reconhecer que falharam com os budistas de Rakhine e com os muçulmanos rohingyas. A ONU tentou agir de maneira segura e, em muitos casos, recusou-se a chamá-los de rohingyas, por causa da insistência [10] das autoridades birmaneses. O mesmo aconteceu com muitos outros países estrangeiros. Isto está errado.

Penso que sérias sanções têm de ser impostas aos funcionários birmaneses (militares e políticos). Penso que as potências mundiais devem reconhecer que isso é um genocídio e pressionar o governo da Birmânia para que atue e reconheça o povo rohingya como cidadãos de Myanmar, sem qualquer processo de verificação, que permite o retorno seguro dos rohingyas às suas aldeias e paguem uma compensação pela perda de suas propriedades.

Aqui está o trailer do filme “Exiled”: