O Netizen Report da Global Voices apresenta um panorama dos desafios, conquistas e as novas tendências da tecnologia e dos direitos humanos no mundo. Este relatório abrange notícias e eventos de 10 a 17 de maio de 2019.
No dia 13 de maio, usuários do WhatsApp de vários países foram alvos de um software mal-intencionado [1] desenvolvido pela empresa israelense NSO Group e utilizado por governos que o adquiriram.
Acredita-se que o software aproveitou-se de uma falha técnica do WhatsApp que, depois, foi corrigida. Os ataques foram especialmente graves [2] devido à facilidade com a qual conseguiam infectar o dispositivo: simplesmente por receber uma ligação ou uma mensagem, o usuário poderia, sem perceber, permitir que o software se instalasse no aparelho, dando aos invasores amplo acesso às suas comunicações e atividades privadas.
A NSO Group é a criadora do famigerado spyware Pegasus, vendido apenas a governos, normalmente através de contratos com autoridades policiais e serviços de inteligência. Uma vez instalado, o software parece possibilitar que o invasor veja e registre tudo o que a vítima faz e diz em seu dispositivo, gravando mensagens, localização e muitos outros tipos de dados. O Pegasus foi associado a ataques a ativistas e jornalistas no México [3], Arábia Saudita [4] e Emirados Árabes Unidos (EAU) [5], onde foi encontrado em um dispositivo pertencente ao defensor de direitos humanos Ahmed Mansoor [6], que atualmente está preso.
O Instituto Bernstein de Direitos Humanos da Universidade de Nova York e a Global Justice Clinic, em resposta a este e outros ataques – que foram documentados em anos recentes por grupos de defesa de direitos e de pesquisa tecnológica, como a Anistia Internacional [7] e o The Citizen Lab [8]da Universidade de Toronto –, estão tomando medidas judiciais [7] para que a empresa deixe de vender esse tipo de software, exigindo que o Ministério da Defesa de Israel revogue a licença de exportação da NSO Group.
Em sua petição, argumentam que a NSO Group viola direitos humanos internacionais ao permitir que governos mirem ativistas de direitos humanos, em vez de ajudá-los unicamente no “combate ao crime e ao terrorismo”, como estabelecido em seu contrato de licença.
A NSO Group também está sendo processada por pessoas que a acusam de ajudar os governos do México e dos Emirados Árabes Unidos a vigiar membros da sociedade civil. No final do ano passado, um dissidente saudita que vive no Canadá moveu uma outra ação [4], alegando que o software possibilitou que autoridades da Arábia Saudita espionassem suas conversas com o jornalista Jamal Khashoggi anteriores ao seu assassinato, em outubro de 2018, no consulado saudita em Istambul.
Dica de segurança: como proteger o seu dispositivo e atualizar o WhatsApp [9]
Países e empresas assinam o “Apelo de Christchurch” para frear o extremismo violento na internet
Líderes governamentais, empresas de tecnologia e especialistas da sociedade civil encontraram-se em Paris [10] no dia 15 de maio para discutir o papel da internet na preservação da segurança pública e dos direitos humanos após os ataques [11] em duas mesquitas de Christchurch, na Nova Zelândia, em março de 2019. Vários desses governos e empresas posteriormente assinaram um documento não vinculante chamado de “Apelo de Christchurch”, um conjunto de princípios e compromissos referentes à criação e à distribuição de conteúdo violento viral na rede mundial de computadores.
Encabeçado pelo governo da Nova Zelândia, o Apelo de Christchurch [12] tem como objetivo ser “coerente com os princípios de uma internet livre, aberta e segura, sem comprometer os direitos humanos e as liberdades fundamentais, incluindo a liberdade de expressão”, e determina que qualquer regulamentação decorrente dele deverá seguir os padrões internacionais de direitos humanos. O documento também encoraja as empresas digitais a serem mais transparentes em relação às suas políticas e procedimentos para remover (e para requerer a remoção de) conteúdo violento.
Google, Facebook, Twitter e Amazon juntaram-se ao acordo. Além da Nova Zelândia e de diversos países da União Europeia, Austrália, Canadá, Índia, Indonésia, Japão e Senegal também o assinaram. Os Estados Unidos se recusaram a assiná-lo [13], com a Casa Branca mencionando o seu “respeito à liberdade de expressão e à liberdade de imprensa”.
Somália bloqueia redes sociais durante provas escolares
O governo da Somália anunciou que irá cortar o acesso [14] às redes sociais entre os dias 27 e 31 de maio, numa tentativa de prevenir que estudantes secundaristas colem nas provas de final de ano. A semana de provas tinha sido adiada no começo de maio após a descoberta de que as respostas dos exames tinham sido vazadas na internet. O secretário de educação fez o anúncio [15] na televisão estatal no dia 13 de maio, sem oferecer detalhes sobre quais sites seriam bloqueados.
O diretor adjunto da Anistia Internacional para a África Oriental, Seif Magango, criticou a medida [16], argumentando que as autoridades somalis deveriam “buscar meios de assegurar a integridade dos exames sem recorrer a medidas retrógradas que restringem o acesso à informação e à liberdade de expressão”.
Singapura aprova lei contra fake news
O parlamento da Singapura aprovou [17] a Lei de proteção contra falsidades e manipulações on-line [18] no dia 8 de maio de 2019. Conhecida como lei anti-fake news, ela dá amplos e irrestritos poderes aos ministros do governo para forçar administradores de sites, provedores de acesso à internet e até mesmo grupos de chat privados [19] a imediatamente corrigirem ou removerem “notícias falsas”. Mas a forma como a lei define o que é considerado falso ou fake é extremamente imprecisa.
Em uma carta ao primeiro-ministro da Singapura, o relator especial da ONU para a promoção e a proteção do direito à liberdade de opinião e expressão, David Kaye, escreveu [20]:
“Tenho a preocupação de que a definição excessivamente abrangente de falsidade levará à criminalização e à supressão de uma ampla gama de condutas expressivas, incluindo críticas ao governo e à manifestação de opiniões impopulares, controversas ou minoritárias”.
Dois homens em Bangladesh são presos por publicações não violentas no Facebook
Dois homens em Bangladesh foram presos [21] após serem processados devido a publicações que escreveram no Facebook. Um deles, Henry Swapon, criticou um bispo da região. O outro, Imtiaz Mahmood, comentou sobre conflitos étnicos no país, na região de Chittagong.
Swapon agora enfrenta acusações com base na Lei de segurança digital [22], aprovada em 2018, que criminaliza [23] diversos tipos de discurso on-line, desde mensagens difamatórias até declarações que “ofendam valores ou sentimentos religiosos”.
Novas investigações
- Data Protection and Digital Agency for Refugees [24] – Dragana Kaurin, World Refugee Agency
- Burned After Reading: Endless Mayfly’s Ephemeral Disinformation Campaign [25] – Citizen Lab
Assine o Netizen Report [26]
Afef Abrougui [27], Ellery Roberts Biddle [28], L. Finch [29], Rezwan Islam [30], Mong Palatino [31] e Taisa Sganzerla [32] contribuíram nesta edição.