O Netizen Report da Global Voices apresenta um panorama dos desafios, conquistas e novas tendências dos direitos digitais no mundo. Este relatório abrange notícias e eventos de 16 de novembro a 1.º de dezembro de 2018.
O assassinato do jornalista saudita Jamal Khashoggi em outubro de 2018, que segundo autoridades dos EUA e da Turquia foi morto por ordem do príncipe herdeiro Bin Salman, lançou uma nova luz sobre muitos casos de abusos aos direitos humanos que vêm acontecendo no reino.
Um dos temas mais iminentes para os ativistas no reino de Bin Salman é o antiquado sistema patriarcal de tutela masculina da Arábia Saudita, segundo o qual a mulher deve ter o consentimento de um tutor se quiser se casar, alugar um apartamento, solicitar passaporte ou viajar para fora do país. Várias defensoras proeminentes dos direitos das mulheres foram presas por participarem de campanhas on-line contra o sistema de tutela.
Uma delas, Eman Al-Nafjan, autora do blogue Saudiwoman (Mulher saudita), no qual escrevia sobre os direitos das mulheres, questões sociais e compreensão cultural no reino. Al-Nafjan está detida desde meados de maio de 2018, depois que as autoridades sauditas a detiveram e a mantiveram incomunicável em local não revelado, junto com outras duas ativistas.
A outra é Samar Badawi, uma incansável defensora dos direitos das mulheres que foi detida e investigada várias vezes pelas autoridades sauditas, e presa em 30 de julho de 2018. Ela está detida desde então, sem acusação. Badawi é irmã do blogueiro Raif Badawi, que em 2014 foi condenado a 10 anos de prisão e 1.000 chicotadas por acusações de apostasia relacionadas ao Sauditas Liberais Livres, um site que ele criou para promover o debate público.
No final de novembro, a Anistia Internacional recebeu denúncias de tortura, incluindo flagelação e assédio sexual de ativistas presos na Prisão de Dhahban, onde al-Nafjan e Badawi estão detidos.
A discriminação religiosa também é uma questão prioritária para os defensores da Arábia Saudita. Israa Al-Ghomgham e seu marido, o ativista Mousa Al-Hashim, foram presos em 2015 por atos em protestos contra o governo em 2011. Ambos usaram ferramentas on-line e off-line para defender os direitos da minoria xiita na Arábia Saudita.
Hoje, Al-Ghomgham está enfrentando acusações como, por exemplo, a de preparar, enviar e armazenar material que prejudicaria a ordem pública, de acordo com o Artigo 6 da Lei de Cibercrime. Ela também é acusada de incitar manifestações e jovens contra o estado e forças de segurança em sites de redes sociais, e de publicar fotos e vídeos dessas manifestações on-line. Os promotores estaduais que trabalham no caso querem a pena de morte.
Para cidadãos sauditas que comentam sobre o estado de direito, as violações dos direitos humanos e outros assuntos de interesse público, a internet e os serviços das redes sociais são plataformas críticas, pois é quase impossível, se não incrivelmente perigoso, falar sobre esses assuntos em outros espaços. Se Israa Al-Ghomgham for condenada na Lei de Cibercrime, o preço por se expressar on-line ficará mais claro do que nunca.
Autoridades chinesas perseguem usuários do Twitter
Nos últimos meses, a polícia na China vem ameaçando usuários do Twitter e exigindo que removam certos tuítes politicamente sensíveis ou excluam suas contas, de acordo com relatórios recentes da AFP e da China Change.
Enquanto o Twitter é bloqueado pelo chamado Projeto Escudo Dourado da China, um pequeno grupo de ativistas e comentaristas experientes da internet mantêm contas no Twitter usando VPNs e outras ferramentas para burlar a censura. Entre as contas do Twitter excluídas estava a do proeminente organizador da sociedade civil on-line Wu Gan, e antigo defensor dos direitos humanos na China.
Em um ensaio apaixonado, no qual descreve a importância das contas do Twitter como a de Wu e pede ao Twitter que restabeleça sua conta, o colaborador da China Change, Yaxue Cao, escreveu:
Twitter became a safe haven for him and other human rights activists. There, they didn’t have to worry about their accounts being deleted, and they expressed their thoughts freely and left a record of their activities and thoughts – Twitter was their open diary.
O Twitter tornou-se um porto seguro para ele e outros ativistas dos direitos humanos. Lá, não precisavam se preocupar com a exclusão de suas contas, expressavam seus pensamentos livremente e deixavam um registro de suas atividades e pensamentos. O Twitter era o diário aberto deles.
Bangladesh bloqueia o Skype, mas com qual finalidade?
A Comissão de Regulamentação de Telecomunicações de Bangladesh começou a bloquear o Skype em 18 de novembro. O Dhaka Tribune e o Daily Star informaram que o bloqueio parece ter sido desencadeado pelas atividades do Partido Nacionalista de Bangladesh. O presidente em exercício do partido, Tarique Rahman, aparentemente havia entrevistado possíveis candidatos para ingresso no partido via Skype. Rahman vive exilado no Reino Unido desde 2008, quando fugiu do país após ser condenado por várias acusações de corrupção, lavagem de dinheiro e envolvimento com a violência política.
Embora o bloqueio possa impedir que Rahman, e todos os outros em Bangladesh, usem o Skype, outros serviços de voz por IP permanecem acessíveis no país.
A nova lei de proteção de dados da Espanha “legalizará” a Cambridge Analytica?
A nova lei de proteção de dados da Espanha, aprovada pelo Senado em 21 de novembro, permitirá que os partidos políticos criem perfis ideológicos de cidadãos usando informações extraídas de páginas da internet e de redes sociais. Será permitido o uso de informações de contato privadas que existam nesses mesmos sites para enviar publicidade política através de canais de comunicação privados, tais como e-mail e SMS.
Embora grande parte da lei tenha por objetivo colocar a Espanha em conformidade com o Regulamento Geral de Proteção de Dados da União Europeia (GDPR), dispositivos como este não se enquadram na GDPR, que se aplica a empresas e organizações privadas, mas não a partidos políticos. Falando com o jornal espanhol El Diario, a defensora da liberdade de expressão Yolanda Quintana disse que a lei “transformará dados pessoais em mercadoria eleitoral” e que legalizará efetivamente as práticas de empresas como a Cambridge Analytica.
Sob a Lei de TI da Indonésia, o Supremo Tribunal Federal favorece o assédio sexual
Uma professora indonésia foi condenada a seis meses de prisão e multa de 500 milhões de rupias (quase US$ 34.000 ou R$ 131.429) pelo Supremo Tribunal da Indonésia, no início de novembro, por registrar um telefonema sexualmente explícito que recebeu do diretor da escola que a assediava no trabalho.
Depois que a gravação circulou em um grupo do WhatsApp, e o diretor soube, ele entrou com uma denúncia de difamação contra Nuril. Isso levou à sua condenação sob dois artigos da Lei de Transações e Informações Eletrônicas da Indonésia, um deles trata de difamação on-line e o outro criminaliza a produção ou distribuição de “conteúdo pornográfico” on-line.
A prisão de Nuril foi temporariamente suspensa após protestos on-line e apelos públicos às autoridades federais, mas não há indicação de que a sentença será revogada.
Novas investigações
RECKLESS VI: Mexican Journalists Investigating Cartels Targeted with NSO Spyware Following Assassination of Colleague – Citizen Lab
‘Fake News’, Disinformation and Media Trust in Africa: A Comparative Study of Kenya, Nigeria and South Africa – Herman Wasserman and Dani Madrid Morales
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Afef Abrougui, Ellery Roberts Biddle, L. Finch, Rohith Jyothish, Rezwan Islam, Oiwan Lam, Georgia Popplewell, Elizabeth Rivera e Juke Carolina Rumuat contribuíram nesta edição.