Libertem Nganang: escritor camaronês detido em prisão de segurança máxima em Iaundé

 

Patrice Nganang na Feira do Livro de Paris, por Georges Seguin CC BY-SA 3.0

O escritor Patrice Nganang foi preso na quarta-feira, 6 de dezembro, em Duala, na República dos Camarões, por publicar um artigo on-line sobre a visita que fez ao seu país natal. O seu relato revelou a situação tensa em uma região acusada pelo presidente do país, Biya, de servir como base para grupos terroristas.

A crise na região anglófona começou no final de 2016, quando representantes queixaram-se da sub-representação de suas regiões nas principais instituições do país, tais como universidades e órgãos governamentais. Vinte por cento da população de Camarões fala inglês, enquanto o restante fala, principalmente, francês.

A crise aprofundou-se com a greve de advogados e professores anglófonos, que exigiam mais respeito à língua inglesa como idioma oficial do país a ser utilizado em todos os documentos oficiais. Em outubro de 2017, protestos provocaram uma onda de violência, que causou a morte de, pelo menos, 17 pessoas.

Patrice Nganang é bem conhecido por seu posicionamento incisivo a respeito de diferentes questões das sociedades africana e camaronesa. Por exemplo, o seu livro Contre Biya (“Contra Biya”) encoraja os jovens camaroneses a demonstrarem sua cidadania”. Nganang escreveu:

We don't need to teach courage to the young.  They already have it.  I see so many people go to prison for their ideas.  To accept tyranny is to abdicate.

Não precisamos ensinar coragem aos jovens. Eles já têm. Vejo muitas pessoas irem para a prisão por seus ideais. Aceitar a tirania é desistir.

Nganang também questionou assuntos atuais em outros países africanos, inclusive a decisão de ativistas da sociedade civil, como a de Aminata Traoré (Mali), de ir a público em defesa de argumentos favoráveis ao golpe de Estado entre os militares.

Patrice Nganang foi detido no aeroporto de Duala, na República dos Camarões, quando estava prestes a embarcar para Harare, capital do Zimbábue. Ele enfrenta acusações de ameaças contra o Presidente da República, imigração ilegal e fraude.

Uma campanha de solidariedade está sendo organizada para o escritor e ativista nas redes sociais. Uma petição exigindo a sua libertação imediata foi publicada por um grupo de escritores e já contava com 6.992 assinaturas em 15 de dezembro. Uma plataforma de crowdsourcing também foi criada para ajudar os seus amigos a pagarem os honorários advocatícios.

O vídeo a seguir da Al Jazeera, divulgado em 13 de dezembro de 2017, sintetiza os fatos que provocaram a prisão do escritor:

A petição elaborada por um grupo de escritores, em sua maioria africanos, descreve a influência e a personalidade de Nganang:

Critique féroce et conscience qui ne s’agenouille pas, il a fondé le mouvement « Génération Change » et entreprend depuis plusieurs années tout un travail aussi bien sur le terrain que dans son écriture, dénonçant les immobilismes, fustigeant les pouvoirs corrupteurs. On peut le traiter de fou, on peut ne pas être d’accord avec lui mais il est inacceptable de continuer à traiter ainsi ceux, artistes, écrivains ou autres, qui accomplissent ce qu’ils croient être juste, un devoir citoyen de sortir son pays du marasme où il se trouve.

Um crítico feroz e determinado fundou o movimento ‘Geração de Mudanças’ e, durante alguns anos, trabalhou em lugares distantes, tanto por intervenção direta quanto por meio de sua escrita, denunciando o impasse político e criticando a corrupção no poder. Podem chamá-lo de louco ou discordar dele, mas é inaceitável que continuem a tratar dessa maneira artistas, escritores e outros que exercem, a partir do que acreditam ser justo, o dever cívico legítimo para retirar seu país da apatia em que se encontra atualmente.

Boris Bertolt, jornalista camaronês do Actu Cameroun (jornal de notícias de Camarões em inglês) e amigo do escritor, enviou a ele a seguinte carta aberta:

Voilà bientôt une semaine que tu as été kidnappé dans des conditions grotesques et es détenu par l’appareil répressif et oppressif de la plus vieille tyrannie d’Afrique. Quand je pense tous les jours, toutes les nuits à toi, à ta douleur, à ta souffrance. J’ai mal de mon impuissance de te sortir par tous les moyens des bras de la tyrannie. Le Cameroun a véritablement besoin d’intellectuels engagés résolument au service du peuple, des opprimés. Au Cameroun, tu appartiens à cette catégorie. Les intellectuels libérateurs. Ceux-là qui sacrifient leur temps, énergie, leur argent, la famille, les enfants pour construire le changement.

Em breve fará uma semana desde que você foi sequestrado em condições brutais, preso pela máquina opressiva e repressiva da antiga ditadura da África. Quando penso dia e noite em você, na sua dor, no seu sofrimento, é com peso na consciência pela minha incapacidade de libertá-lo, por quaisquer meios, das mãos da ditadura. A República dos Camarões precisa de intelectuais determinados e comprometidos a serviço do povo e dos oprimidos. Em Camarões, você pertence àquela categoria: intelectuais liberacionistas. Aqueles que sacrificam seu tempo, sua energia, seu dinheiro, suas famílias e seus filhos para fazer mudanças.

Jean-Michel Devésa, professor de Literatura Francesa na França, também escreveu uma carta aberta, dirigida ao presidente francês Emmanuel Macron:

Sa famille et ses proches sont sans aucune nouvelle de lui. Le sort de ce collègue avec lequel je travaille et que j’ai édité cette année m’inquiète au plus haut point. Je vous demande par la présente de faire en sorte que notre pays interroge par voie diplomatique, et selon les usages, la Présidence camerounaise afin d’avoir des nouvelles de Patrice Nganang, de savoir s’il est sain et sauf, et de connaître son lieu de détention s’il est détenu.Je vous prie en outre de faire le nécessaire pour que Patrice Nganang soit libéré sans plus attendre, attendu que sa « disparition » et le cas échéant sa détention arbitraire porte atteinte à ses droits fondamentaux.

Sua família e seus amigos não têm nenhuma notícia dele. O destino de um de meus colegas de profissão, cujo trabalho tive o privilégio de editar este ano, preocupa-me profundamente. Rogo ao senhor, por meio desta carta, que consiga junto ao presidente de Camarões alguma explicação, através de todos os canais diplomáticos usuais à disposição em nosso país, e que notícias de Patrice Nganang sejam divulgadas. Dessa forma, poderíamos saber se ele está são e salvo, além do lugar em que está preso, se esse for o caso. Peço ainda que faça o possível para garantir a imediata liberdade de Patrice Nganang, considerando que seu ‘desaparecimento’ e sua prisão arbitrária, se for esse o caso, violam seus direitos básicos.

Foi confirmado que Nganang está detido na prisão de segurança máxima de Kondengui, em Iaundé, na República dos Camarões.

Alguns usuários do Twitter expressaram preocupação através da hashtag #freengagang. A influente especialista técnica de Camarões, Rebecca Enonchong, escreveu:

Gente, isso pode acontecer com qualquer um de nós amanhã! Quando o Estado começa a silenciar os intelectuais, ele silencia a verdade. Vamos defender @nganang!

Julie Owono, colaboradora camaronesa da Global Voices, também escreveu:

Patrice @nganang – escritor, professor e ativista camaronês – foi preso em Duala, nos Camarões, e levado para local desconhecido. Essa importante voz da #criseanglófona deve ser libertada.

 

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