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Assassinato de mulher transexual em Trinidad e Tobago ressalta o ostracismo enfrentado pela comunidade LGBTQ

Categorias: Caribe, Trindade e Tobago, Direitos Humanos, Direitos LGBT, Lei, Mídia Cidadã, Mídia e Jornalismo
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Captura de tela do vídeo do Friends4LifeTT, em que Sasha Fierce fala sobre alguns dos desafios que pessoas transexuais enfrentam em Trinidad e Tobago.

Na noite de 5 de dezembro de 2017, uma mulher transexual foi assassinada [2] em um parque em Porto de Espanha, Trinidad, um país onde o sistema legal não inclui [3] nenhum elemento pelo qual uma pessoa possa mudar sua identidade sexual. O nome “legal” da vítima estava registrado como Keon Patterson, mas ela era conhecida pelo nome Sasha Fierce (inspirada pela cantora americana Beyoncé [4]), a qual se posicionava como firme defensora da comunidade transexual local e como porta-voz do HIV.

Fierce aparece no vídeo do Friends4LifeTT [1], publicado no YouTube em agosto de 2017, que explora como é ser uma pessoa transexual em Trinidad e Tobago. As notícias apontam [5] que dois homens atiraram e mataram Fierce, e que eles foram chamados pela polícia para interrogatório.

Embora Trinidad e Tobago esteja acostumada com crimes violentos, o assassinato de Fierce levantou questões acerca do modo como lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e queer (LGBTQ) são tratados nas sociedades caribenhas. Essa república insular nem sempre mostrou tolerância [6] para a fluidez de gênero, como é o caso de outras nações insulares, como a Jamaica, que tem demonstrado rotineiramente [7] uma falta de compreensão sobre a comunidade LGBTQ.

Usuários de redes sociais expressaram suas críticas. Lara Quentrall-Thomas lamentou [8]:

This wonderful human being, who cared so much for others, died for no reason .. other than perhaps, being different. Trinidad has reached a new low.

Este ser humano maravilhoso, que se importava tanto com os outros, morreu por nenhum motivo além de, talvez, ser diferente. Trinidad atingiu um nível ainda mais baixo.

Os comentários iam desde chamar o país de “terceiro mundo” [9] até criticar o governo [10] por “não promulgar leis para proteger todos os cidadãos”, dizendo que “é lamentável e de partir o coração que os membros da comunidade LGBT não possam ser quem são”.

A sodomia é crime em Trinidad e Tobago, mas isso não se traduziu [11] em nenhum caso pendente de sexo homossexual consensual. A lei, portanto, é apenas um aspecto do problema; as atitudes sociais profundamente arraigadas tendem a ter um maior impacto no dia a dia das vidas das pessoas LGBTQ no território caribenho.

Tais atitudes são quase sempre influenciadas por declarações religiosas [12] conservadoras sobre minorias sexuais e de gênero. A parcialidade se infiltrou tanto nas mídias tradicionais quanto nos comentários em redes sociais sobre o assassinato, os quais a Coalizão de Defesa para Inclusão de Orientação Sexual [13] (CAISO, na sigla em inglês) disse [14] que se “acrescentaram à violência” [15].

Isso ocorre apesar das tentativas [16] de discussão há alguns anos sobre como a mídia deveria noticiar imparcial e responsavelmente as questões que afetam a comunidade LGBTQ. Em alusão à uma série de televisão de 2015 que acompanhava o dia a dia da vida de uma mulher transexual que vivia em Trinidad e Tobago, o usuário do Facebook, Daniel Khairi, comentou [17]:

This makes me anxious and the preview questions are awful. Trans people are always subject to ‘why’ and ‘what's in between your legs.’ I have no faith that [the television station] will do right by this woman.

Isso me preocupa e as perguntas são horríveis. Pessoas trans sempre são submetidas a “por que” e “o que têm no meio das pernas”. Eu não acredito que esse canal de televisão esteja fazendo o correto com essa mulher.

Por anos, este tem sido um sentimento comumente expressado:

A falta de educação sobre a comunidade transexual em Trinidad vê comentários como esses.

A CAISO, por sua vez, não demonstrou ignorância. Em uma série de posts em sua página do Facebook, a organização criticou [25] como as mídias locais e internacionais lidaram com a história [26]:

Three things NOT to do when a transwoman is murdered: 1) Don't send the media dehumanising pictures of her dead body to publish. 2) Don't make her death about you. 3) Don't fundraise for your hotel room.

Três coisas que não devem ser feitas quando uma mulher transexual for assassinada: 1) Não envie à mídia fotos desumanizadoras de seu corpo para publicação. 2) Não faça da morte dela algo sobre você. 3) Não arrecade fundos para pagar seu quarto de hotel.

A referência é um golpe de Jason Jones, um ativista de Trinidad que vive no Reino Unido, que está contestando as leis de sodomia da ilha como inconstitucionais em um caso que será ouvido em 30 de janeiro de 2018 na Suprema Corte de Porto de Espanha. Jones, que foi entrevistado em um artigo sobre o assassinato de Fierce para a Gay Star News [26], está tentando arrecadar fundos [27] para suportar os custos da contestação legal.

Em outro post, a CAISO elogiou [28] um jornal local [29] por “corrigir sua história anterior (que chamou Sasha de “homem transexual”) e trocar os pronomes para o feminino. A história atualizada também omitiu a especulação sobre trabalho sexual.”

O mesmo jornal, o Trinidad and Tobago Newsday, publicou uma segunda história [30] dizendo que os amigos de Fierce “estão com receio de lamentar sua morte publicamente” por medo de serem atacados, mas o usuário do Facebook, Andre Bagoo, foi firme [31]:

Sasha Fierce is dead bt hear this: freedom is not. We will not be afraid. We will not cower in our homes. We will marry the night.

Sasha Fierce está morta, mas ouçam: a liberdade não está. Nós não teremos medo. Nós não nos fecharemos em casa. Nos casaremos com a noite.

Um memorial [32] para Fierce foi feito em 8 de Dezembro de 2017.