Filipinas: grupos de direitos humanos pedem que Apple rejeite games glorificando guerra antidrogas do presidente Duterte

Captura de tela do game Fighting Crime 2.

Mais de 130 organizações em todo do mundo assinaram uma petição exigindo que a Apple retire de sua loja de aplicativos uma série de jogos para dispositivos móveis que exaltam a “guerra das drogas” nas Filipinas.

Endereçada a Tim Cook, presidente da Apple, a petição foi criada e disseminada pela Asian Network of People Who Use Drugs (AMPUD), uma organização baseada na Tailândia cujo objetivo é defender e promover a proteção dos direitos humanos e a saúde dos usuários de drogas.

A petição afirma que tais jogos violam políticas da Apple, pois promovem a violência contra seres humanos e animais, e exige que a empresa faça uma revisão formal dos aplicativos inspirados em Duterte, além de retirar aqueles que fomentem a violência contra usuários de drogas e peça desculpas por hospedar tais aplicativos.

A guerra das drogas de Duterte

Desde que assumiu o poder em 30 de junho de 2016, o presidente filipino Rodrigo Duterte transformou a campanha antidrogas em uma prioridade de seu governo.

Mas as operações antidrogas feitas pela polícia (conhecidas como Oplan Tokhang) logo se tornaram notórias, pois levaram a milhares de mortes de suspeitos por tráfico. A polícia registrou 6.000 mortes relacionadas a drogas, mas alguns grupos de direitos humanos dizem que o número é muito maior, chegando a 13.000. Até a comunidade internacional expressou preocupação com o aumento no número dessas mortes no país.

O governo Duterte foi acusado por vários grupos de direitos civis de endossar a impunidade ao prometer proteção à polícia, incluindo os envolvidos em mortes extrajudiciais.

Alguns dos leais eleitores de Duterte demonstraram apoio desenvolvendo games para dispositivos móveis inspirados na Oplan Tokhang. Tais jogos apresentam Duterte e o chefe de polícia do país combatendo criminosos e personalidades envolvidas com drogas.

Alguns dos games inspirados em Duterte disponíveis na Apple. Foto do site Asian Network of People Who Use Drugs

Jogando games de guerra

Em outubro de 2016, o Global Voices reportou que um desses games, Fighting Crime, havia atingido dois milhões de downloads. Fighting Crime, desenvolvido pela Tatay Games, permite que o jogador assuma o papel de Rody (apelido de Duterte). O objetivo do jogador é matar criminosos com uma variedade de armas e poderes especiais. O jogo acaba se o presidente for alcançado pelos inimigos antes que mate todos eles.

Outro jogo, o Tsip Bato: Ang Bumangga Giba! foi desenvolvido pela Ranida Games, com apoio do Grupo de Relações Comunitárias da Polícia, um grupo pertencente à Polícia Nacional filipina. Os jogadores podem fazer o papel do chefe Ronald “Bato” Dela Rosa ou do presidente Duterte, guiando uma viatura de polícia e atirando ou atropelando criminosos que espreitam nas ruas.

O ato de atropelar inimigos no jogo lembra de modo assustador a maneira pela qual uma viatura policial atropelou manifestantes de minorias nacionais e indígenas em frente à embaixada dos Estados Unidos no ano passado.

Captura de tela do aplicativo Tsip Bato: Ang Bumangga Giba!.

Duterte vs Zombies, um game desenvolvido por Lemuel Levi Caldito, vincula a guerra das drogas de Duterte a um apocalipse zumbi. Os jogadores controlam o personagem “Tatay Digong” (apelido carinhoso do presidente usado por seus apoiadores que literalmente significa “Pai Duterte”) enquanto enfrenta criminosos apresentados como zumbis sedentos por sangue e acéfalos.

Captura de tela de Duterte vs. Zumbis.

Na carta aberta, os defensores de direitos destacam alguns desses temas, censurando a cumplicidade da Apple na normalização de mortes extrajudiciais e impunidade. Os peticionários lembraram à empresa que os games podem ser divertidos, mas também difundem uma perigosa mensagem:

These games valorize and normalize the emerging tyranny of Duterte's presidency and his government's disregard for human rights principles….these games may seem harmless and fun, but when they are placed within the context of existing realities, of real murders of people and the impunity of law enforcement, then these games become offensive and distasteful.

[…]

It is unacceptable that Apple is tolerant to making profit out of people’s unjust deaths and misery.

Esses jogos valorizam e normalizam a tirania emergente da presidência de Duterte e o desprezo de seu governo pelos princípios dos direitos humanos… Esses jogos podem parecer inofensivos e divertidos, mas quando colocados dentro de um contexto de realidades existentes, de mortes reais de pessoas e da impunidade da polícia, aí se tornam ofensivos e repugnantes.

[…]

É inaceitável que a Apple seja tolerante e obtenha lucro com a morte injusta e a infelicidade das pessoas.

A carta também argumenta que os games violam às Diretrizes da loja de aplicativos da Apple, que inclui a proibição de conteúdo censurável e violência. De fato, as diretrizes proíbem “retratações realistas de pessoas ou animais sendo mortos, mutilados, torturados ou abusados, ou de conteúdo que incentive a violência” (seção 1.1.2). Os jogos inspirados em Duterte também estão disponíveis na Google Play Store.

Entre os signatários da petição estão 131 grupos de direitos humanos, centros de reabilitação e outras redes de defesa de mais de 30 países, incluindo Austrália, Camboja, França, Índia, Indonésia, Nepal, Holanda, Paquistão, Romênia, Singapura, Sri Lanka, Tailândia, Reino Unido e Estados Unidos, entre outros.

Esta campanha contra os aplicativos de jogos inspirados no presidente das Filipinas chega em meio a protestos crescentes não só contra as mortes, mas também contra a ameaça do presidente de declarar Lei marcial se grupos de oposição continuarem a promover atividades de desestabilização contra o governo.

O protesto público contra os excessos cometidos pela Oplan Tokhang forçou a polícia a declarar o fim da campanha no início de outubro. A campanha antidrogas é agora chefiada pela Agência de Combate às Drogas das Filipinas.

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