A história da Síria tem sido transmitida de geração em geração de um milênio a outro. Subjugada como província romana sob o comando de Pompeu Magno em 64 A.C., e controlada pelo regime otomano do Sultão Selim I 16 séculos mais tarde, em 1516, o país tem experimentado as maiores conquistas militares do mundo. Os impérios que disputavam o domínio da região deixaram um legado arquitetônico e cultural variado, que foi transformado em patrimônio nacional. Para os sírios, a experiência de saborear as especiarias nos souqs de Aleppo, ou admirar a joia que é o teatro romano em Bosra, é um direito de nascença.
Os lugares históricos da Síria têm confirmado sua fascinante história, mas a sua pulverização ao longo de uma guerra de seis anos que já custou mais de 400.000 vidas e o deslocamento de mais da metade da população do país sugere que os futuros sírios, e o mundo em geral, poderão ser privados de sua longa história.
Os souqs de Alepo
A Cidade Antiga de Alepo, declarada como Patrimônio da Humanidade pela UNESCO em 1986, sempre foi lugar de um centro comercial vibrante, onde rotas comerciais do oriente e do ocidente se encontravam, situada estrategicamente entre o Mar Mediterrâneo e a Mesopotâmia. Sua importância histórica é atribuída a sua localização em um dos extremos da Rota da Seda.
Uma das cidades habitadas mais antigas do mundo, ela tem sofrido uma das mais terríveis atrocidades da guerra.
Com a iminente queda da então sitiada parte oriental da cidade em dezembro nas mãos do regime de Assad e seus representantes, ativistas locais expressaram sua luta para contar diariamente o número de mortos.
De acordo com o Instituto das Nações Unidas para Treinamento e Pesquisa (UNITAR), 22 locais históricos declarados como patrimônio foram destruídos e 48 severamente danificados a partir de 2013.
No agitado souq de Al-Madina, era possível encontrar uma variedade colorida de produtos importados, desde seda até especiarias, além de produtos locais como sabonete e lã. Além do comércio, os souqs também eram o lar dos Khans (caravançarais), que acomodavam comerciantes junto com seus bens.
No final de 2012, ocorreram intensos combates entre o regime e o Exército Livre da Síria (FSA) na região do souq. O regime atacou o lugar histórico usando morteiros, o que deixou o local em chamas.
Apesar de a UNITAR ter declarado que a maioria das lojas foi totalmente destruída, um esperançoso cidadão de Alepo declarou ao The Telegraph em 2012:
É terrível e muito triste, mas podemos reconstruí-lo quando a revolução estiver acabado.
A Cidadela de Alepo
A Cidadela de Alepo é um castelo medieval fortificado, localizado no coração da cidade velha e é considerado um dos maiores e mais antigos do mundo. Esse monumento de calcário esteve sob o domínio dos bizantinos, gregos, aiúbidas, otomanos, entre outros. Cada um desses conquistadores deixou sua própria marca na arquitetura no castelo.
O regime de Assad bombardeou continuamente a cidadela desde 2012, e em julho de 2015 a explosão de uma bomba derrubou parte das muralhas.
Tanto o regime sírio como grupos rebeldes se acusaram mutualmente pela explosão.
A Grande Mesquita de Alepo (Mesquita Omeya)
O historiador alepino do século XV, Ibn al-Shihna, certa vez escreveu: “A Grande Mesquita de Alepo rivaliza com a de Damasco quanto a decoração, pinturas e mosaicos”.
A Grande Mesquita de Alepo, também conhecida como a Mesquita Omeya, que teve o seu espetacular minarete construído em 1090 e durou cerca de mil anos, foi destruída em 2013.
A Mesquita Omeya compartilha muitas características com a de Damasco, desde o pátio de mármore até a localização em um lugar romano/bizantino.
O regime sírio, apoiado por seus aliados russos e iranianos, almejou persistentemente a mesquita durante a batalha pelo controle da cidade após a sua captura pelas forças rebeldes em 2012.
#Syria: Umayyad Mosque of #Aleppo is one of the oldest mosques in the city, dating back to the 8th century, destroyed during clashes. pic.twitter.com/hjdd9J9APd
— Rudaw English (@RudawEnglish) December 14, 2016
Um combatente rebelde foi testemunha e recordou:
Nos estávamos aqui hoje e de repente bombas começaram a atingir o minarete. [O exército] então tentou assaltar a mesquita, mas nós os impedimos.
De acordo com a avaliação da UNITAR, a mesquita sofreu dados severos no muro externo do lado oriental, na parte sul da galeria oriental, no pátio de mármore, no jardim e na entrada do souq desde a galeria oriental.
Helga Seeden, professora de arqueologia da Universidade Americana de Beirute, disse à The Associated Press:
Isso é como explodir o Taj Mahal ou destruir a Acrópole em Atenas. Essa mesquita é um santuário vivo. É um desastre. Em termos de patrimônio, é a pior coisa que já vi na Síria. Estou horrorizada.
Mesquita Alomari, Daraa
Considerada um símbolo da revolução, a mesquita de Daraa foi construída no século VII pelo califa islâmico Omar ibn al-Khattab. Seu outrora maravilhoso minarete, agora destruído, foi o primeiro de todo o Levante.
A mesquita histórica tem sido o centro das manifestações antirregime em Daraa e local de muitos protestos, brutalmente reprimidos pelas forças de segurança do governo.
Foi principalmente por essa razão que o regime bombardeou incessantemente a mesquita, destruindo o minarete, na tentativa de destruir o ânimo dos manifestantes.
Em junho, helicópteros do regime sírio lançaram quatro bombas de barril carregadas com substâncias incendiárias na mesquita, o que provocou um incêndio na parte norte.
Bosra
Nas proximidades da cidade sulista historicamente rica está situado um grandioso teatro romano do século II, algumas das mais antigas mesquitas islâmicas e também ruínas cristãs. A cidade velha de Bosra, tombada como Patrimônio da Humanidade pela Unesco em 1980 e incluída na lista de Patrimônio Mundial em Perigo em 2013, foi um dia a capital da província romana de Arábia e escala para as caravanas que rumavam a Meca.
Esse lugar de imensa importância cultural foi bombardeado pelos helicópteros do regime em 2015, o que provocou graves danos à cidadela antiga.
Crac des Chevaliers
O Crac des Chevaliers, que significa “Castelo dos Cavalheiros”, é um castelo cruzado da província síria de Homs, também considerado Patrimônio Mundial pela Unesco e é considerado um dos mais importantes castelos medievais mais bem preservados no mundo. O castelo fortificado foi construído pela Ordem Hospitalar de São João de Jerusalém de 1142 a 1271, e posteriormente recebeu novas edificações pelas mamelucos no final do século XIII.
O castelo sofreu danos significativos, especialmente na capela cruzada, devido a uma série de bombardeios e ataques aéreos pelo regime sírio.
Palmira
A antiga cidade semita de Palmira prosperou durante o Império Romano graças aos seus proeminentes mercadores que operavam ao longo da Rota da Seda. Essa riqueza facilitou a construção de monumentos espetaculares, incluindo o Templo de Bel, Torre de Elahbel e o Arco do Triunfo. Infelizmente, todos os três monumentos têm sofrido danos e até mesmo destruição.
Desde a captura da cidade em 2015, o Estado Islâmico já explodiu um grande número de templos e outros monumentos.
O Estado Islâmico tem destruído muitas estruturas antiga como essa na cidade de #Palmira, #Siria. Leia mais em https://t.co/B5jNUIbsVI pic.twitter.com/RXvb3k30H3
— The Philos Project (@philosproject) 24 March 2017
A cidade que cativou os corações de historiadores e arqueólogos, Palmira agora provoca um sentimento de luto pela perda de seu patrimônio.
Mesquita Khalid ibn al-Walid
A mesquita Khalid ibn al-Walid em Homs recebe esse nome em homenagem ao comandante militar árabe muçulmano que liderou a conquista da Síria no século VII e encerrou o domínio bizantino no país. Consagrada em 1908, a mesquita é conhecida por seu estilo arquitetônico tradicional otomano-turco-otomano.
Em 2013, as forças de Assad bombardearam a histórica mesquita, e por fim destruíram seu mausoléu. Desde então a mesquita tem sido testemunha de ataques regulares.
#حمص #سوريا #Syria #Homs
جامع سيدنا خالد بن الولــيــد
Khleed Ibn Wl-Waleed Mosque
11 July 2013 pic.twitter.com/mn3TkWhP7O— عدسة شاب حمصي (@LensHomsi) 13 juillet 2013
#حمص #سوريا #Syria #Homs
مــســجد خالد بن الولــيــد
Homs City – Ibn Al-Waleed Mosque
18 September 2013 pic.twitter.com/cJhRYZwp3z— عدسة شاب حمصي (@LensHomsi) 18 septembre 2013