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Heroína lésbica e latina da Marvel causa polêmica

Categorias: América do Norte, Estados Unidos, Arte e Cultura, Direitos LGBT, Etnia e Raça, Literatura, Mídia Cidadã, Mulheres e Gênero
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As primeiras capas da série de história em quadrinhos da personagem América. Foto: Marvel Digital Comic Shop/Reprodução

No começo deste ano, uma nova série de história em quadrinhos foi lançada, estrelando América Chávez, a primeira mulher latina e lésbica a fazer parte do universo da Marvel.

Muitos leitores adoraram a notícia e disseram que a revista abrirá espaço para o diálogo sobre imigração, identidade e sexualidade, numa época de grande tensão política e social nos Estados Unidos.

Outros, no entanto, acreditam que a ênfase em identidade prejudicou a história.

A série em quadrinhos, protagonizada pela personagem América Chávez, não é centrada apenas na identidade, mas também na ideia de autodescoberta. Segundo o site da Marvel [1], América é mais do que uma heroína que luta contra o crime — ela acredita na importância da educação e do autoconhecimento: “O que uma adolescente com super poderes faz quando busca realização pessoal? Ela vai para a faculdade!”.

América Chávez. Ela é a única protagonista feminina lésbica da Marvel e uma das únicas mulheres homossexuais e afrodescendentes a ganhar uma revista com o seu nome.

Escrita pela romancista Gabby Rivera e ilustrada por Joe Quinones, a história causou burburinho na mídia online dedicada a temas gays e latinos [4]. Como citado pelo Huffington Post [5], os autores de América Chávez queriam que as ilustrações fossem cheias de referências culturais, incluindo ícones como Beatles e Celia Cruz. […] Tratamos de figuras de grande impacto na cultura norte-americana, sem nos esquecermos da intersecção de identidades”:

America Chavez will not be the only character in the book with an intersecting identity,” Rivera said. “She will not be the sole representation of queer people and women and Latinas. There will be communities of folks all around her testing their super powers and finding strength within themselves. We’ve been very intentional with reflecting different body types and gender presentations. Our characters are black, Afro-Latinx, Asian, mixed and everything in between — like literally running the gamut of melanin, you know?

‘América Chávez não será a única personagem na revista com mais de uma identidade’, Rivera afirmou. ‘Ela não será a única representante dos homossexuais, das mulheres e das latinas. Haverá muitas pessoas ao redor testando os próprios super poderes e força. Nós procuramos incluir tipos físicos e gêneros diversos. Nossas personagens são afrodescendentes, afro-latinas, asiáticas, miscigenadas e tudo mais — uma gama de variedade de etnias, entende?’

A autora revelou que, através da personagem, realizou o sonho de ver mulheres “como ela” — mulheres afrodescendentes complexas e com curvas em quadrinhos.

“Conte-me uma BOA HISTÓRIA com BONS PERSONAGENS!”

No entanto, a história e a personagem têm sido alvo de críticas e controvérsias. As primeiras edições receberam algumas resenhas negativas na internet, dizendo que a série em quadrinhos “valoriza o gênero em detrimento da história”. Comentários em vídeos opinativos [6] e artigos sobre a revista [7] apresentaram uma visão crítica do texto [8], argumentando que representar a sexualidade e a identidade cultural de América Chávez com tanta veemência prejudica a mensagem que se quer passar:

The dialogue was terrible, the Spanglish was racist (at best), the plot jumped around between various irrelevant points with little connection, the political commentary was a subtle as a sledgehammer, and there wasn't a single character with any sort of development (other than “random girlfriend whom the reader never gave a reason to care about broke up with the protagonist, in what might be one of the least realistic exchanges of dialogue ever written”).

The author is apparently hoping that “MINORITY LESBIAN YASSSS!!” will be enough to cover up for her complete inability to write either characters or plot lines, but this comic is so completely terrible in every aspect that I doubt she'll get away with calling everyone who points out its plethora of flaws “racist/homophobic”.

O diálogo é horrível, o espanglês racista (para não dizer coisa pior). A história gira em círculos, perdendo tempo com aspectos irrelevantes e aleatórios. Os comentários políticos são tão sutis quanto uma marretada. E, além de tudo, não há desenvolvimento de personagem (com exceção da ‘namorada aleatória que termina com a protagonista sem criar empatia com o leitor, resultando no diálogo menos realista do mundo’).

Aparentemente, o autor espera que a euforia ‘MINORIA LÉSBICA AÊÊÊÊ’ seja o suficiente para disfarçar a sua incapacidade de construir personagens e histórias, mas essa revista é tão ruim que duvido que acusar os leitores insatisfeitos de ‘racistas/homofóbicos’ vai colar.

Os problemas de representação foram muito discutidos por alguns usuários do YouTube [9], alegando que colocar certos aspectos da identidade acima de tudo não é o bastante para fazer o leitor se identificar com uma personagem:

As a Latina myself, I am disgusted and insulted by America Chavez. I'm supposed to love and identify with this character? On what grounds? […] Why should I care about her or her story? Because she's a Latina queer? So what? That doesn't make her interesting. There are Latina queers all over the place here. That's not unique at all. […] I DON'T CARE if the main character of a comic is the same race or gender as me! Tell me a GOOD STORY with GOOD CHARACTERS! If the story and characters are solid and well written, then it won't MATTER what race, gender, sexuality, or creed that character is! Labels don't make a character. CHARACTER makes a character! And America Chavez has ZERO CHARACTER.

Como latina, acho a América Chávez ultrajante e ofensiva. Espera, eu deveria me identificar e amar essa personagem? Com base em quê? […] Por que deveria me importar com ela ou a sua história? Por ser uma latina lésbica? E daí? Isso não faz dela interessante. Há latinas lésbicas em todo lugar por aqui, não tem nada de especial. […] NÃO ME IMPORTA se a personagem principal da revista em quadrinhos é da mesma etnia ou gênero que eu! Conte-me uma BOA HISTÓRIA com BOAS PERSONAGENS! Se a história e as personagens forem consistentes e bem desenvolvidas, não importa a etnia, o gênero, a sexualidade ou a religião da personagem! Rótulos não fazem uma personagem. PERSONALIDADE faz uma personagem! E América Chávez NÃO TEM PERSONALIDADE.

O canal do YouTube Latino, Pero Like (parceria com o BuzzFeed), também fez críticas esmagadoras sobre a personagem no vídeo “LatiNoticias”:

It's pretty fun that a character with the potential to excite so much hate from right-wing conservatives is literally named America. That's like if I named a new contraceptive Freedom Pills, or if her sidekick was a gender-nonconforming bald eagle. America Chavez was the third choice for the superhero's name after Marvel passed on “Uracis Ifudonlykme” [You’re racist if you don’t like me] and “Sue-Kit White Concervadores” [Suck it, white conservatives].

É irônico que uma personagem com o potencial de instigar o ódio de conservadores de direita tenha o nome de América. É como se eu chamasse um novo anticoncepcional de Pílulas da Liberdade, ou que o melhor amigo e parceiro da personagem fosse um transexual sem pelos. América Chávez foi o terceiro nome escolhido para a super-heroína, depois de a Marvel recusar “Uracis Ifudonlykme” [Você é racista se não gosta de mim] e “Sue-Kit White Concervadores” [Vão se danar, Conservadores Brancos].