“Em nome do povo” o novo sucesso da TV chinesa fala sobre corrupção

Imagem da série “Em Nome do Povo”

O popular drama político “Em Nome do Povo”, apelidado “House of Cards” chinês, alcançou oito por cento de audiência, a mais alta do continente asiático em uma década. Seus 55 episódios tiveram 22 bilhões de acessos on-line, desde seu primeiro episódio em 28 de março de 2017.

A série conseguiu, depois de uma década, vencer a proibição chinesa de dramas com temática de anticorrupção no horário nobre e é a primeira da televisão a retratar um assessor de um líder nacional como vilão.

O show conquistou o público ao retratar a luta interna pelo poder entre oficiais experientes do alto escalão do Partido Comunista e os seus estilos de vida secretos. Um servidor do Conselho de Estado enche as paredes de seu apartamento com cédulas de dinheiro. Um chefe de polícia provincial tenta matar seu rival simulando um atropelamento com fuga. O filho de um líder estadual faz fortuna com a ajuda de antigos subordinados do pai. Um juiz é encontrado na cama com uma prostituta loira; e um chefe de segurança provincial se casa secretamente com sua amante enquanto que ele e a antiga esposa fingem viver como um casal.

O enredo é baseado em casos reais de corrupção na China. A série dá destaque especial para o retrato das facções políticas dentro do Partido Comunista Chinês, a “gangue do secretário” e outros escândalos políticos, liderados por Ling Jihua, assistente do ex-presidente Hu Jintao e pelo ex-chefe de segurança Zhou Yongkang.

Muitos críticos culturais tentam explicar a popularidade da série. Em um seminário, a escritora chinesa Mei Guoyun apresentou um desenho que iniciou a discussão.

Imagem de um post do blogue de Mei Guoyun.

O desenho mostra os caracteres para “povo” ou renmin (人民) aprisionados no caractere para “boca” (口). Mei fez a seguinte pergunta no seminário:

张口闭口都是“人民”,到底谁可以“以人民的名义”?

A palavra “povo” é sempre mencionada por [oficiais corruptos e aqueles que combatem a corrupção]. Quem de verdade pode agir “em nome do povo”?

Wang Meiyun, pesquisadora da Universidade Fundan, apresentou seu ponto de vista no seminário e salientou que, na verdade, “o povo” não está presente na série:

自从2004年反腐剧退出黄金档开始,各个电视台的黄金档几乎是清宫剧独占鳌头。作家及导演们表达的对现实的批判和对官场的讽刺,都只能浓缩在历史剧的叙事中,隐晦而模糊,普通老百姓无法直截了当地领会剧本对于当下现状的影射,不免有隔靴搔痒之嫌。而《人民的名义》适时地出现,几乎是给了对现状或失望或愤怒的受众一个发泄的渠道,人民对于反腐题材的期待显得如此迫不及待,而这一主题也恰恰符合了本届政府的导向,所以《人民的名义》及时地推出,必然成为人人称赞的好剧。电视剧主题的契合性已经掩盖掉本剧在情结上拖沓,台词上幼稚的毛病。

本剧有一个明显的特点是,《人民的名义》里,并没有太多的人民。剧本里出现的都是官场和商界的精英,无论正面人物还是负面人物,都没有真正意义上的普通老百姓。[…]人民的缺席与无力感,是不是也是周梅森在文本当中别有用心的一种讽刺呢?

Desde 2004, séries abordando o tema da corrupção política haviam desaparecido do horário nobre da TV, que foi ocupado por outras sobre a dinastia Qing. Autores e diretores só podiam expressar seus pontos de vista sobre a realidade por meio de narrativas históricas. As mensagens são geralmente veladas e obscurecidas, o que faz com que as pessoas comuns não percebam as alegorias. “Em Nome do Povo” se tornou um meio pelo qual as pessoas exteriorizam desapontamento e raiva em relação à realidade. Elas estão muito ávidas por assistir a dramas anticorrupção. Ao mesmo tempo, o tema vai ao encontro do objetivo do (atual) governo, e por isso está destinado ao sucesso. Embora o roteiro seja bastante simples, o tema oculta suas imperfeições.

Um elemento marcante da série é que ali não se vê muita gente comum. Todos os personagens, negativos ou positivos, são da elite do governo ou do mundo dos negócios, enquanto o povo não aparece. […] Essa ausência será uma ironia velada no roteiro?

Fora da China, críticos analisam a fundo os personagens dos oficiais corruptos e dos que lutam contra a corrupção apresentados na série. Em um comentário anônimo publicado pelo Letscorp, um blogue que faz intermediação de disputas entre a China continental e as suas regiões além-mar:

剧中的几个出身朴素的反派:赵德汉、祁同伟、高小琴,都是一些无权无势又追求升官、发财,想要“胜天半子”逆流而上的人。平心而论,他们的动机,恰好是大多数人民群众自己的动机。而反贪的动机,从实际层面讲是要避免“亡党亡国”,从理论高度说是要“从人民中来,到人民中去”,这些都离人民自己的想法相去甚远。党国亡了,受害最大的会是反腐者所处的特权阶层,而不是人民自己。

腐败者来自于人民,而反腐者凌驾于人民。这就是《人民的名义》的现实之处,也是现实的荒诞之处。

Os vilões do drama Zhao Dehan, Qi Tongwei, and Gao Xiaoqin, a princípio, não tinham poder e lutaram para se tornarem ricos e poderosos. Suas razões para tomarem as rédeas de seus próprios destinos são compartilhadas pelas pessoas comuns. Por outro lado, o objetivo dos personagens que se opõem à corrupção é evitar a ruína do país sob a alegação de que a nação é “do povo para o povo”. As pessoas comuns não têm tais aspirações. Somente a elite sofreria com o fim do sistema partidário, não o povo.

Os oficiais corruptos vêm do povo, enquanto os que combatem a corrupção estão acima do povo. Esta é a realidade retratada na série “Em Nome do Povo”, transformando o drama em sátira.

Na China, os filhos dos oficiais do governo e do partido têm uma vida mais fácil, pois recebem boa educação, encontram bons empregos e são promovidos, ao passo que os jovens de famílias humildes lutam para se estabelecer nas grandes cidades onde a moradia é cara. Alguns espectadores se sentem frustrados ao ver que aqueles que desafiam essa falta de equidade são retratados como corruptos.

Abaixo críticas que circularam nas plataformas das redes sociais chinesas:

一个农村出来的寒门学子,被一群官二代红二代联合绞杀了。

Um bacharel de família rural e humilde (um dos oficiais corruptos da série) foi morto pelos filhos dos oficiais do governo e por líderes da revolução (líderes da luta contra a corrupção).

人民的名义该改名叫封建的世袭了,农民的孩子多是贪官坏蛋,官员的孩子多是好官好人

“Em Nome do Povo” deveria se chamar “Sistema Feudal Hereditário”, já que o drama sugere que os filhos de camponeses tendem a se tornar oficiais corruptos e vilões, enquanto que os filhos dos oficiais são funcionários corretos e bons.

很多网友从人物关系指出《人民的名义》电视剧的硬伤,官员之间都是亲属血缘关系,简直就是世袭罔替的活教材。这就是九品中正制啊!还有从剧名到电视剧的主题思想,排斥群众,都是青天大老爷为民作主,而不是人民群众自己当家做主!

Um ponto fraco notável da série, segundo muitos netizens, é a forma como ela retrata as famílias ou as relações pessoais dos oficiais, como se eles tivessem saído de livros didáticos sobre o sistema hereditário. Apesar do título, o drama exclui o público e faz com que os oficiais de alta patente tomem decisões pelo povo em vez de deixar que o povo decida por si!

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