A ministra do Género, Criança e Ação Social de Moçambique, Cidália Chaúque, disse no funeral da filha do ex-Presidente Armando Guebuza que “o assassinato de Valentina Guebuza expõe a vulnerabilidade das mulheres moçambicanas à violência doméstica”, reporta a DW-África:
É um caso muito infeliz, que, infelizmente, nos diz muito da grande violência doméstica que existe nos nossos lares”, declarou à agência de notícias Lusa a governante, que esteve presente do velório da empresária.
A empresária moçambicana foi assassinada na noite de quarta-feira (14.12), em Maputo. Valentina Guebuza, de 36 anos, não resistiu aos quatro tiros que a atingiu no tórax, tendo falecido a caminho do Instituto do Coração, hospital onde viria a ser socorrida.
A Polícia da República de Moçambique (PRM), categorizou o incidente como homicídio qualificado e aponta Zófimo Muiuane, marido da vítima, como o principal suspeito do crime. Muiuane foi imediatamente detido e levado para a 2ª esquadra da capital do país. De momento, está no Estabelecimento Penitenciário de Máxima Segurança para onde foi transferido por ordem do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo.
Conhecido como o “rosto” da empresa mCel, Moçambique Celular — a primeira e maior companhia de telefonia móvel em Moçambique — Zófimo Muiuane trabalha no departamento de marketing da empresa. Tem também interesses empresariais nas áreas de importação e exportação de bens e serviços.
De acordo com informações preliminares colhidas pela equipa de investigação da PRM, o crime está relacionado com problemas conjugais entre o casal:
No primeiro interrogatório inicial a que o indiciado foi submetido, este teria referido que a convivência conturbada que pesa entre o casal teria sido o móbil daquele macabro crime, (…). Neste momento decorrem ações com vista ao esclarecimento do caso. De lembrar que a arma usada estava sob posse ilegal.
O incidente provocou diferentes reações nas redes sociais. Relativamente à posse ilegal da arma, Marcelo Mosse escreveu no Facebook:
(…) nos últimos anos, o porte de arma (legal ou nao) virou moda na capital. Com o Estado se descuidando da segurança geral, mesmo com investimentos de monta na esteira desse endividamento, cá a malta se vai armando como no velho oeste. E puxando do gatilho ao comando de nossos impulsos mais egoístas. Os lares moçambicanos com armas vão viver dias de tensão. Um grande sentimento de pena pelas vítimas…
Tiago Valoi reagiu à publicação no sentido de que o problema não reside na arma como objeto mas sim nos próprios portadores:
O problema não são as armas. São as pessoas. Armas brancas, até mesmo estrangulamentos pelas próprias mãos, causam homicídios dentro das famílias.
A PRM disse, na sua primeira conferência de imprensa, que a indicação que tem sobre o caso é de “um autêntico crime de violência doméstica”. Neste sentido, Rafael Machalela, lembrou na sua conta de Facebook que este não é o primeiro registo envolvendo filhos de dirigentes:
No ano passado se não estou em erro, a filha da Graça Machel foi espancada pelo marido. E ficou meio cega como consequência. (…) Hoje estamos a falar de uma filha de um antigo estadista, que sofreu o pior. Foi assassinada e nesta semana vai receber flores do marido. No cemitério. Definitivamente a violência doméstica não escolhe.
Agora pensem nas zé-ninguém, que são nada e passam por pior todos os dias e o marido ganha razão porque a sociedade assim definiu. Lamentem por elas pois são a maioria e não tem voz como as outras… Mulher já nasce condenada e até pela Bíblia.
A pesquisadora e jornalista da Human Rights Watch para Moçambique, Zenaida Machado, levantou a questão da violência doméstica na mesma vertente e lembrou que:
(…) Ontem, outro caso mediático de violência contra a mulher, esteve em tribunal. Devia ter sido o início do julgamento do ex – parceiro da Josina Machel, que durante uma briga, terá alegadamente conseguido fazer com que ela ficasse cega de um olho (…) Demorou um ano pra se marcar uma data de julgamento (…) O início do julgamento foi adiado pra Janeiro porque ele [o agressor] não compareceu no tribunal, por motivos de trabalho. Estas duas senhoras [Valentina Guebuza e Graça Machel] são filhas de ex-presidentes. São as mulheres mais protegidas de Moçambique. Já imaginaram quantas outras mulheres “anónimas” vivem os mesmos problemas todos os dias?
No mesmo sentido de pensamento, Taibo Bacar escreveu no Twitter:
@NikitaScarlet valentina guebuza e Josina Machel.. 2 assuntos para se pensar e re(pensar).
— TAIBO BACAR (@TAIBOBACAR) 15 de dezembro de 2016
O governador da província de Maputo, Raimundo Diomba, lamentou o facto e defendeu que os casais devem arranjar formas de resolver problemas sem acabar com a vida do parceiro:
É uma prova de que, de facto, a violência doméstica existe em Moçambique. É difícil saber o que se passa nas casas de cada um, mas o trabalho deve ser feito de tal forma que as pessoas entendam a necessidade de proteção mútua dos casais e não só, para que a solução de qualquer problema não seja com o fim da vida do outro
Nikita Skarlet olhou para o sucedido como sendo um alerta para o país:
O caso da morte da Valentina Guebuza é mais uma chamada de atenção para violência contra mulheres no nosso país. É muito triste e seríssimo!
— Nikita Scarlet (@NikitaScarlet) 15 de dezembro de 2016
O jornalista Marcelo Mosse, comenta que:
Isto da malta ter armas em casa a pretexto de nosso estatuto social, estou a imaginar muitas esposas com os nervos a flor da pele, porque nunca se sabe quando eh que a cara-metade se passa para sempre. E nos ultimos anos, o porte de arma (legal ou nao) virou moda na capital. Com o Estado se descuidando da segurança geral, mesmo com investimentos de monta na esteira desse endividamento, cá a malta se vai armando como no velho oeste. E puxando do gatilho ao comando de nossos impulsos mais egoistas. Os lares moçambicanos com armas vão viver dias de tensão. Um grande sentimento de pena pelas vitimas…
Sónia Maciel, reagindo à publicação do jornalista, condenou o sucedido e em relação às diferenças conjugais defendeu que:
(…) Os problemas conjugais resolvem se com separação, [cada um para seu lado] seguindo novos caminhos e buscando felicidade onde a puderem achar…
Valentina Guebuza e Zófimo Muiane, contraíram matrimónio em 2014 num evento que ficou conhecido como tendo sido o maior do ano em Moçambique. A cerimónia contou com a presença de convidados como o Presidente da África do Sul, o Rei da Suazilândia e Isabel dos Santos, filha do Presidente de Angola. Em 2015, o casal teve a sua primeira e única filha, a Valentina Winda da Luz Zófimo Muiuane.
Refira-se que em 2013, Valentina Guebuza surgiu na lista das 20 mulheres jovens mais poderosas de África, classificada pela revista Forbes. Destacando o cunho empresarial da vítima, Marlene Buce escreveu:
Estamos passando pelo mau momento em Moçambique. Faleceu uma das empresárias de África valentina Guebuza.
— Marlen Buce (@buce_marlen) 15 de dezembro de 2016
O velório da empresária decorreu no sábado (17.12) numa localidade próxima de Maputo.