“Rosas de Ermera” conta a história da família de Zeca Afonso em Timor durante a II Guerra Mundial

José Afonso (1929/1987). Captura de Tela do YouTube.

José Afonso (1929/1987). Captura de Tela do YouTube.

O nome José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos pode não lhe dizer muito mas em Portugal ficou conhecido por Zeca Afonso, o autor da música Grândola Vila Morena. A canção tornou-se célebre na revolução de Abril quando tocou na rádio servindo como um dos sinais para dar inicio à revolta dos militares que ditou a queda do regime ditatorial que se vivia em Portugal até 1974. Curiosamente, a família do cantor tem uma ligação histórica com Timor.

No início da Segunda Guerra Mundial, o pai de Zeca Afonso, que era juiz em Moçambique, pediu para ser colocado em Dili. A família separou-se, o casal e a irmã mais nova, Mariazinha, partiram para Timor enquanto o cantor e o seu irmão, João, foram para Portugal estudar. A família passaria a corresponder-se por carta, até que um dia as cartas pararam. José e João deixaram de saber notícias dos pais e de Maria das Dores – Mariazinha:

Em 1939 os seus pais foram viver para Timor, onde seriam cativos dos ocupantes japoneses durante três anos, entre 1942 e 1945. Durante esse período, Zeca Afonso não teve notícias dos pais.

Os japoneses invadiram a ilha de Timor sob o pretexto de estarem a defender-se das tropas aliadas que também estavam no território tendo violado a neutralidade de Portugal face ao conflito:

Tudo aconteceu durante a segunda Grande Guerra Mundial. Portugal declarou-se neutral perante o conflito. Primeiro entraram os aliados dizendo que o faziam como forma de impedir o desembarque dos japoneses. Depois entraram estes últimos com o argumento de que queriam expulsar os aliados. No meio de tudo isso mais de quarenta mil timorenses faleceram durante a ocupação e os portugueses ficaram reféns dos invasores.

Mariazinha, irmã de Zeca Afonso. Captura de tela do Vimeo.

Mariazinha, irmã de Zeca Afonso. Captura de tela do Vimeo.

Setenta anos depois, “Mariazinha” voltou a Timor acompanhada pelo cineasta Luís Filipe Rocha. Em outubro de 2015, a irmã de Zeca Afonso revisitou os locais por onde viveu e estudou incluindo onde permaneceu cativa dos japoneses durante três anos. Antes de partirem para Timor, o realizador dizia à imprensa que:

Acompanharemos Maria das Dores na dilacerante separação dos irmãos e na viagem com os pais, pelos Mares do Sul, em três barcos diferentes, até Timor. Procuraremos a Casa em Lahane, a escola e a vida ao ar livre, no mato e nos ribeiros, com os amigos Liquiçá, o cavalo que montava em pelo, e Bonita, a cabrinha preta.

A história destes portugueses, que estiveram presos durante a Segunda Guerra Mundial numa longínqua ilha do sudeste asiático, permaneceu em segredo na família Afonso dos Santos durante décadas.

Os portugueses que viviam em Timor durante a II Guerra Mundial foram colocados em campos de concentração japoneses. Entre eles estavam os pais e a irmã do cantautor Zeca Afonso.

Coffee is one of Timor-Leste’s most important crops, bringing much-needed revenue to the country. Magdalena Salsinha, holding coffee beans, has been picking coffee since she was 15 years old. Now 55, she lives near Ermera and is married with six children.

Café de Ermera, Timor-Leste. UN Photo/ Martine Perret, utilizada sob licença: CC BY-NC-ND 2.0

Nas memórias de Mariazinha ainda reside o cheiro das rosas de Ermera, um distrito do interior de Timor-Leste rico em café.

Maria das Dores, que recorda até hoje o cheiro a rosas em Ermera, o coração da região do café timorense, a sudoeste de Díli e onde passou férias com os pais – só se reencontra com os irmãos seis anos depois, em fevereiro de 1946.

A história deu origem ao livro “O último dos colonos: entre um e outro mar” escrito pelo irmão, João Afonso dos Santos, e vai resultar num documentário. A saga da família Afonso dos Santos, cujas gravações ficaram concluídas em 2015, deverá ser apresentada ao público em 2017:

 

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