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Estará a biodiversidade do lago mais antigo da Europa ameaçada?

Categorias: Europa Oriental e Central, Albânia, Macedônia, Ciência, Governança, Meio Ambiente, Mídia Cidadã
Margens do Lago de Ocrida e o Monte de Galicitica (2007). Foto: Apcbg / Dominio Público

Margens do Lago de Ocrida e o Monte de Galicica (2007). Foto: Apcbg / Domínio Público [1]

Um novo plano para construir um centro de esqui e uma autoestrada, no Parque Nacional Galicica [2], na Macedónia, ameaça a existência de mais de uma centena de espécies raras e endémicas, colocando em risco o ecossistema do lago mais antigo da Europa [3].

No final de agosto de 2015, o governo macedónio anunciou um plano de urbanização para 10 anos [4] no Lago de Ocrida [5] (Ohrid) e no Parque Nacional de Galicica, para desespero da comunidade científica internacional e para muitos cidadãos macedónios. As obras estão previstas para acontecer bem no centro do Parque Nacional, que faz parte da Reserva da Biosfera Transfronteiriça Ocrida-Prespa [6], uma das quinze reservas com características excecionais em todo o mundo, e que na sua extensão regional está classificada de Património Mundial da Humanidade pela UNESCO, desde 1980 [7].

Galicica é o lar natural para mais de 5330 espécies diferentes de plantas e animais, das quais 114 são endémicas e não existem em nenhum outro lugar do mundo. Mais de 1500 espécies de borboletas e mariposas vivem nos prados de Galicica, incluindo a borboleta Apollo (Apollo Parnassius [8]), espécie em vias de extinção. Outra espécie fascinante, “residente” de Galicica, é a pequena flor do açafrão, Cvijicii [9] que, tal como a Apollo, está na lista vermelha das espécies mais vulneráveis, classificada pela IUCN [10].

Os ecologistas e a população local estão chocados com a recente decisão do governo macedónio em construir um centro de esqui [11], uma autoestrada e três zonas de desenvolvimento turístico dentro da reserva da biosfera e decidiram protestar contra a decisão através dos meios de comunicação e petições contra o plano de urbanização.

Na última audiência da Avaliação Ambiental Estratégica sobre o Plano de Gestão do Parque Nacional Galicica [12], uma das autoras da avaliação, Elizabeth Van Zyl, explicou que algumas áreas precisam de ser reclassificadas. Van Zyl propôs que o local da biosfera seja excluído da Zona de Gestão Ativa (ZAM, sigla em Inglês) e transferido para a Zona de Uso Sustentável (ZSU, sigla em Inglês), para permitir que o projeto que engloba a construção das infraestruturas seja desenvolvido. Perto de 604 hectares que estão previstos na ZAM seriam transferidos para a ZSU.

Isto porque, para compensar a perda desta biodiversidade valiosa, serão criadas “medidas de compensação [13]“, ou seja, as áreas do parque que podem ser adversamente afetadas por projetos de desenvolvimento, serão substituídas por outras áreas que abrigam as mesmas espécies encontradas no resto do país, contudo qualquer medida de compensação da biodiversidade tomada para fins de desenvolvimento económico, deve sempre ser evitada, disse Van Zyl:

Downgrading the zoning is the last resort and should be avoided where and when possible.

A reclassificação da zona é o último recurso e deve ser evitado em qualquer lugar e sempre que possível.

re-zoniranje galicicaJá o ecologista local, Lazo Naumoski considera todo o plano de “inútil”:

The problem with this plan is that climate change will completely change the landscape, and in a year we might see beech growing where there is now oak. Which makes this plan completely useless, said Mr.Lazo Naumoski, a local ecologist.

O problema com este plano é que a mudança climática vai mudar completamente a paisagem e, dentro de um ano, poderemos ver faia [14] em crescimento onde agora há carvalho [15]. O que torna este plano completamente inútil.

Este parece ser um dos muitos problemas relacionados com esta região classificada de Património Mundial da Humanidade pela UNESCO. O governo da Macedónia poderá ter nas mãos um desastre ecológico de grande escala devido à estreita relação entre o Lago Prespa [16], o Monte Galicica, e o Lago Ocrida. De acordo com uma pesquisa realizada [17] recentemente por cientistas da Universidade de Colónia, o Lago Ocrida tem mais de 1,2 milhões de anos, é o lago mais antigo da Europa.

Lazo Naumoski reforça que o Lago está em perigo:

The water in Lake Ohrid comes from 40 springs, 17 in Macedonia and the rest are on the Albanian side. Most of those springs are very high in nutrients and have an unstable PH value, but the springs coming from Galichica are full of calcium which balances things out. There is an underground connection between Lake Prespa and Lake Ohrid as Galichica Mountain is limestone, allowing the water to flow from Lake Prespa and towards Lake Ohrid. You’d be endangering two out of three natural lakes in Macedonia,” said Mr. Lazo Naumoski.

A água do lago Ocrida vem de mais de 40 fontes, 17 da Macedónia e o resto do lado albanês. A maioria destas fontes são ricas em nutrientes e têm um teor de PH instável, mas as fontes que vêm de Galicica são ricas em cálcio, o que equilibra as propriedades da água. Existe uma comunicação subterrânea entre o Lago Prespa e o Lago Ocrida. As montanhas de Galicica são predominantemente em calcário permitindo a fluidez da água entre os lagos. Dois dos três lagos naturais da Macedónia estão em perigo.

Estão previstas três áreas de desenvolvimento turístico em torno da margem do Lago Ocrida. Spas, acomodações de luxo e praias artificiais [18] vão substituir um cinto de juncos que atua como filtro dos nutrientes que chegam ao lago e às espécies que habitam nele, explica o Dr. Bernd Wagner, do Instituto de Geologia e Mineralogia, da Universidade de Colónia:

Destroying the shorelines and the reed belts due to construction work, increased infrastructure, and a rise in the amount of tourism will lead to elevated nutrient input to the lake, which may, in turn, cause destruction to large parts of the habitats of Lake Ohrid’s unique fauna [19].

A destruição das costas e do cinto de juncos, devido a trabalhos de construção, o aumento da infraestrutura e o aumento de turistas irá resultar numa maior entrada de nutrientes no lago, que pode, por sua vez, causar a destruição de grande parte do habitat da fauna que é única no Lago Ocrida.

Para sensibilizar as pessoas sobre a ameaça que a flora e a fauna desta região enfrentam com estes projetos, criou-se a SOS Ohrid (Ocrida) um movimento de iniciativa cívica que emitiu um comunicado [20] e lançou uma petição internacional [21]. A declaração foi assinada por 250 especialistas em biodiversidade internacionais, bem como turistas que visitaram Macedónia e cientistas de todo o mundo que reconhecem a importância do Lago Ocrida.

De acordo com o historial de desenvolvimento urbano efetuado até hoje pela Macedónia, que tem a sua capital Escópia [22] (Skopje) como a cidade mais poluída [23] da Europa devido ao aumento de projetos de construção [24] efetuados na cidade desde 2012, este tesouro natural poderá estar em perigo iminente e o país pode perder muito mais do que apenas um estatuto da UNESCO em Ocrida.